Inclusão e
Acessibilidade
em AçãoDiferentes percursos, um rumoEdição de 2015

Ficha técnica

Direção: Centro de Investigação Inclusão e Acessibilidade em Ação

Editor: iACT/IPLeiria

Organizadores: Catarina Mangas, Carla Freire e Manuela Francisco

Publicação: Periódico (anual)

Título da série: Inclusão e Acessibilidade em Ação.

Subtitulo da Série: Diferentes percursos, um rumo

Capa: Carlos Silva

Grafismo: Sandro Costa

Desenvolvimento web: Claúdio Esperança e Sandro Costa

Avaliação pericial: Norberto Sousa / comAcesso

Data: janeiro 2015

ISSN: ISSN 2183-4555

Ir para o índice

Nota Introdutória

“Inclusão e Acessibilidade em Ação: Diferentes percursos, um rumo” é a primeira publicação do Centro de Investigação Inclusão e Acessibilidade em Ação (iACT) e tem como principal objetivo contribuir para a divulgação científica de práticas e estudos realizados nas áreas da inclusão e acessibilidade. Pretende-se, desta forma, partilhar conhecimento com todos os interessados nestas temáticas, assumindo os artigos, aqui incluídos, como uma fonte de reflexão para ações futuras.

Acredita-se que, apesar de existirem excelentes publicações que se centram nestes domínios, são ainda escassas as que assumem uma abordagem holística e integrada, interligando diversas dimensões e apresentando uma visão transdisciplinar, pelo que consideramos que subsistem lacunas que precisam de ser preenchidas. Neste sentido, o iACT tem a pretensão de tornar esta publicação periódica, organizando um novo número, no primeiro trimestre de cada ano.

A publicação que se apresenta reúne onze artigos, cujo conteúdo é da responsabilidade dos seus autores, e encontra-se dividida em duas partes. A primeira inclui artigos dos membros do centro de investigação e a segunda contempla quatro artigos decorrentes das melhores comunicações apresentadas na 1ª e 2ª Conferências Internacionais para a Inclusão (INCLUDiT) que decorreram em julho de 2013 e 2014, respetivamente, na Escola Superior de Educação e Ciências Sociais do Instituto Politécnico de Leiria.

Esta obra é hoje uma realidade graças ao apoio do Instituto Politécnico de Leiria e aos autores dos artigos que partilham os seus conhecimentos e reflexões.

É nosso interesse promover e disseminar o conhecimento sobre Inclusão e Acessibilidade para que a praxis social seja cada vez mais inclusiva.

assinatura Catarina Mangas

Coordenadora do Centro de Investigação iACT – Inclusão e Acessibilidade em Ação)

Ir para o índice

Parte I

ARTIGO 1 - INCLUSÃO E ACESSIBILIDADE EM AÇÃO: CLARIFICAÇÃO DE CONCEITOS

Catarina Mangas e Carla Freire

Membros do iACT

Citar este artigo: Mangas, C. & Freire, C. (2015). Inclusão e acessibilidade em ação: clarificação de conceitos. In C. Mangas, C. Freire & M. Francisco (Orgs.), Inclusão e Acessibilidade em Ação - Diferentes percursos, um rumo. Leiria: iACT/IPLeiria, Artigo 1. [Online, disponível em http://iact.ipleiria.pt/]

Resumo

A Unidade de Investigação em Inclusão e Acessibilidade em Ação integra membros de diferentes áreas que investigam e dinamizam projetos que têm por base uma abordagem pluridimensional e transdisciplinar. Embora se reconheça que a multiplicidade de vetores de análise e intervenção é um fator de enriquecimento do iACT, sabe-se, por outro lado, que é fundamental identificar pontos comuns que orientem as práticas de todos. Este foi o propósito do estudo que se desenvolveu, que pretendeu analisar o grau de entendimento dos membros da Unidade acerca dos conceitos de inclusão, integração e acessibilidade. Para tal foi efetuado um estudo qualitativo com base num inquérito por questionário e num focus group. Os resultados obtidos permitiram perceber que o conceito de acessibilidade é o que reúne maior consenso. Já os conceitos de integração e inclusão geram menos concordância, parecendo suscitar alguma diversidade de perspetivas que, muitas vezes, se cruzam. A partir das definições encontradas, pretende-se dar continuidade à análise das terminologias mais adequadas na área da deficiência e incapacidade que reiterem a coerência da unidade de investigação enquanto polo agregador de diferentes temas de interesse.

Palavras-Chave: definição de conceitos; inclusão; integração; acessibilidade

Abstract

The research unit Inclusion & Accessibility in Action involves members of different areas of study who do research and promote projects which are based on a multidimensional and transdisciplinary approach. The multiplicity of areas is an enrichment factor but, on the other hand, it is essential to identify common points to guide the practices. The purpose of the study was to analyze the degree of understanding of the Unit members about the concepts of inclusion, integration and accessibility. A qualitative study was carried out based on a survey and a focus group. The results led to the conclusion that the concept of accessibility is the one where there is greatest consensus. The concepts of integration and inclusion generate less agreement, including a diversity of perspectives that often intersect. From the definitions found, we intend to continue the analysis of the most appropriate terminology in the field of disability to restate the coherence of the research unit while aggregator of different topics of interest.

Keywords: concept definition; inclusion, integration, accessibility

1. Introdução

A Unidade de Investigação Inclusão e Acessibilidade em Ação (iACT) foi criada em 2011 com o objetivo de promover a investigação, a divulgação científica, a formação permanente e a prestação de serviços em diversos domínios da área das Ciências da Comunicação, numa perspetiva fundamental, aplicada e experimental. Contando com cerca de trinta membros, de áreas tão distintas como as Ciências da Educação, Comunicação, Direito, Gestão, Informática, Língua Gestual, Saúde, Tradução, etc. facilmente se depreende que reúne um conjunto de perspetivas transdisciplinares sobre as temáticas em que se debruça.

Embora se reconheça que esta multiplicidade de vetores de análise contribui inequivocamente para o enriquecimento das investigações levadas a cabo na Unidade, sabe-se, por outro lado, que é fundamental encontrar correlações que permitam criar uma sinergia coerente nos estudos científicos e projetos do iACT. Aquando da escolha do título da Unidade, percebeu-se claramente que o entendimento dos membros acerca dos conceitos que lhe deram origem (inclusão e acessibilidade) não se baseava nos mesmos princípios, possuindo contornos pouco nítidos que não recaíam nas mesmas definições.

Desde logo o debate em torno do conceito de inclusão aportou o de integração, dualidade que parece tomada de empréstimo de vários estudos anteriormente realizados (Olivencia, 2013; Suero, 2011; Muntaner, 2010; Sanches & Teodoro, 2006; Vislie, 2003; entre outros). A definição de inclusão hodiernamente aceite pela comunidade científica, pretende extrapolar definitivamente a ideia de integração ainda associada à normalização de Bank-Mikkelsen (1959), diretor dos Serviços para Deficientes Mentais da Dinamarca (Silva, 2009). A integração surge ao longo das décadas de 70 e 80 como uma preocupação da sociedade em geral e, em especial, dos que intervinham junto de pessoas com deficiência, tendo os trabalhos desenvolvidos no âmbito do ‘Ano Internacional do Deficiente’ (1981), reconhecido

“(…) o direito à igualdade de oportunidades, o direito à integração e o direito à ‘normalização’ das crianças e dos jovens deficientes, isto é, a sua plena participação numa sociedade para todos, o que correspondeu à intervenção centrada na escola. (…) O processo de integração no sistema regular de ensino teve assim, como objectivo, “normalizar” o indivíduo, a nível físico, funcional e social, pressupondo a proximidade física, a interacção, a assimilação e a aceitação.” (Silva, 2009, p. 141).

A integração assume-se como um conceito associado essencialmente à área da educação (Borges, Pereira, & Aquino, 2012), tendo proliferado também em Portugal um conjunto de serviços, unidades e equipas de apoio à deficiência enquadradas na política de integração delineada e supervisionada pela União Europeia. Progressivamente, outras áreas, para além da educação, foram-se associando a esta premissa, em especial a área social, que procurou respeitar os princípios internacionais vigentes na Carta para os Anos 80, proclamada pela Rehabilitation International, e no Programa Mundial de Ação relativo às Pessoas Deficientes (1982), difundido pelas Nações Unidas. Estes guias tinham em conta o direito à participação na sociedade das pessoas com deficiência, centrando o foco nas necessidades dos indivíduos, dando-lhes igual importância relativamente às características dos demais. A integração é então entendida como a procura do sujeito pela pertença a uma cultura dominante e normalizada (Suero, 2011). Integrar pressupõe, assim, uma modificação e adaptação da pessoa aos padrões vigentes na sociedade, sendo esta apenas um meio de acolhimento.

No fundo, “No modelo de integração, o que acontecia é que, àqueles diferentes eram lhes fornecidas provisões diferentes, com o objectivo de se ultrapassar a diferença, procurando aproximá-los do aluno normal.” (Freire, 2008, p. 10). Assumindo-se progressivamente que o desen¬volvimento humano só acontece de forma plena quando o meio sustenta e se ajusta às características particulares dos cidadãos, surge a necessidade de se adotar um novo conceito que reitere o papel da sociedade neste processo. Trata-se do conceito de inclusão, fortemente impulsionado pela Conferência Mundial sobre Educação para todos, em Jomtien – Tailândia (1990) e pela Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais em Salamanca – Espanha (1994), a partir das quais se criou a Declaração Mundial sobre Educação para Todos: Satisfação das Necessidades Básicas de Aprendizagem e a Declaração de Salamanca aprovadas por vários países e organizações internacionais.

Cotejando o conceito de inclusão com o de integração percebe-se que, embora encerrem a mesma ideia, a inserção de pessoas com deficiência na sociedade, representam noções e crenças distintas e, por vezes, até contraditórias. O quadro que se segue sintetiza as principais diferenças entre os conceitos.

Principais diferenças

Inclusão

Integração

Inserção total e incondicional (crianças com deficiência não precisam de “se preparar” para ir à escola regular)

Inserção parcial e condicional (crianças “preparam-se” em escolas ou turmas especiais para estar em escolas ou turmas regulares)

Exige ruturas nos sistemas

Pede concessões aos sistemas

Mudanças que beneficiam toda e qualquer pessoa (não se sabe quem “ganha” mais; TODAS ganham)

Mudanças visando prioritariamente as pessoas com deficiência (consolida a ideia de que elas “ganham” mais)

Exige transformações profundas

Contenta-se com transformações superficiais

Sociedade adapta-se para atender às necessidades das pessoas com deficiência e, com isso, torna-se mais atenta às necessidades de TODOS

Pessoas com deficiência adaptam-se às necessidades dos modelos que já existem na sociedade, que faz apenas ajustes

Defende o direito de TODAS as pessoas, com e sem deficiência

Defende o direito de pessoas com deficiência

Traz para dentro dos sistemas os grupos de “excluídos” e, paralelamente, transforma esses sistemas para que se tornem de qualidade para TODOS

Insere nos sistemas os grupos de “excluídos que provarem estar aptos” (sob este aspeto, as cotas podem ser questionadas como promotoras da inclusão)

O adjetivo inclusivo é usado quando se procura qualidade para TODAS as pessoas com e sem deficiência (escola inclusiva, trabalho inclusivo, lazer inclusivo etc)

O adjetivo integrador é usado quando se procura qualidade nas estruturas que atendem apenas as pessoas com deficiência consideradas aptas (escola integradora, empresa integradora etc)

Valoriza a individualidade de pessoas com deficiência (pessoas com deficiência podem ou não ser bons funcionários; podem ou não ser carinhosos etc)

Como reflexo de um pensamento integrador podemos citar a tendência a tratar pessoas com deficiência como um bloco homogéneo (ex: surdos concentram-se melhor; cegos são excelentes massagistas)

Não quer disfarçar as limitações, porque elas são reais

Tende a disfarçar as limitações para aumentar a possibilidade de inserção

Não se caracteriza apenas pela presença de pessoas com e sem deficiência no mesmo ambiente

A presença de pessoas com e sem deficiência no mesmo ambiente tende a ser suficiente para o uso do adjetivo integrador

A partir da certeza de que TODOS somos diferentes, não existem “os especiais”, “os normais”, “os excecionais”, o que existe são pessoas com deficiência

Incentiva pessoas com deficiência a seguir modelos, não valorizando, por exemplo, outras formas de comunicação como a Língua Gestual. Seríamos um bloco maioritário e homogéneo de pessoas sem deficiência rodeado pelas que apresentam diferenças

Quadro 1 – Principais diferenças entre inclusão e integração (adaptado de Escola de Gente, 2002, pp. 16-17)

Embora as diferenças expressas no quadro acima sejam notórias, os conceitos de inclusão e integração têm sido usados recorrentemente de forma indiscriminada (Freire, 2008). Sabe-se, no entanto, que a inclusão, ao contrário da integração, aporta mudanças tanto na postura e práticas dos cidadãos, como nos contextos onde as pessoas estejam inseridas, quer sejam contextos educacionais, sociais ou até, políticos. Estes contextos devem flexibilizar as suas respostas, defendendo o direito a uma participação consciente e responsável dos indivíduos e, por outro lado, a aceitação e respeito pelas suas diferenças que são, assim, valorizadas (Olivencia, 2013; Freire, 2008).

O problema, no âmbito da inclusão, já não reside na pessoa, mas sim na forma como a sociedade está organizada e no modo de se adaptar às exigências e condições de todos. O modelo individual, competitivo e independente, dá, portanto, lugar, ao modelo colaborativo que reúne crenças e valores comuns como a justiça, a equidade social, o respeito e a participação democrática (Vlachou, 2004; Vislie, 2003).>

O conceito de inclusão está inequivocamente relacionado com o de acessibilidade, já que esta se prende com a capacidade que a sociedade tem de se adaptar ao sujeito, através da criação de produtos e ambientes funcionais para todos (Falvo, 2014).

O respeito pela acessibilidade implica o reconhecimento das características individuais dos cidadãos, tendo-as em conta, desde logo, no momento da criação de normativos legais que regulamentem o acesso pleno a recursos e serviços (páginas Web, transportes, escolas, etc.) melhorando, desta forma, a qualidade de vida dos seus utilizadores, com e sem deficiência (Bocarejo & Oviedo, 2012; Straatemeier, 2007).

Os conceitos até aqui apresentados (inclusão, integração e acessibilidade) foram o mote do estudo que se apresenta, que pretendeu analisar qual o grau de entendimento que os membros da Unidade de Investigação em Inclusão e Acessibilidade em Ação têm relativamente aos mesmos.

2. Metodologia

O estudo que se apresenta é de caráter qualitativo uma vez que pretende analisar, do ponto de vista do indivíduo, um evento num contexto específico permitindo a identificação e descrição dos principais tópicos associados e respetivas relações (Thompson & Walker, 1998). No presente caso a identificação dos conceitos e terminologias relacionadas com as áreas da deficiência e incapacidade utilizadas pelos membros do iACT.

2.1 Participantes do estudo

Os participantes do estudo são elementos do iACT, com habilitações de nível superior, desde a licenciatura ao pós-doutoramento. As suas áreas de formação são distintas, desde educação especial, engenharia multimédia, línguas e literaturas, ensino a distância, direito, saúde, música, entre outras. Apesar das diferentes áreas, os membros do iACT partilham de um objetivo comum: investigar e implementar projetos que visem a inclusão e acessibilidade de públicos diversificados.

2.2 Instrumentos de recolha de dados

Para a recolha de dados foram selecionados o inquérito por questionário e o Focus Group tendo em conta as suas características que se mostraram mais adequadas para o estudo em questão.

2.2.1 Inquérito por questionário

Para a recolha de dados foi realizado um inquérito, uma vez que permite a recolha de dados não só em grupos de grande amplitude, como também em grupos mais restritos com determinadas características comuns (Fortin, 2009) de uma forma estandardizada, permitindo a elaboração de questões sobre conceitos específicos com o intuito de se estabelecerem relações (Freimut, Punter, Biffl, & Ciolkowski, 2001).

Neste sentido, foi criado um questionário com quatro grupos de perguntas: (1) questões relativas à definição de conceitos; (2) questões relacionadas às terminologias mais adequadas na área; (3) questões sobre atitudes discriminatórias; e (4) questões referentes a ações e intervenções que permitam a inclusão. Com o intuito de corrigir eventuais falhas ou gralhas no questionário foi feito um teste piloto com cinco pessoas, do qual resultou uma redução no número de itens e a simplificação da linguagem, nas opções de resposta, de forma a tornar a informação mais acessível a quem não tivesse acesso visual.

Após as correções sugeridas pela equipa do teste piloto, o questionário foi enviado por email aos membros do iACT de forma a solicitar o seu preenchimento, sem grandes preocupações de perfeição ou cientificidade, uma vez que o objetivo era entender qual a ideia ou noção que cada elemento tinha de determinado conceito ou terminologia.

2.2.2 Focus Group

Considerando que o questionário não permite estudos tão aprofundados como a entrevista (Freixo, 2011), considerou-se importante a realização de um Focus Group, uma vez que este permite a interação e discussão entre participantes com diferentes pontos de vista relativos a determinados conceitos que possam vir a levantar novas questões suscetíveis de debate (Mertens, 2010). Neste sentido, após a recolha dos dados do questionário e tendo em conta a diversidade de respostas qualitativas nas questões relativas aos conceitos, os resultados deste grupo de questões foram discutidos entre os membros da Unidade de forma a encontrar definições comuns a todos os elementos do iACT.

Tendo em conta a grande extensão do questionário, o presente documento pretende apresentar os resultados relativos ao primeiro grupo de questões (questões relativas à definição de conceitos), tendo sido analisados os conceitos de acessibilidade, inclusão e integração. Os restantes resultados serão apresentados numa publicação posterior.

2.3 Tratamento de dados

Uma vez que os resultados a apresentar advêm de questões de caráter qualitativo foi realizada uma análise de conteúdo, com vista a encontrar categorias comuns às diferentes respostas, sendo posteriormente utilizado o software MS Excel para a representação gráfica da informação.

3. Análise e discussão dos resultados

Dos trinta e três membros do iACT a quem foi enviado o questionário, responderam vinte e sete, o que corresponde uma taxa de resposta de 82%, tendo posteriormente participado no Focus Group dez elementos, 37% dos que responderam ao questionário.

3.1 Questionário

No que se refere ao conceito de acessibilidade, a análise de conteúdo permitiu identificar sete categorias principais dispostas no Gráfico 1: Acesso igual para todos com 44% das respostas (e.g. “permitir o acesso a qualquer pessoa independentemente da sua condição física ou mental”); Facilidade de acesso com 16% (e.g. “É a facilidade com que se acede a um local ou informação”); Extração de barreiras com 16% (e.g. “dar acesso ao que por norma não está acessível”); Soluções de acesso com 12% (e.g. “soluções criadas com vista a facilitar o acesso a qualquer coisa”); Envolvência em diversas possibilidades (e.g. “conseguir se envolver com as mais diversas possibilidades de vida”), Direitos (e.g. “Ter direito à possibilidade de receber determinado parâmetro/objetivo”) e Relacionamento (e.g. “Relacionamento amigável, seguro e cuidado de qualquer pessoa com um ambiente ou objeto”) com 4% de respostas cada.

gráfico circular indicando as categorias relacionadas com a acessibilidade e respetivas percentagens

Gráfico 1 - Principais categorias identificadas no conceito de Acessibilidade

No que concerne ao conceito de integração, o Gráfico 3 permite identificar seis categorias principais, sendo: Incorporação no meio com 23,8% de respostas (e.g. “incorporação de um individuo ou grupo num meio”); Participação do indivíduo com 23,8% (e.g. “Possível participação de indivíduos com algumas características diferentes, mas apenas quando eles podem participar”); Interação indivíduo-grupo/grupo-indivíduo com 23,8% (e.g. “Processo realizado por um indivíduo por forma a criar condições de interação entre ele e a comunidade que o recebe”); O mesmo que inclusão com 19% (e.g. “deveria ser o mesmo que inclusão mas a palavra está ‘queimada’”); e Soluções de acesso (e.g. “Combinar várias soluções de acessibilidade”) e Igualdade de oportunidade (e.g. “Garantir que todos têm as mesmas oportunidades, apesar das diferenças”) com 4,8% de respostas cada.

gráfico circular indicando as categorias relacionadas com a integração e respetivas percentagens

Gráfico 3 – Principais categorias identificadas no conceito de Integração

Ainda que a literatura aponte para diferenças entre inclusão e integração (e.g. Olivencia, 2013; Suero, 2011; Muntaner, 2010), um número considerável de membros do iACT considera que os conceitos são sinónimos (19%). Analisando as categorias dos dois conceitos é possível perceber que inclusão e integração surgem com significados que se cruzam e, até, se confundem. Como exemplo podemos referir a categoria Interação indivíduo-grupo/grupo-indivíduo¸ que aponta para um envolvimento do grupo no acolhimento ao sujeito, o que contradiz a opinião de Suero (2011) que assume a integração como a procura do sujeito pela pertença a uma cultura dominante e normalizada e não a flexibilização do meio ou grupo em função das diferenças dos indivíduos (Olivencia, 2013).

3.2 Focus Group

Após a análise das respostas que resultaram em diferentes categorias, dez membros do iACT reuniram para discutir as diferentes definições dadas, com vista à unificação de conceitos entre todos os elementos. Da reunião resultou a definição de acessibilidade como “os meios (instrumentos, ferramentas, tecnologias, processos) disponibilizados em determinado contexto para garantir a possibilidade ação e interação por parte de todos em igualdade de circunstâncias”.

Já no que se refere a inclusão, os participantes do estudo revelaram maior dificuldade numa definição comum, tendo surgido duas ideias distintas: (1) “inclusão é aceitar a diferença, é uma atitude”; (2) “inclusão é um conceito lato que implica a existência de um padrão e a necessidade de incluir quem não está dentro desse padrão”. Neste sentido, optou-se por definir inclusão como “ter em conta a diversidade, não existindo o modelo único mas respeitando a individualidade, há compromisso mútuo. Incluir acolhe a diversidade”.

No que concerne à integração, o grupo optou por considerar que “é fazer aproximar a pessoa que é diferente da norma, o enfoque está, por isso, na pessoa diferente que tem de fazer um esforço para se aproximar dessa norma. Integrar reforça a diferença”.

4. Conclusão

O estudo realizado permitiu definir os conceitos de acessibilidade, integração e inclusão, reconhecendo-se, no entanto, que é simplista generalizar as conclusões obtidas que devem ser vistas apenas como um contributo para a clarificação dos conceitos entre os membros do iACT.

Em função das definições obtidas, a unidade assume o Modelo da Diversidade Funcional como orientador das suas práticas investigativas, o que implica o respeito de uns pelos outros e o esforço de todos para reduzir o diferencial entre o que se oferece e exige e o que cada um é capaz de fazer em determinado contexto. Assim, retira-se o enfoque na deficiência/incapacidade e recusam-se os modelos que pretendem integrar a diferença, para apostar num modelo centrado na funcionalidade que promova a inclusão da diversidade enquanto fator de enriquecimento mútuo./p>

Partindo desta premissa, o iACT pretende dar continuidade à análise dos resultados do questionário, nomeadamente no que diz respeito às terminologias mais adequadas na área da deficiência e incapacidade, às atitudes relativas à discriminação e às ações e intervenções. Estas têm em vista a dinamização de projetos em áreas distintas com uma base comum, que reitere a coerência da unidade de investigação enquanto polo agregador de diferentes áreas de interesse.

Referências Bibliográficas

Bocarejo, J., & Oviedo, D. (2012). Transport accessibility and social inequities: a tool for identification. Journal of Transport Geography, 24, 142-154.

Borges, M. C., Pereira, H., & Aquino, O. (2012). Inclusão versus integração: a problemática das políticas e da formação docente. Revista Ibero-americana de Educação, 59(3), 1-11.

Escola de Gente. (2002). Manual da Mídia Legal - Comunicadores pela Inclusão. Rio de Janeiro: WVA Editora.

Falvo, D. (2014). Medical and Psychosocial Aspects of Chronic Illness and Disanility. Burlington: Jones & Bartlett Learning.

Fortin, M.-F. (2009). O processo de investigação: da concepção à realização (N. Salgueiro, Trans. 5ª ed.). Loures: Lusociência - Edições Técnicas e Científicas, Lda.

Freimut, B., Punter, T., Biffl, S., & Ciolkowski, M. (2001). State-of-the-Art in Empirical Studies (1.0 ed.): Visek - Virtuelles Software Engineering Kompetenzzentrum.

Freire, S. (2008). Um Olhar sobre a Inclusão. Revista da Educação, 5-20.

Freixo, M. J. V. (2011). Metodologia científica: Fundamentos, métodos e técnicas (3rd ed.). Lisboa: Instituto Piaget.

Mertens, D. M. (2010). Research and Evaluation in Education and Psychology: integrating diversity with quantitative, qualitative, and mixed methods (3rd ed.). USA: SAGE Publications, Inc.

Muntaner, J. J. (2010). De la integración a la inclusión: un nuevo modelo educativo. In P. Arnaiz, M. Hurtado, & F. Soto, 25 Años de integración Escolar en España: tecnologia e inclusión en el ámbito educativo, laboral y comunitário (pp. 2-24). Murcia: Consejería de Educación, Formación y Empleo.

Olivencia, J. (2013). De la Integración a la Inclusión: Evolución y Cambio en la Mentalidad del Alumnado Universitario de Educación Especial en un Contexto Universitario Español . Actualidades Investigativas en Educación, 13(3), 1-27.

Sanches, I., & Teodoro, A. (2006). Da integração à inclusão escolar: cruzando perspectivas e conceitos. Revista Lusófona de Educação, 8, 63-83.

Silva, M. O. (2009). Da Exclusão à Inclusão: Concepções e Práticas. Revista Lusófona de Educação, 13, 135-153.

Straatemeier, T. (2007). How to plan for regional accessibility? Transport Policy, 15, 127-137.

Suero, L. (2011). Inclusión-Integración. In M. González, S. Borakievich, A. Patiño, E. Vega, O. Velásquez, F. Cuncanchún, . . . C. Gotta, Memorias III Simposio Internacional Horizontes Humanos (pp. 173-177). Manizales: Horizontes Humanos.

Vlachou, A. (2004). Education and inclusive policy-making. International Journal of, 8(1), 3-21.

Vislie, L. (2003). From integration to inclusion: focusing global trends and changes in the western European societies. European Journal of Special Needs Education, 18(1), 17-35.

Thompson, C. B., & Walker, B. L. (1998). Basics of research (Part 12): Qualitative research. Air Med J, 17(2), 65-70.

Ir para o índice

ARTIGO 2 - ATITUDES DE INCLUSÃO NO IPLEIRIA

Carla Freire, Luís Ferreira, Catarina Mangas e Carina Rodrigues

Membros do iACT.

Citar este artigo: Freire, C., Ferreira, L., Mangas, C. & Rodrigues, C. (2015). Atitudes de inclusão no IPLeiria. In C. Mangas, C. Freire & M. Francisco (Orgs.), Inclusão e Acessibilidade em Ação - Diferentes percursos, um rumo. Leiria: iACT/IPLeiria, Artigo 2. [Online, disponível em http://iact.ipleiria.pt/]

Resumo

O estudo apresentado teve como principal objetivo identificar atitudes de inclusão na comunidade do Instituto Politécnico de Leiria (IPLeiria) que conta com cerca de onze mil elementos (estudantes, docentes e funcionários não docentes). De forma a abranger um maior número de participantes, foi realizado um inquérito por questionário ao qual responderam cerca de duas mil pessoas. Da análise dos dados foi percetível o esforço do IPLeiria no que se refere à dinamização de práticas inclusivas considerando diferentes públicos, apesar de ainda existir um conjunto de fatores que devem ser tidos em conta (e. g. aumento da formação e apoio prestado). Os participantes do estudo assumem-se como agentes fundamentais para o processo inclusivo, reconhecendo, no entanto, que a pessoa que se sente excluída deve também assumir o seu papel. Parece existir, portanto, uma consciencialização da comunidade do IPLeiria no que diz respeito à realidade que os cerca e aos meios a considerar para assumir a inclusão como um dos alicerces do Instituto.

Palavras-chave: Atitudes; Inclusão; Instituto Politécnico de Leiria

Abstract

The present study aims to identify inclusion attitudes in the community of the Instituto Politécnico de Leiria (IPLeiria) which has approximately eleven thousand members (students, teachers and non-teaching staff). In order to cover a large number of participants, a survey was conducted, having been answered by about two thousand elements. The data analysis showed the IPLeiria’s effort regarding the promotion of inclusive practices considering different audiences, although there is still a set of factors that should be taken into account (e.g. increase in training and support). Participants consider themselves to be key players in the inclusive process, acknowledging , however, that the person who feels excluded must also play their role. This shows that there is an awareness of the IPLeiria community regarding the context and the necessary means to consider inclusion one of the Institute’s bases.

Keywords: Attitudes; Inclusion; Instituto Politécnico de Leiria

1. Introdução

Os direitos fundamentais de qualquer ser humano têm subjacentes quatro valores fundamentais: a dignidade, a autonomia, a igualdade e a solidariedade (Quinn & Degener, 2002). A Organização das Nações Unidas (ONU) estipulou um conjunto de princípios e valores, que se encontram reunidos na Declaração Universal dos Direitos Humanos, onde enfatiza, logo no seu primeiro artigo, a igualdade e liberdade em dignidade e direitos de todos os seres humanos (UNRIC, n.d). O artigo 26.º, da referida declaração, estipula que toda a pessoa tem direito à educação, sendo que o ensino técnico e profissional deve ser generalizado, assim como o acesso ao ensino superior deve ser garantido em plena igualdade, a todos os seres humanos, em função do seu mérito.

A Declaração de Salamanca, reafirmando o direito à educação de todos os indivíduos, proclama que os sistemas de educação, assim como os programas educativos implementados, devem considerar a diversidade de características e necessidades (UNESCO, 1994). Partindo deste princípio, a alínea a) do artigo 3.º da Declaração Mundial sobre Educação Superior no século XXI (UNESCO, 1998) exclui qualquer discriminação baseada na raça, língua, género, religião, condições económicas, sociais, culturais ou em incapacidades físicas. Já a alínea d), do mesmo artigo, reforça a ideia de acesso, ao ensino superior, de membros de grupos específicos como sejam de: minorias étnicas, culturais e/ou linguísticas; elemento de povos que vivem sob dominação estrangeira e pessoas com deficiência, na medida em que todos estes indivíduos podem possuir experiências e talentos que sejam importantes para o desenvolvimento das sociedades e nações.

O acesso ao ensino superior de todos os que quiserem, independentemente das suas características específicas, é uma meta a alcançar. A inclusão no ensino superior permite a participação e a igualdade de oportunidades (Barbosa, 2002), no entanto, a presença de pessoas com necessidades educativas especiais neste nível de ensino é um novo desafio.

Todas as diferenças presentes na sala de aula devem ser reconhecidas e legitimadas pelos diversos protagonistas da ação educativa (alunos, professores, coordenadores e diretores), devendo os mesmos participar na criação de condições de ensino e aprendizagem para todos (Ferrari & Sekkel, 2007). A inclusão nos diferentes níveis de ensino deve fazer-se a partir de experiências e do reconhecimento das diferenças entre todos os alunos e não através da padronização (ibidem).

A universalidade do direito à educação ou educação inclusiva impede a discriminação por razões religiosas, étnicas, estatuto social ou económico da família, estatuto de refugiado, género ou deficiência (Rodrigues, 2006). No entanto a inclusão pode ser bem ou mal sucedida, de acordo com os fatores ambientais, que segundo a Classificação Internacional de Funcionalidade e Saúde (CIF), podem ser: de ordem individual, aqueles que dizem respeito ao espaço físico – casa, rua, escola, onde o indivíduo se encontra; ou sociais, aqueles que dizem respeito às estruturas sociais, tais como o trabalho, a escola, organismos políticos, transportes, leis, regulamentos, ideologias e atitudes, desempenhando estas últimas um papel determinante na inclusão de qualquer indivíduo (Organização Mundial da Saúde, 2004).

Correia e Martins (2002) definiram um conjunto de princípios subjacentes ao conceito de educação inclusiva, partindo do princípio de que todos os alunos, independentemente da sua etnia, condição linguística ou económica, sexo, orientação sexual, idade, capacidades de aprendizagem, estilos de aprendizagem, cultura e religião, merecem estar incluídos no contexto escolar:

  • têm o direito de ser educados em ambientes inclusivos;
  • são capazes de aprender e de contribuir para a sociedade onde estão inseridos;
  • devem ter oportunidades iguais de acesso a serviços de qualidade que lhes permitam alcançar sucesso;
  • devem ter acesso a serviços de apoio especializados, quando deles necessitem, que se traduzam em práticas educativas ajustadas às suas capacidades e necessidades;
  • devem ter acesso a um currículo diversificado;
  • devem ter a oportunidade de trabalhar em grupo e de participarem em atividades extraescolares e em eventos comunitários, sociais e recreativos;
  • devem ser ensinados a apreciar as diferenças e semelhanças existentes entre os seres humanos.

2. Atitudes de inclusão na educação

As atitudes são sentimentos favoráveis ou desfavoráveis de um indivíduo perante um objeto (Fishbein & Ajzen, 1975) ou relativos ao desempenho de uma determinada função (Venkatesh, Morris, Davis & Davis, 2003). De acordo com Eagly e Chaiken (1993), as atitudes formam-se com base em tendências psicológicas, as quais se referem ao estado interno de um indivíduo podendo-se expressar de três modos diferentes: cognitivo, afetivo e comportamental. As atitudes podem ser cognitivas quando são dadas por pensamentos, ideias, opiniões e crenças que expressam uma avaliação mais ou menos favorável; podem ser afetivas, quando se referem a emoções e sentimentos provocados pelo objeto da atitude; e podem ser comportamentais quando dizem respeito a comportamentos ou a intenções comportamentais, nas quais as atitudes se podem manifestar.

A literatura científica apresenta estudos relativos às atitudes de inclusão na educação, estando a maioria relacionada com a atitude dos professores face a alunos com deficiência que frequentam os ensinos básico e secundário. Dentre os estudos encontrados destacamos o estudo de Koutrouba, Vamvakari & Theodoropoulos (2008), na Grécia, Ross-Hill (2009), no Louisiana - Estados Unidos da América, Fakolade e Adeniyi (2009) na Nigéria e Bradshaw (2009), realizado nos Emirados Árabes Unidos.

Koutrouba, Vamvakari & Theodoropoulos (2008), verificaram que os professores gregos tinham atitudes positivas em relação à inclusão de alunos com Necessidades Educativas Especiais (NEE) na sala de aula. No entanto, os docentes tinham mais dificuldade em aceitar alunos com deficiências mais profundas, problemas intelectuais e comportamentais do que em incluir alunos com dificuldades de aprendizagem ou outras deficiências ligeiras. Neste estudo, verificou-se que os professores com mais experiência tinham atitudes favoráveis, face à inclusão de alunos com NEE. Os autores chegaram à conclusão que a maioria dos docentes mostrou-se disponível para frequentar cursos de pós-graduação em Educação Especial (EE), o que iria permitir aumentar as qualificações desses docentes e a sua confiança, sempre que eles tivessem na sala de aula alunos com deficiência.

Um ano mais tarde Ross-Hill (2009) elaborou um estudo no estado do Louisiana - Estados Unidos da América com professores do ensino regular que teve como objetivo a avaliação de atitudes perante a inclusão, incapacidade e necessidades especiais. Deste estudo conclui-se que o nível de ensino não altera significativamente as atitudes, porém a experiência profissional, a formação académica e a formação na área da EE podem contribuir para algumas variações de atitudes.

No mesmo ano Fakolade e Adeniyi levaram a cabo um estudo com o intuito de avaliarem a atitude dos professores do ensino secundário face à inclusão de alunos com deficiência. Os resultados apontam para uma variação de atitudes de acordo com o género, estado civil e profissionalização. O professores do sexo feminino, casados e profissionalizados revelam atitudes mais positivas no que se refere à inclusão de alunos com deficiência, enquanto que a variável experiência profissional pareceu não interferir nas atitudes dos docentes.

Num estudo de Bradshaw (2009), verificou-se que a maioria dos professores do ensino básico e secundário que tinham nas suas turmas alunos com NEE não tinham qualquer formação que lhes permitisse trabalhar com estes alunos. Apesar dessa constatação, a maioria dos professores considerou que deveria existir formação nessa área, nomeadamente no que diz respeito aos distúrbios de comportamento e sobredotação. A falta de formação contrasta com a experiência destes professores que afirmam já ter ensinado alunos com deficiência em turmas regulares ou em turmas especiais (só com estes alunos), em escolas do ensino regular público ou privado.

Dos participantes do estudo (ibidem), 41% indicou que a inclusão de alunos com deficiência na escola era uma oportunidade para trabalhar com NEE e para 36% a inclusão destes alunos era mesmo um benefício para todas as outras crianças. O estudo permitiu ainda constatar que as crianças com problemas de comportamento eram as mais difíceis de incluir, seguidas das que apresentavam deficiência intelectual, sendo as que têm deficiências físicas e dificuldades de aprendizagem as mais fáceis de incluir na sala de aula.

3. Método

A investigação aqui descrita, teve como principal objetivo a identificação das atitudes de inclusão na comunidade do IPLeiria. O estudo realizado foi de caráter exploratório, uma vez que se pretendia identificar tópicos relevantes, que posteriormente possam ser alvo de investigação mais detalhada (United States General Accounting Office, 1990).

Este estudo enquadra-se num meio académico e científico. O sujeito de estudo pertence à comunidade do IPLeiria, abrangendo pessoas ligadas às diferentes unidades orgânicas. Neste sentido, os elementos que fazem parte deste estudo são estudantes, docentes, funcionários não docentes e investigadores ligados de alguma forma ao IPLeiria.

A técnica de recolha de dados selecionada foi o inquérito por questionário, tendo em conta que permite a recolha de dados num número considerável de sujeitos, com o intuito de analisar as atitudes, opiniões, crenças ou comportamentos (Fortin, 2009; Freimut, Punter, Biffl, & Ciolkowski, 2002; Quivy & Campenhoudt, 1998).

O questionário é constituído por seis grupos de perguntas: grupo 1, caracterização do sujeito de estudo; grupo 2, relação com a deficiência; grupo 3, análise de grupos de pessoas que devem ser considerados para a inclusão no ensino superior; grupo 4, deteção de barreiras; grupo 5, auto perceção de atitudes de inclusão; e, grupo 6, relacionado com a vivência de situações de exclusão.

Após a construção do questionário, procedeu-se a um teste piloto, do qual resultaram algumas alterações, com o intuito de tornar o questionário acessível a todos, tais como: eliminação de perguntas redundantes; simplificação da linguagem escrita e utilização de escala única para todas as questões de resposta múltipla (1-Concordo; 2-Discordo; 3-Não tenho opinião). Após a retificação do questionário, este foi disponibilizado na plataforma Moodle, tendo sido enviado um email a toda a comunidade do IPLeiria a solicitar o seu preenchimento durante os meses de março e abril de 2012.

Após o período de preenchimento, foram recolhidos 2218 questionários, que após a remoção de questionários totalmente vazios, originaram uma base de dados constituída por 2012 questionários válidos. Os dados quantitativos foram tratados com recurso ao SPSS, tendo sido feita uma análise de conteúdo dos dados qualitativos obtidos através das questões de resposta aberta.

4. Resultados

4.1 Caracterização sócio demográfica dos participantes

Dos 2012 participantes que responderam ao questionário, 66% são do género feminino. A maioria dos respondentes são estudantes (80,8%), seguindo-se os funcionários docentes (11,3%) e não docentes (6,3%). Também responderam ao questionário pessoas sem vínculo direto ao IPLeiria (1,6%), tais como: alguns investigadores de núcleos de investigação ou funcionários de manutenção. As idades variam dos 18 aos 78 anos, verificando-se uma média de 24,58 anos no grupo dos estudantes, de 38,45 no grupo dos docentes e 37,14 anos no grupo de não docentes. A maioria das respostas provém da Escola Superior de Tecnologia e Gestão -ESTG (37%) e da Escola Superior de Educação e Ciências Sociais - ESECS (32%), seguindo-se a Escola Superior de Artes e Design - ESAD (9%), a Escola Superior de Saúde - ESSLEI e a Escola Superior de Tecnologia do Mar - ESTM (8% cada). Responderam também ao questionário, pessoas dos Serviços Centrais (3%), do Campus 5 (2%) e Outras Unidades Orgânicas (1%), tais como Núcleos de Investigação.

4.2 Relação com a deficiência

No que se refere à relação com a deficiência, 3,5% dos participantes revela ter uma deficiência, enquanto 3,9% dos inquiridos optou por se manter numa posição neutra (sem opinião). No que concerne ao contacto próximo com a deficiência: 26,8% dos elementos têm alguém no seio familiar; 52,8% têm amigos; 34,6% trabalha ou estuda com alguém; e, 89,7% conhece alguém com deficiência. A maioria dos inquiridos (75,5%) concorda que tem interesse pelo assunto embora 6,2% revele não ter conhecimentos na área da deficiência.

4.3 Análise de grupos de pessoas que devem ser considerados para inclusão no ensino superior

De acordo com a Tabela 1, é possível verificar que a maioria dos inquiridos concorda com a inclusão, dos diferentes grupos de pessoas, no ensino superior, existindo, contudo, alguns grupos que se destacam pelo facto de terem percentagens de concordância inferiores a 50%, tais como: toxicodependentes, com doenças infetocontagiosas e reclusos.

No que se refere a indivíduos com doenças infetocontagiosas, 43,5% dos participantes no estudo, está de acordo com a sua inclusão no ensino superior, sendo que 30,3% discorda e 26,2% não manifesta a opinião. No caso de pessoas toxicodependentes, ainda que 46% dos inquiridos concorde com a sua inclusão no ensino superior, 28% dos respondentes discorda e 25,8% não opina. Relativamente a reclusos, 49,2% dos respondentes concorda com a sua inclusão no ensino superior, enquanto 24,2% discorda e 26,6% não tem opinião.

Item

Concordo

Discordo

Não tenho opinião

Reclusos

49,2%

24,2%

26,6%

Pessoas com doenças infetocontagiosas

43,5%

30,3%

26,2%

Sem-abrigo

60,5%

15,3%

24,2%

Pessoas com magreza extrema

75,3%

12,7%

12,0%

Pessoas com obesidade extrema

77,2%

11,4%

11,4%

Pessoas de grande estatura

73,9%

15,5%

10,7%

Pessoas de pequena estatura

74,3%

15,2%

10,5%

Pessoas com deficiência

p>91,9%

3,1%

5,0%

Toxicodependentes

46,0%

28,1%

25,8%

Idosos

75,0%

12,3%

12,7%

Homens

75,3%

15,8%

8,9%

Mulheres

75,8%

15,5%

8,7%

Estrangeiros

84,2%

8,3%

7,5%

Minorias étnicas

77,0%

10,4%

12,6%

Tabela 1 – Distribuição de respostas de grupos que devem ser considerados para inclusão no ensino superior

4.4 Promoção da inclusão de estudantes com deficiência no Instituto Politécnico de Leiria

A tabela 2, que apresenta os resultados relativos às condições de promoção da inclusão de estudantes com deficiência no IPLeiria, permite verificar a diversidade de opiniões. Sendo possível notar uma elevada percentagem de inquiridos, cerca de 50%, que não manifesta a opinião, nomeadamente no que se refere a: fornecimento de material alternativo (44,7%); existência de aulas, tutorias ou explicações especiais (47,6%); de interpretação de Língua Gestual Portuguesa (52,8%); de Unidades Curriculares sobre acessibilidade em todos os cursos (45,6%); apoio de profissionais especializados (49,1%); conhecimento de estratégias de inclusão por parte dos professores (48,7%); e realização de rastreios periódicos (42,2%).

Item

Concordo

Discordo

Não tenho opinião

Existem soluções para barreiras físicas e arquitetónicas

71,5%

17,8%

10,7%

São fornecidos materiais em formatos alternativos

28,8%

26,5%

44,7%

Existem aulas, tutorias ou explicações especiais

35,4%

17,0%

47,6%

Existe interpretação em Língua Gestual Portuguesa

20,9%

26,3%

52,8%

Existem unidades curriculares sobre acessibilidade em todos os cursos

14,9%

39,5%

45,6%

Existe o apoio de profissionais especializados na promoção da inclusão

30,8%

20,2%

49,1%

Todos os professores conhecem estratégias de inclusão

15,0%

36,3%

48,7%

Responsabiliza-se cada estudante pela inclusão dos colegas com deficiência

39,4%

25,2%

35,4%

Fazem-se rastreios periódicos a problemas visuais, auditivos e outros

13,3%

44,5%

42,2%

É necessário criar mais serviços específicos para satisfazer as necessidades das pessoas com deficiência

76,6%

4,8%

18,5%

Todos os serviços de apoio têm soluções para pessoas com deficiência

30,3%

39,9%

29,8%

Tabela 2 - Distribuição de respostas relativas a condições de promoção de inclusão de estudantes com deficiência no IPLeiria

No âmbito deste grupo de questões, foi solicitado, em caso de deteção, a identificação de barreiras à Inclusão no Instituto Politécnico de Leiria. De acordo com a análise das respostas, as barreiras que mais se destacaram pelos inquiridos são as seguintes:

  • i) Falta de acesso aos meios físicos e arquitetónicos “na cantina não há elevador para estudantes com mobilidade reduzida para ter acesso ao bar da escola”;
  • ii) Acesso a material/recursos didáticos adaptados “Não existem muitos livros em braille na biblioteca”;
  • iii) Valor das propinas “Propinas são uma barreira para quem não pode pagar”;
  • iv) Falta de aceitação entre colegas “os estudantes portugueses são particularmente xenófobos mais do que a maioria dos países europeus”;
  • v) Especificidades dos trabalhadores estudantes “Regime presencial obrigatório é uma barreira - exclui os trabalhadores estudantes e frequentemente desfavorece-os independentemente de estar regulamentado que os professores deveriam colaborar com os mesmos”;
  • vi) Falta de sensibilidade por parte de professores, profissionais e alunos “nem todos os professores têm capacidade para a inclusão de pessoas diferentes”; “falta de sensibilidade por parte de alguns profissionais e alunos da instituição”.
4.5 Auto perceção de atitudes de inclusão

O Gráfico 1, apresenta as respostas relativas às atitudes na promoção da inclusão. De acordo com este gráfico podemos verificar que 81,8% dos inquiridos refere contribuir para a melhoria da qualidade de vida das pessoas, sendo que 84% assume mesmo que compete a si promover a inclusão. Na perspetiva de alguns dos inquiridos (34,6%), os profissionais especializados são também promotores da inclusão, embora sejam mais os que consideram que estes não têm influência neste processo (49,5%). Pela análise do gráfico percebe-se, ainda, que para 58,6% dos participantes do estudo, o processo de inclusão passa também pela própria pessoa que se sente excluída.

No que se refere à resolução de problemas de inclusão, 81,7% dos respondentes, concorda que compete à escola, enquanto 10% dos participantes discordam.

gráfico de barras indicando as percentagens por item

Gráfico 1 – Auto perceção de atitudes de inclusão

4.6 Vivência de situações de exclusão em contexto escolar/profissional

Dos 2012 participantes no estudo, 402 já vivenciaram uma situação de exclusão em contexto escolar/profissional, sendo 343 alunos, 37 docentes, 16 não docentes e 6 pessoas com outro vínculo ao IPLeiria. Não responderam a esta questão 317 pessoas inquiridas.

As principais causas de exclusão em contexto escolar/profissional referidas pelos inquiridos são:

  • i) Imagem/aspeto físico dos alunos - “devido à minha cor de pele, é frequente passar por situações de exclusão”;
  • ii) Forma de ser/agir - “a exclusão pelo credo”, “(..) a orientação sexual (…)”;
  • iii) Falta de acompanhamento educativo, nomeadamente pelos serviços administrativos - “indiferença para com os alunos”;
  • iv) Pertença a grupos minoritários - “alunos Erasmus são postos de lado”;
  • v) Deficiência - “(..) aluna com deficiências motoras (..) excluída pelos colegas da turma por ter características diferentes;
  • vi) Violência escolar - “situações de bullying psicológico e exclusão de grupo de pares”, “recusado a fazer as ditas praxes”;
  • vii) Meios físicos e arquitetónicos –“Um aluno de cadeira de rodas que não teve acesso ao local de aulas.”
  • viii) Falta de aceitação do mercado de trabalho – “não fui admitida num posto profissional mais elevado devido às minhas limitações, que na minha opinião, em absolutamente nada prejudicariam o meu desempenho profissional.”;
  • ix) Tipo de distribuição de serviço docente - “(…) colegas menos qualificados do que eu e com menos anos de serviço quer na escola quer no ensino superior, apenas porque têm relações de afetividade (familiares ou amizade) privilegiadas!”.
4.7 Sugestões

No que se refere a sugestões que possam contribuir para a inclusão no IPLeiria, foram destacadas as seguintes:

  • i) Ações de sensibilização à comunidade escolar “estratégias de sensibilização”; “formação/ instrução”;
  • ii) Apoio aos alunos com deficiência – necessidade de deteção e acompanhamento de alunos com deficiência “deveriam identificar casos” (..) “encaminhar” (..) entre os envolvidos”; utilização de técnicas e criação de recursos/materiais de apoio “(..) mais recursos disponíveis”;
  • iii) Melhoria da vida académica – no que se refere a: a) Trabalhos de grupo “deviam ser facultativos, pela quantidade de conflitos que geram”; b) Avaliação “(..) graus de dificuldade semelhantes”; c) Ter em conta situações de trabalhadores-estudantes e condições financeiras “não excluírem pessoas que se encontram numa situação económica desfavorável”. D) Prolongamento de serviços para todos os alunos, inclusive alunos dos “cursos de especialização tecnológica” que consideram ter sido “excluídos de muitos pontos essenciais da vida académica”;
  • iv) Apoio a alunos do ensino a distância - melhoria na seleção do corpo docente “Melhor seleção do corpo docente para cada realidade escolar. Que faz um professor no ensino à distância se não gosta do que faz…”

5. Discussão

A partir dos dados recolhidos, é percetível que o número de participantes (2012), apesar de elevado, apenas corresponde a uma pequena parte da comunidade IPLeiria que conta com cerca de onze mil elementos. As respostas dos inquiridos retratam, portanto, a opinião de um grupo de docentes, funcionários não docentes e, em especial, estudantes que não sendo a totalidade permitiram a identificação de atitudes de inclusão de um grande grupo de sujeitos pertencente ao Instituto Politécnico de Leiria.

Poucos foram os participantes que admitiram ter uma deficiência, reconhecendo, por outro lado, que no seu contexto (familiar, amizade, profissional) existem pessoas que apresentam algum tipo de deficiência. Este é, portanto, um conceito conhecido pelos inquiridos, que faz parte do seu meio envolvente, sendo que mais de metade das referências aponta mesmo para um interesse dos participantes sobre o assunto.

O facto dos inquiridos manifestarem conhecimentos e/ou interesse pela área da deficiência é, segundo Ferrari e Sekkel (2007), um fator chave para o processo de inclusão escolar, dado que este, na opinião dos autores, deve fazer-se partindo do reconhecimento das diferenças individuais entre todos os estudantes, evitando, desta forma a padronização.

Analisando a inclusão de grupos minoritários no IPLeiria foi possível verificar que as pessoas com deficiência são aquelas que reúnem maior consenso em relação à possibilidade da sua inclusão no Ensino Superior, seguindo-se as pessoas estrangeiras. Já os toxicodependentes, as pessoas com doenças infetocontagiosas e os reclusos são os grupos que os participantes menos consideram na inclusão neste nível de ensino.

A inclusão de pessoas estrangeiras, pode explicar-se pelo facto do IPLeiria, à semelhança de outras instituições de Ensino Superior, pertencer à rede de estabelecimentos de ensino que dinamiza programas internacionais de mobilidade como o Programa Erasmus + ou o Programa Comenius, que traz ao IPLeiria muitos estudantes estrangeiros oriundos não só da União Europeia, mas também de outros países. No que diz respeito ao elevado nível de concordância sobre a inclusão de pessoas com deficiência, poderá estar relacionado com as tendências sócio-culturais das últimas décadas que trouxeram à discussão a problemática da inclusão de pessoas com deficiência, nomeadamente em encontros internacionais que resultaram na publicação de documentos orientadores como a Declaração de Salamanca, sendo menos comum encontrar estudos ou publicações que retratem medidas e acordos sobre a inclusão de outras minorias.

Associado ao facto dos participantes destacarem como pessoas a considerar no processo de inclusão as que têm algum tipo de deficiência, surge a referenciação de barreiras à plena inclusão deste grupo de pessoas. Embora muitos participantes não manifestem opinião sobre as condições do Instituto para a promoção da inclusão de estudantes com deficiência, o mesmo não acontece, portanto, com a indicação dos obstáculos encontrados no IPLeiria, o que reforça o parecer da Organização Mundial de Saúde (2004), retratado na CIF, que considera os fatores ambientais como agentes que influenciam a inclusão. Estes incluem, segundo os inquiridos, a falta de meios físicos e arquitetónicos, a dificuldade de acesso a material e recursos didáticos adaptados, a falta de sensibilização de professores, técnicos e alunos, entre outros aspetos já enunciados no ponto 4.4 do artigo.

Percebe-se, destas respostas, que tal como Ferrari & Sekkel (2007), também os participantes consideram que os diversos protagonistas da ação educativa devem contribuir para a criação de condições favoráveis à inclusão, assumindo-se eles próprios como promotores da inclusão e da melhoria da qualidade de vidas das pessoas (embora reconheçam o papel preponderante da pessoa que se sente excluída). Este sentimento de exclusão é, aliás, partilhado por cerca de metade dos inquiridos que assume já ter vivido situações deste tipo devido a vários aspetos como a sua imagem, a forma de agir ou ser, entre outros.

Esta exclusão contraria o enunciado na Declaração Mundial sobre Educação Superior no Século XXI (UNESCO, 1998) e a opinião de Correia e Martins (2002), que assumem que todos os estudantes, independentemente das suas características individuais, merecem estar incluídos no contexto escolar. De forma a reduzir os casos de exclusão, os inquiridos apresentam várias sugestões: reiteram a referência às ações de sensibilização à comunidade, acreditando, tal como Ross-Hill (2009) que o aumento de formação altera as atitudes, incluindo ainda outras propostas como o aumento do apoio a estudantes com deficiência ou a melhoria da vida académica diária com adaptações pedagógicas e das condições dos serviços que o Instituto oferece.

6. Conclusão

O Instituto Politécnico de Leiria tem vindo a desenvolver diversas práticas inclusivas, adaptando espaços e serviços a públicos diversificados (e.g. pessoas com deficiência, estrangeiros e idosos). Denota-se, contudo, que há ainda um caminho a percorrer, já que persistem obstáculos à inclusão que necessitam ser analisados, dando lugar a ambientes verdadeiramente inclusivos.

Este percurso é assumido pela comunidade IPLeiria como uma necessidade, dado que alguns participantes demonstram vivenciar situações de exclusão. Para tal seria fundamental aumentar a formação e o apoio prestado, melhorando, assim, a vida académica de todos os que passam pelo Instituto.

Do estudo efetuado ressaltam algumas notas de reflexão, nomeadamente o facto de ter havido uma preocupação na acessibilidade do questionário (uniformizando a escala utilizada), o que, por outro lado, gerou alguma incoerência entre o enunciado e o tipo de resposta. A extensão do inquérito foi outra das limitações identificadas, podendo contribuir para alguma dispersão ao longo do seu preenchimento.

Do acima exposto, percebe-se que se mantém a necessidade de reforçar a investigação nesta área, situação que está, aliás, prevista no âmbito da Unidade de Investigação Inclusão e Acessibilidade em Ação (iACT), nomeadamente através de projetos de intervenção com a comunidade.

Referências Bibliográficas

Barbosa, M.M.(2002). A inclusão e a diversidade no ensino superior. In Educação e Mudança, n. 9/10, pp. 15-29

Bradshaw, K. (2009). Teachers’ Attitudes and Concerns Towards Integrating Students with Special Needs in Regular Classrooms: A United Arab Emirates Perspective. In The Journal of the International Association of Special Education, V10 (1), pp. 49-55. Acedido a 23 de dezembro de 2011 a partir de http://eric.ed.gov/?id=EJ843436

Correia, L. & Martins, A. (2002). Inclusão: Um guia prático para educadores e professores. Braga: Quadrado Azul Editora.

Eagly, A. H. e Chaiken, S. (1993). The nature of attitudes. In Eagly, A. H. & Chaiken, S. (Eds.) The psychology of attitudes (pp. 1-21). Fort Worth, TX : Harcourt Brace Jovanovich College Publishers.

Fakolade, O. & Adeniyi , S. (2009). Attitude of teachers the inclusion of children with special needs in the general education classroom: The case the teachers of selected schools in Nigeria. In International Electronic Journal of Elementary Education, V1(3), pp. 60-64. Acedido a 14 de outubro de 2011 a partir de http://eric.ed.gov/?id=EJ843269

Ferrari, M. & Sekkel, M. (2007). Educação inclusiva no ensino superior: um novo desafio. In Psicologia, Ciência e Profissão, vol.27, n.4, pp. 636-647

Fishbein, M. & ajzen, I. (1975). Belief, Attitude, Intention, and Behavior: An Introduction to Theory and Research. Reading. MA: Addison-Wesley. Acedido a 21 de julho de 2010 a partir de http://people.umass.edu/aizen/f&a1975.html.

Fortin, M.-F. (2009). O Processo de Investigação: Da concepção à realização. Loures: Lusociência - Edições Técnicas e Científicas, Lda.

Freimut, B., Punter, T., Biffl, S., & Ciolkowski, M. (2002). State-of-the-Art in Empirical Studies. ViSEK - Virtuelles Software Engineering Kompetenzzentrum. Acedido a 12 de setembro de 2014 a partir de http://www.academia.edu/954084/State-of-the-art_in_empirical_studies

United States General Accounting Office. (1990). Case Study Evaluations. GAO/PEMD-91-10.1.9 Program Evaluation and Methodology Division. Washington, D.C.: United States General Accounting Office.

Koutrouba, K. Vamvakari, M. e Theodoropoulos H. (2008). SEN students' inclusion in Greece: factors influencing Greek teachers' stance. In European Journal of Special Needs Education, V23 (4), pp. 413-421. Acedido a 28 de novembro de 2011 a partir de http://dx.doi.org/10.1080/08856250802387422.

Organização Mundial de Saúde [OMS]. (2004). CIF: Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (Tradução de Amélia Leitão). Acedido a 15 de maio de 2014 a partir de http://www.inr.pt/uploads/docs/cif/CIF_port_%202004.pdf

Quinn, G. e Degener, T. (2002). The moral authority for change: Human rights values and the worldwide process of disability reform. In G. Quinn e T. Degener (Eds.), Human rights and disability: The current use and future potential of United Nations human rights instruments in the context of disability (pp. 13-28). New York and Geneva: Office of the United Nations Commissioner for Human Rights.

Quivy, R., & Campenhoudt, L. V. (1998). Manual de Investigação em Ciências Sociais. Lisboa: Gradiva - Publicações Lda.

Rodrigues, D. (2006). Educação Inclusiva, Estamos a fazer Progressos? Fórum de Estudos de Educação Inclusiva. Lisboa: FMH Edições

Ross-Hill R. (2009). Teacher attitude towards inclusion practices and special needs students. In Journal of Research in Special Educational Needs, V9 (3), pp. 188–198. Acedido a 15 de outubro de 2011 a partir de http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/j.1471-3802.2009.01135.x/pdf

UNESCO (1998). World Declaration on Higher Education for the twenty-first Century: Vision and Action. World Conference on Higher Education. Acedido a 11 de abril de 2014 a partir de http://www.unesco.org/education/educprog/wche/declaration_eng.htm

UNESCO (1994). Declaração de Salamanca sobre princípios, política e práticas na área das necessidades educativas especiais, acedido a 20 de junho de 2014 a partir de www.unesdoc.unesco.org/images/0013/001393/139394por.pdf

UNRIC. (n.d.) Declaração Universal dos Direitos do Homem, acedido a 20 de junho 2014 a partir de http://www.unric.org/pt/informacao-sobre-a-onu/direitos-humanos/14.

Venkatesh, V., Morris, M. G., Davis, G. B. & Davis, F. D. (2003). User Acceptance of Information Technology: Toward a unified view. In MIS Quarterly, 27, pp. 425-478

Ir para o índice

ARTIGO 3 - PRÁTICAS PARA UM ELEARNING ACESSÍVEL NO INSTITUTO POLITÉCNICO DE LEIRIA

Manuela Francisco, Norberto Sousa, Cláudio Esperança, Vitor Rodrigues e Josélia Neves

Membros do iACT

Citar este artigo: Francisco, M., Sousa, N., Esperança, C., Rodrigues, V.. & Neves, J. (2015). Práticas para um elearning acessível no Instituto Politécnico de Leiria. In C. Mangas, C. Freire & M. Francisco (Orgs.), Inclusão e Acessibilidade em Ação - Diferentes percursos, um rumo. Leiria: iACT/IPLeiria, Artigo 3. [Online, disponível em http://iact.ipleiria.pt/]

Resumo

Neste trabalho apresenta-se o caso do Instituto Politécnico de Leiria (IPLeiria) que desde o seu primeiro curso a distância, em 2007, aposta na acessibilidade e na inclusão de todas as pessoas que se proponham frequentar os nossos cursos no regime de eLearning. Este desafio surgiu devido ao acréscimo de pessoas a entrar no ensino superior com algum tipo de deficiência ou incapacidade, de acordo com os dados apresentados pela DGES/DSAES (2012). O regime de ensino a distância é por si só potenciador de inclusão pois evita deslocações à instituição, permite preservar a identidade dos utilizadores e é veiculado pela internet possibilitando a acesso através dos dispositivos que cada utilizador utiliza e respetivos produtos de apoio. Face a este potencial inclusivo que os ambientes virtuais apresentam, a Unidade de Ensino a Distância (UED) desenvolveu o modelo pedagógico para o Ensino a Distância e eLearning (Costa et al., 2012), sendo a acessibilidade um dos pilares deste modelo. Na prática isto significa que desde 2007 a UED tem vindo a implementar práticas inclusivas na sua oferta formativa a distância. Isto envolve plataformas, conteúdos, comunicação-interação, estratégias pedagógicas assim como formação e sensibilização de toda a comunidade académica. Assim, neste trabalho focamos essencialmente a componente tecnológica e pedagógica da acessibilidade no eLearning no IPLeiria, deixando alguns pontos de reflexão com base na nossa experiência, na nossa investigação e no feedback que nos é fornecido pelos estudantes e professores.

Palavras-chave: acessibilidade, eLearning, inclusão, WCAG, tecnologia.

Abstract

This work presents the case of the Polytechnic Institute of Leiria (IPLeiria) which, since its first distance learning course in 2007, bet on accessibility and inclusion of all people who propose attending our eLearning courses. This challenge arose due to the increase of people arriving to higher education with any kind of impairment or disability, particularly hearing, motor, visual and oncology, according to the data presented by DGES/DSAES (2012). The distance learning and eLearning is by itself an educational approach that promotes inclusion because it prevents people moving to the institution, preserves the identity of users in virtual environments and is broadcasted over the internet enabling access through devices and assistive technology that each person uses. Due to this inclusive potential, the Distance Learning Unit (UED) of IPLeiria developed the pedagogical model for distance education and eLearning (Costa et.al 2012), being the accessibility one of the pillars of this model. This means, since 2007, the Distance Learning Unit has been implementing inclusive practices in their distance education courses. This involves platforms, content, communication-interaction, pedagogical strategies as well as training and awareness of the entire academic community. Thus, in this paper we focus mainly technological and pedagogical component of accessibility in eLearning in IPLeiria, leaving some points for reflection based on our experience, on our research and feedback that is provided by students and teachers.

Keywords: accessibility, eLearning, inclusion, WCAG, technology

1. Enquadramento

O IPLeiria é uma instituição de referência em Portugal na área da inclusão, não só pela investigação que tem vindo a desenvolver, nomeadamente através do núcleo de investigação em inclusão e acessibilidade (iACT), mas também através de práticas inclusivas desenvolvidas por pessoal técnico especializado do gabinete de apoio ao estudante (SAPE), do centro de recursos para a inclusão digital (CRID) e da unidade de ensino a distância (UED). No caso específico do ensino a distância, o IPLeiria foi a primeira instituição a incluir a acessibilidade como um fator basilar no seu modelo de ensino a distância. Este pilar da acessibilidade envolve 3 fatores: tecnológicos - plataforma e conteúdos, pedagógicos - formação dos professores e sociais – sensibilização da comunidade académica. Isto significa que em termos de tecnologia se pretende implementar as diretrizes WCAG, em termos pedagógicos pretende-se dotar os docentes de competências tecnológicas e na adequação de estratégias pedagógicas que promovam a inclusão, e em termos sociais procura-se sensibilizar a comunidade académica para a importância da partilha do conhecimento e da comunicação em rede independentemente do perfil de cada um.

2. Conceitos intrínsecos ao eLearning acessível

2.1 O conceito “para todos”

O conceito de “para Todos” marcou o virar de século como nova postura na forma como se vê a inclusão, particularmente de pessoas com deficiência, em diferentes esferas sociais. A preocupação com a inclusão foi notória particularmente após a Declaração de Madrid de1987; no entanto, passou-se por um período de descriminação positiva, pela simples utilização da designação “pessoas portadoras de deficiência” em substituição de “deficientes”. Com a CIF (2004) o enfoque centra-se nas funções do corpo e nas limitações impostas pelo meio, pelo que o termo “portadores de deficiência” é substituído por “pessoa com deficiência ou incapacidade. Com o evoluir da terminologia, o conceito de “inclusão” vai-se distanciando da deficiência, sendo dado ênfase ao contexto e à diversidade. Isto significa que uma sociedade inclusiva é aquela que privilegia a especificidades de cada individuo, sendo necessário criar condições para que cada um possa participar ativamente na comunidade onde se vê inserido. E criar condições significa tornar acessível a participação de todos e para todos em determinado contexto, considerando as tecnologias existentes e o perfil de cada indivíduo. No caso específico da web, que a partir da primeira década deste milénio se tornou massiva, a acessibilidade passa a ser um aspeto fundamental para a inclusão de todos os cidadãos. Porém, a acessibilidade ainda é vista como um problema, não só pelo desconhecimento de “como fazer” como pela falta de normas e de uma legislação que obrigue ao cumprimento das mesmas.

2.2 Legislação em Portugal

Em Portugal, o Instituto de Informática na sua página oficial, disponibiliza uma lista das normas europeias de tecnologias de informação a aplicar em situações específicas. Desta lista constam várias secções da CEN/TC, ISSO/TC, ISO/IEC JTC 1/SC e as diretrizes de acessibilidade WCAG. Em 2007 o governo português procura regulamentar a implementação das WCAG (nível A para os sites da Administração Pública) através do documento RCM nº 155/2007. Em 2012 vai mais longe com a Lei nº 36/2011 e a RCM nº 91/2012, onde é referido que a Administração Pública está obrigada a cumprir o nível “A” das WCAG para a informação disponibilizada na internet e o nível “AA” para os serviços disponibilizados na internet.

2.3 Abordagens ao eLearning acessível

A acessibilidade no e-elearning pode ter diferentes abordagens que poderão estar dependentes do modelo pedagógico utilizado e do próprio conceito de acessibilidade assumido pela instituição. Alguns autores como Lee, Kumar & Barker (2010), Musamba, Oboko & Nyongesa (2013) defendem um modelo centrado no utilizador - onde o interface da plataforma e os conteúdos são apresentados conforme as definições aplicadas no perfil do utilizador. Esta abordagem poderá ser particularmente interessante quando o modelo pedagógico adotado for o de autoformação. No IPLeiria testámos este modelo no âmbito do projeto EU4ALL, onde foram envolvidos 18 participantes com diferentes tipos de necessidades. A maior dificuldade reportada pelos estudantes e professores do curso piloto, foi a complexidade dos formulários do perfil e dos conteúdos, pois apresentavam muitas opções. O que mais agradou aos participantes foi a variedade de formatos do mesmo conteúdo.

Uma outra abordagem que pode estar associada ao eLearning acessível ou inclusivo, assenta nas premissas de um modelo de aprendizagem pluralista defendido por alguns autores como Berner (2012), Giselbrecht (2009). Este modelo, centrado no estudante, aposta na diversidade: desde os variados aspetos culturais aos diferentes estilos de aprendizagem. O paradigma do modelo pluralista aplicado ao eLearning assenta na diversidade dos conteúdos, diversidade de estratégias pedagógicas, diversidade de estudantes e diversidade de tecnologias. Esta abordagem poderá ser particularmente interessante quando aplicado um o modelo pedagógico colaborativo.

No IPLeiria ainda não temos um modelo de acessibilidade definido, contudo temos uma abordagem próxima do pluralismo, com um perfil único de estudante na plataforma de eLearning onde são colocados diferentes formatos do mesmo conteúdo permitindo aos estudantes optar pela versão ou versões que considerem mais adequado para o seu perfil ou para a tecnologia pela qual estão a aceder ao conteúdo. O modelo pedagógico adotado para o e-elarning é fundamentalmente colaborativo, baseado em atividades que promovem interação e partilha entre os estudantes e onde a comunicação é fundamentalmente assíncrona.

3. Fatores basilares para um eLearning acessível

Considerando que o eLearning envolve plataformas, conteúdos, pedagogia e pessoas, a acessibilidade tem de ser abordada duma forma holística envolvendo todos os componentes intrínsecos ao eLearning.

Em termos pedagógicos, como já referimos, um dos grandes desafio que se coloca é a definição de um modelo de eLearning acessível que consiga conciliar a diversidade de ferramentas, de conteúdos e de atividades existente num ambiente virtual com a diversidade funcional das pessoas pertencentes à comunidade de aprendizagem.

Um outro desafio, relacionado com a tecnologia, é garantir que todas as funcionalidades das plataformas utilizadas sejam acessíveis a todos. Este processo é extremamente complexo uma vez que existem incompatibilidades tecnológicas entre plataformas, navegadores (browsers) e tecnologias de apoio. Além da incompatibilidade tecnológica questiona-se também a diversidade de funcionalidades que poderão ter interesse para uma matéria científica e adaptar significa alterar ou retirar algumas funcionalidades essenciais – por exemplo simuladores, ambientes 3D imersivos e realidade aumentada.

No que respeita aos conteúdos, verificámos que as WCAG, apesar de serem fundamentais não são de fácil compreensão nem intuitivas para quem produz conteúdos. No IPLeiria procuramos fornecer modelos de documentos, exploramos ferramentas de autor e ferramentas colaborativas que sejam acessíveis para quem produz e para quem “consome”, ou seja, que permitam a quem produz seguir uma estrutura pré-definida e que o produto final esteja em formato acessível para quem consulta. Um dos desafios é reunir um conjunto de ferramentas e respetivos modelos que garantam um produto final acessível e compatível com as diferentes tecnologias.

No entanto, quando falamos de conteúdos não nos podemos restringir aos recursos elaborados pelos professores. A interação entre os estudantes e a comunicação fundamentalmente assíncrona são características de um modelo colaborativo ou corporativo. Isto significa que a comunicação sendo expressa num fórum permite a utilização de texto, imagens estáticas e vídeos. O mesmo acontece nos trabalhos em grupo ou individuais, e-portfolios, que são partilhados com a turma, sejam documentos, blogs, wikis ou outros PLE. Ou seja, estamos perante conteúdos espontâneos que não são preparados previamente, pelo que é difícil garantir que sejam acessíveis. Por este motivo disponibilizamos aos professores e alunos dicas de como criar documentos acessíveis, como aplicar as WCAG, como descrever imagem ou criar textos para áudiodescrição de vídeos. No entanto, apesar de algumas questões técnicas, existe o fator cultural que para a maioria das pessoas se baseia na representação visual do mundo, pelo que não é um processo simples passar a informação visual para texto. E este é outro grande desafio que se coloca no eLearning acessível.

4. Práticas no IPLeiria

4.1 1ª Experiência no IPLeiria

Consentâneo com pressupostos anteriores, com a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (2000/C 364/01 – art. 21º e art. 26º) e a Constituição Portuguesa (arts.71º, 74º e 78º), o Instituto Politécnico de Leiria (IPLeiria), propõe-se implementar uma política de verdadeira inclusão através de uma proposta de modelo de eLearning acessível, suportado nas teorias socio-construtivistas e baseado na diversidade funcional dos indivíduos. Este modelo foi materializado num primeiro Curso de Empreendedorismo em Maio de 2007, que compreendeu duas turmas de participantes, entre os quais se vêm incluídas 2 pessoas cegas e 1 Surdo.

O facto de este ser o primeiro curso de que se tem conhecimento em Portugal a ser criado de raiz para o eLearning com preocupações de inclusão e critérios objetivos de acessibilidade, comportou o preço do pioneirismo. Tal significou não haver modelos a seguir, nem fórmulas a aplicar… o que resultaria no desenvolvimento de um processo investigativo intenso que passou pela identificação de necessidades, levantamento e avaliação de soluções possíveis com base em materiais e metodologias diversas ligadas a contextos de ensino/aprendizagem e ambientes virtuais, a avaliação de soluções viáveis, a aplicação de estratégias, a testagem dessas mesmas estratégias e um recomeçar constante, em cada fase.

Desta forma, para além das condições técnicas que se procurou reunir, centrou-se de forma especial na construção de conteúdos acessíveis, dando especial relevo ao design instrucional e gráfico, seguindo de perto alguns dos critérios básicos propostos por Clark (2002) e pelas WCAG 1.0. Procedeu-se à adequação da plataforma Blackboard 6.0, implementando um design gráfico simplificado e com elevado contraste, seleção de ferramentas que garantiam a navegação por teclado, desenho de um ambiente virtual apelativo e intuitivo, criação de conteúdos em diferentes formatos, ou seja, o mesmo conteúdo era apresentado em texto, em língua gestual e em áudio. O papel do designer instrucional foi fundamental na criação de conteúdos textuais. Procurou-se garantir a navegabilidade dos documentos, a utilização de uma linguagem clara e em tom coloquial, momentos de reflexão e destaques de informação vital. Os conteúdos em vídeo foram legendados e foi feita a versão com áudiodescrição. Alguns dos conteúdos foram disponibilizados em Língua gestual. Foi também criada a versão áudio dos conteúdos textuais.

Contudo, apesar dos esforços para que este curso fosse totalmente acessível, detetámos que a plataforma Blackboard, com o tema desenvolvido pela equipa, não apresentava uma navegação simples em particular nos fóruns, perdia-se o contexto quando se alternava entre conteúdos e atividades e os testes não eram acessíveis.

Após este primeiro curso, a oferta de ensina a distância estendeu-se aos cursos de licenciatura e de mestrados, onde é seguido o mesmo modelo de ensino a distância com a diferença relativamente à oferta de conteúdos multiformato, sendo a maioria conteúdos textuais.

Esta experiência tem sido fundamental para a investigação que temos vindo a desenvolver na Unidade de Ensino a Distância do IPLeiria, em conjunto com professores, com a unidade de investigação iACT e com parceiros nacionais assim como em projetos europeus, nomeadamente no EU4ALL e ADLAB.

4.2 Plataformas LMS

Sendo a plataforma LMS essencial para a gestão do processo de ensino-aprendizagem, procurámos desde o início uma plataforma que estivesse em conformidade com as normas de acessibilidade. Como já referimos, optou-se pelo Blackboard que estava em conformidade com a section 508, mas após a implementação do primeiro curso verificámos que a plataforma apresentava falhas ao nível da usabilidade e acessibilidade, nomeadamente na navegação e comunicação, conforme estudo realizado por Francisco (2008). Em 2010 mudámos para a plataforma Moodle 1.9 que mostrou maior eficácia ao nível da acessibilidade, apesar de não ser totalmente acessível. Em 2013 fizemos a atualização para a versão do Moodle 2.5, desenvolvemos um novo tema, desativámos algumas funcionalidades (badges, blogs, RSS) e integrámos a plataforma de web-conferência BigBlueButton. De acordo com Dougianas (2013) um dos aspetos melhorados nesta versão do Modle é a acessibilidade e a usabilidade. Segundo o cofundador do Moodle estas melhorias pretendem tornar mais eficiente a navegação nas páginas e as funcionalidades da aplicação. Por este motivo realizamos testes de acessibilidade aos recursos e atividades o Moodle 2.5. Participaram neste estudo vários utilizadores, entre os quais 3 utilizadores de leitor de ecrã e fizemos uma análise automática - obtida pelos validadores eXaminator e AccessMonitor. Os resultados destes testes mostraram que algumas funcionalidades não são totalmente acessíveis, nomeadamente o carregamento de ficheiros, existem também alguns problemas na estrutura de navegação e clarificação de termos e links. O objetivo destes testes foi o levantamento de barreiras, caso existissem, para que possamos implementar as alterações necessárias para tornar mais acessível a plataforma, uma vez que estamos a disponibilizar os primeiros MOOC, que pretendemos serem acessíveis.

4.3 Produção de conteúdos

Relativamente aos conteúdos, procurámos inicialmente produzir conteúdos multiformato – texto, imagem e áudio - sendo para tal necessário o trabalho de intérpretes de língua gestual, audiodescrição e áudiolegendas. Porém, criar conteúdos multiformado torna-se muito dispendioso uma vez que cada curso disponibiliza centenas de materiais que necessitariam de ser trabalhados para obter os vários formatos. Procurando encontrar resposta a este problema, temos vindo a explorar ferramentas web 2.0, com potencial educativo, que permitam criar conteúdos e serem utilizadas no âmbito de atividades colaborativas. Ao longo de 4 anos analisamos mais de 100 ferramentas que permitem: produzir de tutoriais e demonstrações, criar bandas desenhadas e livros, publicar documentos e livros (e-livros), produzir conteúdos SCORM, criar e disponibilizar questionários online, gravar, editar e publicar imagem, áudio e vídeo, editar e partilhar informação, comunicação síncrona, transmitir e difundir vídeo, selecionar e anotar informação de sites e documentos. Das ferramentas testadas, a maioria não é acessível por ser construída em flash ou porque utilizam tabelas na definição do CSS. Para a produção de conteúdos SCORM/ HTML, sugerimos aos professores a utilização do eXelearning, uma vez que esta permite exportar para HTML, desde que não sejam utilizadas algumas funcionalidades e sejam seguidas as recomendações para a criação de documentos digitais acessíveis. Sugerimos também a instalação da extensão Writter2ePub para o LibreOffice que permite criar e-books acessíveis, além do tradicional PDF. Para os professores que já têm os seus materiais desenvolvidos nas aplicações do MSOffice, sugerimos a revisão e adaptação desses conteúdos utilizando as funcionalidades do MSOffice ou OpenOffice, alertando para a descrição de imagens; para os vídeos sugerimos o alojamento no youtube acompanhados de uma descrição textual e se possível a colocação de legendas.

A maior dificuldade na oferta de conteúdos acessíveis reside no desconhecimento por parte dos professores das funcionalidades de acessibilidade e das WCAG. Por este motivo promovemos workshops onde os professores adaptam os seus materiais de acordo com a ferramenta que utilizam e com base nas diretrizes wcag. Apesar deste esforço continuamos sem conseguir dar resposta eficiente aos conteúdos relacionados com a matemática. Nestes casos e considerando que a maioria dos professores utiliza Latex, nós aconselhamos a conversão para ASCII Math através de conversores online gratuitos (e.g. http:www.sciweavers.orgfree-online-latex-equation-editor). Porém, para que os estudantes e professores consigam comunicar através de uma linguagem matemática, é necessário que ambos dominem o ASCII Math. Para isso é necessário tempo para esta aprendizagem e isso não está previsto nos planos curriculares dos cursos.

Outras áreas que apresentam um grande desafio são as expressões artísticas que vivem de uma forte componente visual, assim como as práticas laboratoriais de química e física. Procuramos também sensibilizar os professores para a adoção de estratégias pedagógicas que envolvam os estudantes nas aprendizagens, através de atividades colaborativas, baseadas na interação entre estudantes e não tanto nos conteúdos. Apesar de existirem dificuldades técnicas na criação de conteúdos acessíveis, onde encontramos maior dificuldade é no comportamento das pessoas relativamente à aplicação das recomendações de acessibilidade. Conciliar uma cultura que assenta num mundo visual com a acessibilidade é extremamente difícil e as diretrizes wcag não são de fácil compreensão para quem possui poucas competências tecnológicas. Por isso o nosso grande desafio é trabalhar as mentalidades e adaptar as wcag para uma linguagem e procedimentos fáceis de compreender e aplicar.

4.4 Formação e sensibilização da comunidade académica

Desde 2007 que oferecemos aos professores um curso online com o objetivo de dar a conhecer a plataforma de eLearning e a metodologia adequada para esta modalidade de ensino. Pretende-se também com este curso que os professores adquiram experiência como estudantes a distância, conheçam diferentes tipos de atividades, diferentes abordagens e estratégias que podem adotar nas suas disciplinas. Este curso é atualmente de 8 semanas onde são abordadas as questões pedagógicas e tecnológicas, sendo destinado essencialmente aos professorem que lecionam os cursos a distância. Além desta formação, oferecemos para toda a comunidade workshops sobre ferramentas educativas e como produzir documentos digitais acessíveis com base nas WCAG e nas funcionalidades de acessibilidade dos diferentes programas. Além desta formação promovida pela UED, a unidade de investigação iACT, promove formação sobre comportamentos inclusivos, comunicação online e produção de conteúdos acessíveis (trabalhos, blogs, wikis).

Também disponibilizamos manuais e dicas para produzir documentos acessíveis, descrever imagens e criar ambientes virtuais inclusivos. Além destas formações de caráter pedagógico, damos apoio à comunidade na criação de formulários online acessíveis e na criação de web sites acessíveis. Os sites do iACT, da UED e de alguns projetos como o PLIP ou da conferência INCLUDit são exemplos de sites acessíveis apresentando o nível máximo de conformidade com as WCAG 2.0.

Verificamos que ao longo destes 7 anos o interesse da comunidade académica pelo tema da acessibilidade tem vindo a crescer. No ano letivo 2012-2013 o IPLeiria assumiu a inclusão como o tema do ano, denominado IPL+inclusivo, tendo envolvido não só a comunidade académica mas também várias instituições nacionais.

Contudo constatamos que apesar do interesse que os temas” acessibilidade” e “inclusão” desperta nas pessoas, a mudança de práticas é bastante mais lenta. Continuamos sem conseguir garantir que a informação digital e os serviços disponíveis na web, em particular no eLearning, sejam acessíveis a todos os perfis de utilizadores.

5. Resultados

Estamos neste momento em processo de avaliação do ensino a distância no IPleiria. Apesar de não termos ainda resultados, mas baseado nos questionários de satisfação e do feedback informal dos estudantes, sentimos que o modelo pedagógico adotado permite aos estudantes adquirirem novas competências de trabalho em rede e as atividades colaborativas tornam as aprendizagens mais efetivas e reduzem o sentimento de distância e isolamento. Relativamente à plataforma, a maioria dos professores e estudantes prefere o Moodle, comparativamente com o Blackboard 6.0, por considerarem mais intuitivo e mais virado para a comunidade e trabalho colaborativo. Alguns estudantes acedem à plataforma através de tecnologias móveis e não se tem verificado muitas situações de incompatibilidade. No que toca aos conteúdos, sentimos que este é o grande desafio. A maioria dos estudantes alerta para o excesso de conteúdos textuais, sugerindo mais vídeos, aulas gravadas e simuladores. Por outro lado, estudantes com incapacidade visual consideram que os conteúdos textuais deveriam ser mais sucintos e abordar apenas os aspetos essenciais.

O feedback dos professores, relativamente ao modelo e à plataforma, é positivo. Em relação aos conteúdos, existe alguma dificuldade em adaptar os materiais utilizados no ensino presencial para vários formatos e que estes fiquem acessíveis. Apesar da unidade de ensino a distância dar apoio na edição de vídeo, produção de conteúdos multimédia, revisão de acessibilidade em documentos textuais e apresentações, os professores têm de elaborar os guiões e os conteúdos de base, descrever as imagens ou elaborar os textos para a áudiodescrição. Isto não é um processo simples uma vez que exige muito tempo, conhecimentos tecnológicos e compreensão das WCAG que não são fáceis de entender para quem não tem grande domínio técnico.

Como foi referido, os conteúdos não são apenas disponibilizados pelos professores mas por toda a comunidade virtual, através dos fóruns ou de outras ferramentas que veiculam os trabalhos dos estudantes. Nas turmas onde foi dada indicação para descreverem as fotos de perfil e outras imagens que utilizassem nos trabalhos assim como outras recomendações para produzirem documentos acessíveis, o feedback obtido dos estudantes cegos foi muito positivo e gostaram particularmente de ler as descrições das fotos de perfil.

Acreditamos que o processo de avaliação ao nosso eLearning será preponderante para a adequação de estratégias mais eficazes, para o sucesso dos alunos no regime a distância e para a acessibilidade no eLearning.

6. Desafios futuros

Alguma da investigação que estamos a desenvolver ao nível do eLearning acessível diz respeito às plataformas e aos conteúdos digitais, nomeadamente a descrição dos elementos visuais.

Questionamos se a descrição das imagens poderá ser parametrizada, tendo sido realizado um estudo com base numa matriz. Da análise dos dados obtidos por pessoas cegas e não cegas, pretendemos desenvolver um módulo de extenção (add-on) para o Moodle com os parâmetros essenciais para descrever imagens e que poderão ser de grande utilidade para todos os utilizadores que insiram imagens na plataforma. Pretendemos ainda criar um banco de imagens com as respetivas descrições para que possam ser utilizadas nos diversos conteúdos.

Em conjunto com parceiros europeus estamos a analisar a problemática da áudiodescrição e procurar definir um conjunto de recomendações e boas práticas que sejam adequadas aos vídeos, arte e e-books.

O Cloud Computing pode também trazer novas contribuições para o problema das plataformas, nomeadamente a interoperabilidade entre sistemas e a facilidade de acesso a serviços e conteúdo através de dispositivos móveis em sistemas ubíquos.

Consideramos que é fundamental encontrar um conjunto de recomendações específicas para o eLearning acessível, que envolva novas plataformas e arquiteturas, o design instrucional e os conteúdos, modelos e estratégias pedagógicas, comunicação e interação, para que o ensino superior em Portugal possa ter uma oferta formativa efetivamente acessível a todos.

Referências

Berner, A. R. (2012, dezembro). The Case for Educational Pluralism. (I. o. Life, Ed.) First Things, 228. Acedido a 2014-06-06. Disponível em http://www.firstthings.com/article/2012/11/the-case-for-educational-pluralism

Carta dos direitos fundamentais da EU de dezembro de 2000 pelo Conselho da Europa. Acedido a 2014-06-06. Disponível em http://www.europarl.europa.eu/

Clark, J. (2002). Building Accessible Website. New Riders.

Costa, R., Francisco, M., Jorge, N., & Rodrigues, C. (2012, dezembro). Ensino a distância no Instituto Politécnico de Leiria: Definição de um Modelo e seus pilares. , 2013. ISSN: 1647-032X. (S. Gonçalves, D. Soeiro, & S. Silva, Eds.) Cadernos de Pedagogia no Ensino Superior, pp. 23-37.

DGES/DSAES. (2012). Concurso nacional de acesso e ingresso no ensino superior público - Contingente especial para portadores de deficiência física ou sensorial: 2007-2011. (M. d. Ciência, Ed.) Retrieved 11 05, 2013, from Direção-Geral do Ensino Superior: http://www.dges.mctes.pt/NR/rdonlyres/65940C16-E227-4AA2-9DF1-F1478932A8EF/6064/ContDefic_0711.pdf

Dougianas, M. (2013, 05 15). Moodle 2.5 is now released! Retrieved from Moodle: https://moodle.org/mod/forum/discuss.php?d=228539

Francisco, M. (2008). Contributos para uma Educação Online Inclusiva: Estudo aplicado a casos de Cegueira e Baixa Visão. Master's thesis presented to the Universidade Aberta. Lisboa. Retrieved from http://hdl.handle.net/10400.2/1273

Giselbrecht, M. (2009). Pluralistic approaches – A long overdue paradigm shift in education. Scottish Languages Review, 20, pp. 11-20. Retrieved 11 2013, 6, from http://www.scilt.org.uk/Portals/24/Library/slr/issues/20/Giselbrecht_pp11-20.pdf

Lee, S., Kumar, V., & Barker, T. (2010). Design of an adaptive learner directed model for e-learning. In C. Steel, M. Keppell, P. Gerbic, & S. Housego (Ed.), Curriculum, technology & transformation for an unknown future. Proceedings ascilite Sydney 2010, (pp. 539-541).

Lei Constitucional n.º 1/2005 de 12 de agosto da Assembleia da República. Diário da República: I série, Nº155 (2005)

Lei n.º 36/2011 de 21 de junho da Assembleia da República. Diário da República: I série, No 118 (2011). Acedido a 2014-06-06. Disponível em https://m6.ama.pt/docs/Lei362011-NormasAbertas.pdf

Musumba, G. W., Oboko, R. O., & Nyongesa, H. O. (2013, 06 06). Agent Based Adaptive E-Learning Model for Any Learning Management System. Int J Machine Learn Appl. 2013;2(1),Art. #6, 9 pages. http://dx.doi.org/10.4102/ ijmla.v2i1.6. International Journal of Machine Learning and Application, 2, 1-9.

Resolução do Conselho de Ministros N.º 91/2012 de 8 de novembro da Presidência do Conselho de Ministros. Diário da República, I série, N.º 216 (2012). Acedido a 2014-06-06. Disponível em http://dre.pt

Resolução do Conselho de Ministros N.º 155/2007 de 8 de novembro da Presidência do Conselho de Ministros. Diário da República, I série, N.º 100 (2007). Acedido a 2014-06-06. Disponível em http://dre.pt

Web Content Accessibility Guidelines 2.0. de 11 de dezembro do W3C. World Wide Web Consortium (2008). Acedido a 2014-06-02. Disponível em http://www.w3.org/TR/2008/REC-WCAG20-20081211/

Ir para o índice

ARTIGO 4 - VALIDAÇÃO DA ACESSIBILIDADE NA PLATAFORMA DE ELEARNING: CASO IPLEIRIA

Manuela Francisco(1), Cláudio Esperança(1), Norberto Sousa(1), Daniel Vieira(2) e Nelson Nunes(2)

(1)Membros do iACT/ (2) Estudantes IPLeiria

Apoio: Unidade de Ensino a Distância, Escola Superior de Tecnologia e Gestão, Centro de Recursos para a Inclusão digital

Citar este artigo: Francisco, M., Esperança, C., Sousa, N., Vieira, D. & Nunes, N. (2015). Validação da acessibilidade na plataforma de eLearning: caso IPLeiria. In C. Mangas, C. Freire & M. Francisco (Orgs.), Inclusão e Acessibilidade em Ação - Diferentes percursos, um rumo. Leiria: iACT/IPLeiria, Artigo 4. [Online, disponível em http://iact.ipleiria.pt/]

Resumo

Um dos aspetos focados por Martin Dougianas (2013), relativamente às melhorias do Moodle 2.5, diz respeito à acessibilidade e usabilidade. Segundo o cofundador do Moodle estas melhorias pretendem tornar mais eficiente a navegação nas páginas e as funcionalidades da aplicação. Considerando que um dos fatores fundamentais da acessibilidade é responder às necessidades dos diferentes perfis de utilizadores, procurámos, no IPLeiria, validar estas melhorias com utilizadores que apresentam necessidades específicas: navegação por teclado, navegação pela iris, navegação pelo movimento da cabeça e utilização de leitor de ecrã. Após a instalação, configuração e personalização da plataforma Moodle no servidor do IPLeiria, a Unidade de Ensino a Distância (UED) realizou testes de validação e pertinência das novas funcionalidades. Desenhou-se a unidade curricular (UC) Testes de Acessibilidade, onde foram disponibilizadas ferramentas de comunicação, diferentes tipos de recursos e diferentes tipos de atividades. Elaborou-se um guião com várias tarefas a realizar em diferentes páginas e foi disponibilizada uma lista de verificação das WCAG 2.0, elaborada a partir da Check list disponibilizada pelo W3C (2006) e adaptada aos testes da plataforma de eLearning (Moodle). Os testes foram realizados, autonomamente, por 2 estudantes do 2º ano do curso de Engenharia de Informática da ESTG - Escola Superior de Tecnologia e Gestão, um membro do núcleo de investigação iACT – inclusão e acessibilidade em ação, do IPLeiria, que utilizaram diferentes leitores de ecrã. Além destes testes foram ainda realizados testes com recurso ao apontador de cabeça SmartNAV (navegação através do movimento da cabeça) por um técnico da Unidade de Ensino a Distância. A usabilidade da plataforma foi também testada com dispositivos móveis sem apesentar problemas de navegação e de conteúdos. Os resultados obtidos permitiram detetar diversas barreiras à acessibilidade, pelo que propomos um conjunto de sugestões para os docentes, que visam ultrapassar algumas destas barreiras.

Palavras-chave: eLearning, Moodle 2.5, acessibilidade, leitor de ecrã, SmartNAV, validação manual e automática.

Abstract

Martin Dougianas (2013) stresses that accessibility and usability is some of the improvements in the Moodle 2.5 version. According to the Moodle co-founder, these improvements intended to make navigation on the pages and the features of the application more efficient. Whereas one of the fundamental factors of accessibility is to respond to the needs of different user profiles, we have sought, in IPLeiria, validate these improvements with users who have specific needs: keyboard navigation, navigation by iris, navigation by head movement and use of screen reader. After the installation, configuration and customization of Moodle platform on the IPLeiria server, the Distance Learning Unit (UED) conducted some validation accessibility tests and pertinence of new features. We designed the Accessibility Testing Course, where we made available some communication tools, different types of resources and different types of activities. We have drawn up a script with multiple tasks to perform on different pages and was provided a WCAG 2.0 checklist, based on the Check list provided by W3C (2006) and adapted to our eLearning platform (Moodle) tests. The tests were conducted independently by 2 blind students (from the 2nd year of Computer Engineering graduate course of the ESTG School), a member (blind person) of the iACT IPLeiria research center, which used different screen readers. In addition to these tests were also carried out tests using the head pointer SmartNAV (navigation through the head movement) by a technician from the UED and also member of the iACT Research Centre. The results obtained made it possible to detect some accessibility problems, for which we propose a set of suggestions for teachers, which aim to overcome some of these barriers, in particular for blind people. Some usability aspects were also tested with mobile devices, not having been verified relevant problems of navigation and presentation of the contents.

Keywords: eLearning, Moodle 2.5, accessibility, screen reader, SmartNAV, expert and automatic validation.

1. Introdução

O Instituto Politécnico de Leiria tem vindo a afirmar a sua preocupação com as questões da acessibilidade e inclusão de pessoas com diferentes perfis e necessidades, não só na comunidade académica mas também na vida social. Dispõe do Centro de Recursos para a Inclusão digital (CRID) disponível ao público com necessidades especiais. Criou o Serviço de Apoio ao Estudante (SAPE) que pretende contribuir para a promoção do sucesso escolar e combate ao abandono no IPLeiria. Desenvolve investigação na área da inclusão tendo sido criado um núcleo de investigação para este efeito – Inclusão e Acessibilidade em Ação (iACT). Mas as preocupações com a acessibilidade não se refletem apenas a nível orgânico. Um dos pilares do modelo de ensino a distância é a acessibilidade, onde se procura adaptar materiais e ferramentas para que sejam acessíveis ao maior número de pessoas. E para que estas preocupações não se vejam restritas aos departamentos ou modelos teóricos, é fundamental que toda a comunidade académica seja envolvida. Sensibilizar e mudar atitudes tem sido uma aposta ativa do IPLeiria. E é neste sentido que o ano letivo de 2012-2013 foi assumido pela instituição como o ano temático da inclusão através do projeto IPL+Inclusivo.

Em consonância com a postura adotada pelo IPLeiria, a legislação tem vindo a reforçar medidas que visam mais acessibilidade e inclusão nos diversos domínios, nomeadamente na web. De acordo com a Lei nº 36/2011 (2011) e a RCM nº 91/2012 (2012), a Administração Pública está obrigada a cumprir o nível "A" das WCAG para a informação disponibilizada na internet e o nível "AA" para os serviços disponibilizados na internet, pelo que deverá ser garantida a acessibilidade nos serviços disponibilizados na web pelo IPLeiria.

Conscientes que o termo “inclusão” é muito vasto e os conceitos “acessibilidade” e “usabilidade” não são estanques, os mesmos devem ser clarificados no contexto deste trabalho (web e educação no ensino superior). Embora existam muitas definições, consideramos que, neste contexto, se aplica o conceito de acessibilidade proposto pelo consórcio W3C (2005)] “Web accessibility means that people with disabilities can use the Web. More specifically, Web accessibility means that people with disabilities can perceive, understand, navigate, and interact with the Web, and that they can contribute to the Web.” Para o conceito de usabilidade consideramos a definição de Jackob Nielson (2012): “Usability is a quality attribute that assesses how easy user interfaces are to use. The word "usability" also refers to methods for improving ease-of-use during the design process”.

Face a estes pressupostos, a Unidade de Ensino a Distância, ao atualizar a sua plataforma de eLearning, considerou fundamental analisar a acessibilidade, não só do novo interface mas também das novas funcionalidades do Moodle 2.5. Para avaliar o nível de acessibilidade da plataforma de eLearning, em particular dos recursos e atividades é necessário recorrer a uma validação manual visto que os validadores automáticos não são garantia de uma efetiva acessibilidade, conforme referido por Sousa & Francisco (2014): “Apesar dos validadores reconhecerem se uma imagem contém descrição, este não consegue interpretar se é a descrição adequada ou se se trata apenas de um conjunto de algarismos. Embora os validadores identifiquem se a estrutura hierárquica dos cabeçalhos está correta, não consegue identificar se os cabeçalhos estão definidos no sítio e com o nível hierárquico certo ou se existem títulos que não estão definidos como cabeçalho.” Estando conscientes que cada utilizador tem necessidades específicas e que, em pouco tempo, não é possível validar todos os perfis, optou-se por fazer testes de acessibilidade à plataforma, com utilizadores que navegam por teclado, utilizam leitor de ecrã ou ampliador de ecrã ou navegam com recurso ao movimento da cabeça ou da iris. Estas especificidades abrangem vários perfis de utilizadores, nomeadamente os que apresentam dificuldades motoras e incapacidade visual.

Considerando que a usabilidade (eficiência) será testada ao longo do primeiro semestre, por docentes e estudantes, optou-se por validar antes do início do ano letivo, a acessibilidade da plataforma no perfil de estudante. O resultado destes testes permite uma correção atempada de erros que poderão melhorar a acessibilidade e a usabilidade da plataforma.

Neste relatório apresentam-se os procedimentos utilizados, as tarefas propostas, as ocorrências registadas pelos utilizadores, as respostas obtidas na lista de verificação e os resultados da validação automática. Com base na análise dos dados obtidos é feita uma síntese da acessibilidade das funcionalidades testadas e é proposto um conjunto de sugestões para os docentes.

2. Procedimentos para a validação manual

Para a validação manual foi desenhado um guião de atividades – Guião de testes - com indicações para os utilizadores relativamente às tarefas e procedimentos a realizar. Foram definidas tarefas para as páginas: Entrada, Minha página principal, UC Testes de acessibilidade. Este documento poi enviado por e-mail no final do mês de julho, tendo os estudantes realizado as tarefas no mês de agosto.

Para a realização dos testes foi solicitado a colaboração de alguns estudantes e colaboradores do IPL que utilizam tecnologias/produtos de apoio. Apenas 2 estudantes mostraram disponibilidade para realizar os testes antes do início do ano letivo. Assim, esta validação foi realizada em agosto por 2 utilizadores de leitor de ecrã que navegam por teclado. Contudo, como algumas situações apontadas não permitiram compreender os erros efetivos, solicitou-se a colaboração de mais um utilizador, investigador do iACT, também utilizador de tecnologias de apoio, nomeadamente leitor de ecrã, que realizou em outubro, além das tarefas propostas inicialmente, outras tarefas que não foram apresentadas no guião inicial. Após estes testes foi utilizado o equipamento disponível no CRID - Centro de Recursos para a Inclusão Digital, do IPLeiria, por um técnico da UED, que seguiu as tarefas propostas no guião com recurso ao apontador de cabeça SmartNav. Como complemento à validação manual foi feita a análise automática, obtida pelos validadores eXaminator e AccessMonitor.

2.1 Testes com leitor de ecrã

Foi solicitado aos utilizadores que realizassem um conjunto de tarefas e fossem registando num ficheiro de texto os seus comentários, falhas, melhorias e outras ocorrências que pudessem melhorar a eficiência da plataforma e dos conteúdos. Os utilizadores realizaram os testes autonomamente, a distância e com os seus equipamentos e produtos de apoio:

  • O utilizador 1 (U1) utilizou o navegador Safari 6.0.5 e o Leitor de ecrã: VoiceOver 6.0;
  • O utilizador 2 (U2) utilizou o navegador Internet Explorer 10 e o Leitor de ecrã Jaws 13.0;
  • O utilizador 3 (U3) utilizou o navegador Internet Explorer 10 e os leitores de ecrã NVDA e Jaws versões 10, 14 e 15.

As tarefas propostas no guião baseiam-se no acesso a diferentes tipos de recursos e na realização de algumas atividades – foram apenas consideradas as atividades do Moodle mais utilizadas pelos docentes, em particular no ensino a distância.

Tarefas

  • 1. A primeira tarefa consiste no acesso à plataforma e autenticação, com o novo layout.
  • 2. Após a autenticação entra-se na Minha página principal onde foi solicitado a edição do perfil para preenchimento do campo “descrição” e carregamento de uma fotografia.
  • 3. Por último foi solicitado um conjunto de tarefas a realizar na UC Testes de acessibilidade. Esta UC está estruturada por área de navegação e área de conteúdo. À esquerda encontram-se os blocos de navegação: Menu, Configurações e Participantes. A área de conteúdo está estruturada por tópicos: bloco principal e 3 tópicos. No bloco principal foi disponibilizado o guião. Neste bloco foi também disponibilizada a lista de verificação em 2 versões para que os estudantes optassem pela versão mais acessível. No tópico 1 encontram-se as ferramentas de comunicação, no tópico 2 estão os tipos de recursos mais utilizados pelos docentes e no tópico 3 estão tipos de atividades mais comuns.

O utilizador U3 realizou um conjunto de tarefas que foram propostas posteriormente na UC Testes de Acessibilidade: escolha de grupo, entrega de trabalho com orientações de submissão de ficheiro, Teste com 4 tipos diferentes de questões e consulta da pauta de notas.

2.2 Testes com o SmartNav

A navegação com o apontador de cabeça SmartNav funciona por meio de um refletor que comunica com um emissor de infravermelhos colocado no ecrã. Os movimentos da cabeça permitem a escrita através de teclado virtual e as operações realizadas pelo rato: clique, duplo clique e arrastar. O refletor foi colocado nos óculos, acima do nariz.

De acordo com o guião, foi realizado a tarefa de autenticação na Página de entrada, edição do perfil na Minha página principal e o acesso aos recursos e atividades disponíveis na UC Testes de acessibilidade. Por não se terem verificado dificuldades que mereçam destaque, não foi preenchida a lista de verificação.

3. Resultados

3.1 Resultado dos testes realizados por U1 e U2

Com base nas ocorrências registadas num ficheiro DOC pelos utilizadores, ambos não conseguiram carregar ficheiros nas diferentes tarefas onde tal procedimento era solicitado. A causa desta dificuldade está relacionada com os passos necessários para carregar um ficheiro e a forma como eles surgem ao utilizador:

  • Passo 1 - Na janela de ficheiros, clicar no link “Adicionar ficheiro” que abre uma nova janela;
  • Passo 2 – Clicar no botão “Procurar”;
  • Passo 3 – Clicar no botão “Enviar este ficheiro”.

Para quem tem acesso visual a estas janelas, o procedimento é relativamente simples e intuitivo. Além disso, é possível ficar pelo passo 1 e arrastar os ficheiros para a janela de ficheiros e gravar as alterações. Contudo, quem não tem acesso visual não consegue percecionar, que após o Passo 1 surge uma janela com o botão “procurar” e que corresponde ao Passo 2. Assim, a sequência lógica de navegação com o leitor de ecrã é selecionar nesta janela o link “Enviar ficheiro” que efetivamente não encaminha o utilizador para mais nenhuma opção.

Também se verificou que ambos os utilizadores tiveram dificuldade na tarefa da UC “Aceda ao item Ficheiro incorporado e regresse ao tópico”. De acordo com os registos dos utilizadores, o U1 refere que “Não consigo voltar para o tópico "Tipos de recursos", não encontro link para tal”, situação apontada também pelo U2 “Ao abrir no navegador não consegui depois voltar atrás para continuar a navegação na plataforma”.

Verifica-se também que o U1 utilizando Safari 6.0.5+VoiceOver 6.0 encontrou mais dificuldades relativamente ao U2 utilizador de IE 10+Jaws 13, nas seguintes tarefas:”

  • Aceda ao item Ficheiro para descarregar e regresse ao tópico, tendo o U1 indicado “Não encontro forma de abrir o ficheiro para descarregar na plataforma. Ao clicar nesse link, o meu programa de leitura de pdf do Mac OSX é aberto automaticamente”;
  • No tópico tipos de atividades aceda ao item Diário de estudante e escreva o dia e hora em que acedeu. Regresse ao tópico tipos de atividades, sendo relatado pelo U1 “Sou incapaz de efectuar a tarefa. Entro na wiki diário do estudante, mas não consigo alterar o conteúdo da caixa de texto. Fica sempre escrito "Reflexões".”
  • No tópico tipos de atividades aceda ao item Base dados inclusão e adicione um novo registo (não se preocupe com o que escreve, a ideia é testar a acessibilidade da ferramenta). Regresse ao tópico tipos de atividades. Nesta tarefa o U1 apesar de a ter realizado refere que “contudo, as caixas de texto de palavras chave, link, etc, apesar de terem presentes labels indicativas, quando navego pelas caixas de texto com a tecla tab, a label não me é anunciada.”.
3.2 Resultado dos testes realizados por U3

Nas tarefas constantes do guião inicial o utilizador U3 apontou as mesmas situações que os utilizadores U1 e U2. Contudo, refez-se a tarefa de submissão de ficheiro tendo sido fornecidas orientações específicas relativamente aos passos necessários para realizar essa tarefa: 1 - selecionar o item Entrega de trabalho; 2- botão enviar trabalho; 3 - adicionar ficheiro; 4 - botão escolher ficheiro (selecione um qualquer no seu computador; 5 - botão enviar este ficheiro. Com estas indicações o utilizador conseguiu submeter o ficheiro em ambos os navegadores (IE e Firefox) tendo no entanto identificado algumas diferenças no comportamento dos leitores de ecrã: “Insucesso. Na primeira tentativa com qualquer versão dos leitores de ecrã: Jaws e NVDA.Com o Jaws 15 consegui chegar ao formulário de envio de ficheiro após ter pressionado os Links Adicionar ficheiro e enviar ficheiro. Depois de pressionar o botão: Browse finalmente apareceu a caixa de diálogo do Windows para escolher o ficheiro. Apesar de não ser intuitivo e fácil fazer aparecer o formulário de procura do ficheiro, é "acessável" o processo de enviar um segundo ficheiro utilizando NVDA ou diferentes versões do Jaws.”. No entanto este utilizador conclui que o carregamento de ficheiros é uma operação complexa para os utilizadores de leitor de ecrã.

Identificou-se ainda que algumas funcionalidades da própria plataforma tornam-se ruído para o utilizador em vez de ser uma “mais-valia”, uma vez que torna a informação redundante, como é o caso das imagens dos itens dos vários tópicos que podem ser consideradas imagens decorativas, e.g. ítem trabalho: Alt ”Trabalho” + texto do Link; Entregar trabalho; ou os Links para ocultar/expandir os blocos, funcionalidades que poderiam ser incluídas no próprio cabeçalho do bloco.

Foi ainda solicitado ao U3 2 tarefas que não constaram do guião inicial: realizar um teste com 4 tipos diferentes de questões e aceder à pauta de notas para consultar as suas avaliações. Relativamente ao teste, os 4 tipos de questões apresentadas foram: 1- escolha múltipla, 2- texto curto, 3- verdadeiro/falso, 4- texto longo. Não houve qualquer problema com as 3 primeiras questões, porém quando o utilizador passa para a 4ª questão o leitor de ecrã não lê a pergunta e passa diretamente para a caixa de edição (resposta à questão). Outro problema apontado refere-se à existência de um cabeçalho oculto com a informação: “texto da pergunta” em vez de conter a própria pergunta.

No que diz respeito à pauta de notas, apesar de ter sido configurado para aparecerem só as colunas - Itens de avaliação, Pesos, Notas, Feedback - a tabela que é mostrada ao estudante é complexa (tem dentro da tabela principal outras tabelas) dificultando a navegação. Foi apontado pelo utilizador U3 que existe uma coluna com células em branco para efeitos de Layout mas que é lida pelo leitor de ecrã.

3.3 Resultados obtidos na Lista de verificação

Após a realização das tarefas propostas para cada página, os utilizadores preencheram a lista de verificação das WCAG 2.0 disponibilizada nas versões do Moodle e do Lime Survey. Ambos optaram pela versão do Moodle (realizada com a ferramenta questionário). Esta lista de verificação apresentava as diretrizes constantes em cada princípio, devidamente adaptadas (da versão original disponível no site do W3C) aos testes realizados no Moodle e ao perfil de utilizadores que iriam participar na validação. Para avaliar o cumprimento de cada diretriz, foi considerada a escala de 1 a 4 considerando: 1 - sim, 2 - não, 3 - parcial, 4 - não se aplica. Fazendo uma análise dos resultados obtidos, verifica-se que existem alguns problemas na estrutura de navegação e clarificação de termos/ links:

  • Links com o mesmo texto que direcionam para locais diferentes estão contextualizados
  • Estão disponíveis várias formas para encontrar as páginas no site (lista de páginas, mapa do site, etc.)
  • Os cabeçalhos, títulos ou etiquetas não estão repetidos, ou no caso de existir repetição, estes estão devidamente agrupados e contextualizados.
  • O conteúdo com idioma diferente do da página está identificado.
  • As palavras ambíguas e abreviaturas têm texto explicativo.
  • Quando um elemento da página recebe o foco, não existe uma mudança gráfica substancial da estrutura da página que confunda ou desoriente o utilizador.
  • Links de navegação repetidos em diferentes páginas mantêm a mesma ordem de navegação.
3.4 Resultados com o SmartNav

Conforme já foi referido, não se verificaram grandes dificuldades na realização das tarefas propostas para cada página. Os campos de autenticação na Página de entrada apresentam uma dimensão que facilita a seleção e escrita, as tarefas propostas para a Minha página principal também não ofereceram dificuldades de execução, assim como a maioria dos recursos e atividades apresentados na UC Testes de acessibilidade, tendo sido realizadas todas as tarefas propostas.

Contudo, nos blocos laterais da Minha página principal e na UC Testes de acessibilidade, como os links estão muito próximos, torna-se difícil selecionar o que se pretende, sendo necessário alguma destreza e controle do movimento da cabeça para selecionar o link ou opção que se pretende. Também na Atividade Teste, as questões de escolha múltipla e de verdadeiro/falso, por apresentarem as opções na vertical muito próximas, isto é, pouco espaçamento entre linhas, dificultam a seleção da opção pretendida.

Assim, para este sistema de navegação é fundamental uma estrutura de navegação com poucos cliques, espaçamento entre links e tamanho de texto, icones e botões de navegação grandes.

3.5. Resultados da validação automática

Como complemento da validação manual, o URL das “Página de entrada”, Minha página principal” e “UC Testes de acessibilidade” foram submetidas a uma validação automática.

3.5.1 eXaminator (WCAG 1.0)

Com este validador obtiveram-se os seguintes resultados por página:

  • Página de entrada - A validação desta página com o eXaminator obteve uma pontuação de 8,5 em 10, tendo sido identificados três problemas: a) Inexistência de conteúdo alternativo para scripts presentes no corpo da página; b) Utilização de medidas absolutas; c) Carateres por omissão em controlos.
  • Minha página principal - A página principal de cada utilizador é personalizável pelo mesmo podendo ser escolhidos os blocos e funcionalidades presentes nesta página. A validação do código-fonte gerado obteve um índice de 7,8 em 10 com a identificação de 4 problemas: a) Inexistência de conteúdo alternativo para scripts presentes no corpo da página; b) Utilização de cabeçalhos mas a sua estrutura não é válida (não existe nenhum cabeçalho de nível 1); c) Existência de hiperligações com o mesmo texto mas que apontam para destinos diferentes; d) Utilização de medidas absolutas.
  • UC Testes de acessibilidade - A página inicial da unidade curricular de “Testes de acessibilidade” utilizada pelos utilizadores na avaliação da acessibilidade e usabilidade da plataforma obteve um índice de 6,9 em 10. No global foram identificados 6 problemas, numa das páginas mais complexas apresentadas aos utilizadores: a) Inexistência de conteúdo alternativo para scripts presentes no corpo da página; b) Utilização de manipuladores de eventos direcionados a um tipo de dispositivos; c) Problemas na estrutura de cabeçalhos na página; d) Existência de hiperligações com o mesmo texto mas que apontam para destinos diferentes; e) Utilização de medidas absolutas; f) Links adjacentes a outros links sem separação através de carateres imprimíveis.
3.5.2 AccessMonitor (WCAG 2.0)

Utilizando este validador, os resultados foram os seguintes:

  • Página de entrada - A validação da “página de entrada” obteve um índice de 10 em 10, com a emissão de alguns avisos para execução de verificações manuais.
  • Minha página principal - Obteve um índice de 7,1 em 10 apontando 2 erros do nível A ( falta de cabeçalhos 3 links compostos apenas por imagem não legendada) e 1 do nível AAA (links com o mesmo texto que apontam para destinos diferentes).
  • UC Testes de acessibilidade - Obteve um índice de 8,5 em 10, sendo apresentados 1 erro do nível AA (Utilização de unidades absolutas) e dois erros do nível AAA (Problema na estrutura de cabeçalhos da página e Links com o mesmo texto que apontam destinos diferentes).

4. Sugestões para os docentes

Procurando sistematizar o que foi analisado, apresentamos nas tabelas seguintes os itens avaliados, se são ou não acessíveis para os leitores de ecrã e para a navegação por teclado e com o SmartNav, assim como algumas sugestões para os docentes.

Tabela 1: Sugestões para melhorar a navegação

Navegação

Acessibilidade (Sim/Não/Parcial)

Sugestões

Blocos laterais

sim

Deverá apresentar apenas os blocos indispensáveis: Menu, Configurações. Poderá acrescentar o bloco Últimas notícias. Para as UCs em regime EaD deverá acrescentar o bloco Participantes.

Área de conteúdo

sim

Deve estar estruturada por tópicos e deverá dar nomes concretos aos tópicos (e.g. Bloco Principal, Módulo 1, Módulo 2 ou Recursos, Atividades). Evite colocar muito texto no sumário de cada tópico. Poderá utilizar imagens que não excedam a largura de 200px, mas caso utilize coloque uma descrição no respetivo campo, procurando descrever o essencial da imagem.

Pauta (de notas)

parcial

Na configuração da pauta deve ocultar as colunas que não apresentam informação vital para o estudante. Sugerimos de mostre apenas: Pesos (caso tenha definido), Notas, Feedback (caso utilize o campo de comentários nos itens de avaliação).

Tabela 2: Sugestões para utilização de recursos

Tipo de recurso

Acessibilidade (Sim/Não/Parcial)

Sugestões

Ficheiro - incorporado

parcial

A opção de incorporar (no item Aparência) coloca o ficheiro na área de conteúdo, o que pode criar confusão a quem navega com leitor de ecrã, como tal, deve ser evitado. É totalmente desaconselhado as opções: Automático ou Mesma janela uma vez que abre o ficheiro na janela da UC perdendo-se toda a referência e navegação na UC. É igualmente desaconselhado a opção de janela pop-up.

Ficheiro - descarregar

sim

Ésta opção (no item aparência) é a ideal para disponibilizar ficheiros.

Pasta

sim

Deve ser utilizada quando o docente pretende disponibilizar mais de um ficheiro. Os ficheiros são descarregados para o pc.

Livro

sim

Pode ser utilizado para fornecer indicações de atividades, colocar um conjunto de hiperligações, incorporar vídeos (devem ser do youtube), colocar texto, etc. Cria um índice que facilita a navegação e a leitura da informação. Deve evitar colocar tabelas copiadas de outros programas (Word, Excel)

Página web

sim

Se não colocar muita informação na mesma página funciona como um recurso para indicações de atividades, etc. Permite colocar texto, imagem, hiperligações externas, incorporar vídeos (devem ser do youtube), mas não deve ser muito extensa pois não tem índice de navegação. Para separar temas utilize  sempre cabeçalhos.

URL

sim

Coloque um texto que facilmente identifique o site que irá abrir.

Separador

sim

Pode ser utilizado para separar diferentes recursos ou atividades (e.g. Leitura obrigatória, leitura complementar…). Não coloque muito texto no separador.

Tabela 3: Sugestões para as Atividades

Tipo de atividade

Acessibilidade (Sim/Não/Parcial)

Sugestões

Fórum

sim

Evite linhas de discussão longas e muitos tópicos por fórum. É preferível separar temas por fóruns, criando mais de um fórum, caso esta situação se verifique ou seja previsível.

Chat

sim

Não existem sugestões específicas de acessibilidade.

Trabalho

parcial

Deverá permitir o envio de mais de 1 ficheiro, mesmo que só avalie o primeiro enviado. Como o carregamento de ficheiros não é muito acessível, os estudantes que não têm acesso visual poderão submeter algo sem se aperceberem e necessitar de confirmar através de reenvio de ficheiro.

Nas “Configurações da submissão de trabalho” deixe a opção NÃO em “Ativar botão “Submeter o trabalho” e em “Os alunos têm de aceitar a declaração de submissão”.

Teste

parcial

Testámos os tipos de questões que seriam mais acessíveis e verificámos que o texto longo apresenta dificuldade na leitura da pergunta. Os tipos de questões mais acessíveis são: escolha múltipla (com 1 resposta certa), verdadeiro/falso e texto curto.

Inquérito

sim

Procure utilizar o tipo de questões: Escolha múltipla, Resposta de texto curto ou Resposta numérica – para escala de likert 

Escolha de grupo

sim

Se pretende que os estudantes se organizem em grupos, crie previamente os grupos e apresente-os na escolha de grupos (Group choice). Desta forma os estudantes ao escolherem o grupo ficam automaticamente inscritos nesse grupo.

Glossário

sim

Não existem sugestões específicas de acessibilidade.

Wiki

Parcial

Nas configurações, em Formato, opte pelo Formato predefinido HTML. Contudo esta ferramenta não é totalmente acessível a alguns leitores de ecrã

Base de dados

sim

Dada a complexidade desta ferramenta que inclui campos com diferentes funcionalidades, deve ser ponderado pelo docente o tipo de conteúdo a colocar – alertar os estudantes para a descrição de imagens se forem usadas, texto a identificar URL caso sejam colocados. Deve procurar simplificar usando campos de texto.

5. Conclusões

Os testes, realizados apenas com 3 utilizadores, não são suficientes para emitir um parecer efetivo relativo à acessibilidade do Moodle 2.5. Contudo devemos considerar os problemas apontados como uma barreira à acessibilidade e encontrar soluções para que os utilizadores de tecnologias de apoio, consigam concluir com sucesso, de forma autónoma e eficiente, todos os procedimentos, nomeadamente o envio de ficheiros.

Verificou-se também que a utilização do leitor de ecrã Jaws 15 tornou a navegação e a realização de atividades mais eficiente, pelo que podemos por a hipótese de haver alguma incompatibilidade tecnológica e necessidade de atualização dos navegadores e dos leitores de ecrã face à nova versão do Moodle.

As validações automáticas permitiram detetar alguns problemas não identificados nos testes com os utilizadores cuja sua resolução poderá melhorar a acessibilidade geral da plataforma. No entanto, dada a complexidade do sistema, composto por milhares de ficheiros e centenas de módulos, a resolução de todas as situações identificadas podem implicar alterações internas na plataforma, comprometendo atualizações futuras. Para cada problema será analisada a relação custo-benefício no sentido de garantir a introdução de melhorias positivas e incrementais que não comprometam o funcionamento geral da plataforma.

Procurando tornar a acessibilidade do Moodle mais abrangente, remetemos os problemas identificados para a comunidade Moodle para que possam ser implementadas melhorias no core de base.

Referências

Assembleia da República. (21 de junho de 2011). Lei n.º 36/2011. Diário da Répública, 1.ª série, N.º 118, pp. 3599-3600. Obtido de https://m6.ama.pt/docs/Lei362011-NormasAbertas.pdf

Dougianas, M. (15 de 05 de 2013). Moodle 2.5 is now released! Obtido de Moodle: https://moodle.org/mod/forum/discuss.php?d=228539

Norman Group: http://www.nngroup.com/articles/usability-101-introduction-to-usability/

Presidência do Conselho de Ministros. (8 de novembro de 2012). Resolução do Conselho de Ministros N.º 91/2012. Diário da República, 1.ª série, N.º 216, pp. 6460-6465. Obtido de http://dre.pt/pdf1sdip/2012/11/21600/0646006465.pdf

Sousa, N. & Francisco, M. (2014). Acessibilidade na web: avaliação manual versus avaliação automática. In C. F. Diniz (Ed.), Livro de Resumos do VIII Semime (Exclusão Digital) (pp. 17-18). Lisboa: Faculdade de Motricidade Humana.

WCAG Working Group. (27 de 04 de 2006). Web Content Accessibility Guidelines 2.0 - W3C Working Draft - Appendix B: Checklist (Non-Normative). (B. Caldwell, W. Chisholm, J. Slatin, & G. Vanderheiden, Edits.) Obtido de W3C: http://www.w3.org/TR/2006/WD-WCAG20-20060427/appendixB.html

Web Accessibility Initiative. (2005). Introduction to Web Accessibility. (S. L. Henry, Ed.) Obtido de W3C.

Ir para o índice

ARTIGO 5 - O CONHECIMENTO QUE OS PROFESSORES MANIFESTAM SOBRE A METACOGNIÇÃO DA COMUNICAÇÃO NÃO-VERBAL NA ESCOLA INCLUSIVA: RESPOSTAS AOS ALUNOS COM NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS

Célia Sousa

Membro do iACT

Citar este artigo: Sousa, C. (2015). O conhecimento que os professores manifestam sobre a metacognição da comunicação não-verbal na escola inclusiva: respostas aos alunos com necessidades educativas especiais. In C. Mangas, C. Freire & M. Francisco (Orgs.), Inclusão e Acessibilidade em Ação - Diferentes percursos, um rumo. Leiria: iACT/IPLeiria, Artigo 5. [Online, disponível em http://iact.ipleiria.pt/]

Resumo

A presente investigação versa a problemática da escola Inclusiva e o conhecimento que os professores manifestam sobre a comunicação não-verbal na escola como resposta aos alunos com necessidades educativas especiais (NEE).Procurou-se compreender qual a opinião dos professores sobre o atual processo de inclusão e qual o seu grau de consciencialização acerca dos seus comportamentos não-verbais no estabelecimento do clima afetivo e emocional na sala de aula. Como resultado da investigação, verificou-se a importância da comunicação não-verbal no desenvolvimento do clima emocional e afetivo na sala de aula com estes alunos. No entanto, constatou-se a complexidade que a problemática encerra na qual uma multiplicidade de fatores, que se inter-relacionam determinam o fracasso ou o êxito da inclusão.

Palavras-Chave: inclusão, comunicação não-verbal, necessidades educativas especiais

Abstract

This research is about the problem of school Inclusive and knowledge that teachers express about nonverbal communication in school and for pupils with special educational needs (SEN). We tried to understand what the teachers' opinion about the current process of inclusion and what your level of awareness about their nonverbal behaviors in establishing affective and emotional climate in the classroom. In line with the objectives of the research, analyzes the evolution of the concepts of special education over time and the current legislative framework. Specifically, we study the origin and evolution of the concept of special educational needs and the importance of communication and non-verbal communication in the learning process of pupils with SEN. The methodology focuses on a qualitative approach has been used three techniques of data collection: observation through video recording, interviews and questionnaires. We studied three case studies. As a result of the investigation, it was noted the importance of nonverbal communication in the development of affective and emotional climate in the classroom with these students. However, it was found that the complexity of the issue which closes on a multitude of factors, which are interrelated determine the failure or success of inclusion.

Keywords: Inclusion, nonverbal communication, special needs

1. Introdução

Em janeiro de 2008 o Ministério da Educação introduz uma profunda reorganização da Educação Especial em Portugal com a publicação do Decreto-Lei n.º3 / 2008. Com a publicação desta legislação o governo estabelece como meta, o desenvolvimento de uma Escola Inclusiva, consagrando assim o princípio da igualdade de oportunidades.

Esta legislação tem como objetivo proporcionar uma educação inclusiva que deve ter por base a diversidade e características das crianças e jovens, às diferentes necessidades ou problemas.

A escola inclusiva é inquestionável do ponto de vista da sua conceção.

Estão os professores preparados para interagir com uma população tão heterogénea?

Como será a comunicação entre os diferentes atores intervenientes no processo de educação destes alunos?

Os estabelecimentos de ensino passaram a ser responsáveis pela Educação de todas as crianças, incluindo as que apresentam problemas mais graves. Todos sabemos que as atitudes do professor são essenciais ao processo de ensino-aprendizagem, especialmente no que se refere à comunicação. Contudo, há necessidade de saber como comunicam os professores dentro da sala de aula com esta população e quais as suas necessidades, pois, só após a análise de diferentes contextos, se poderá concluir como se processa a interação dos professores com as crianças e jovens com necessidades especiais.

Com este trabalho pretendemos desenvolver uma investigação, acerca do modo como se efetua a comunicação não-verbal por parte dos professores do ensino regular com os alunos com necessidades educativas especiais (NEE), de modo a permitir uma melhor adequação dos modelos comunicativos dos professores.

A maior parte dos conhecimentos adquiridos pelas crianças, realiza-se através da relação com os outros (adultos ou crianças), do que estes lhes contam e explicam, mas também vendo e ouvindo o que os outros fazem e dizem. Através dessas interações aprendem a comunicar; aprendem o significado dos objetos, das expressões faciais, dos gestos, dos movimentos e da fala. Desta forma, a criança adquire os conceitos e apropria-se de conhecimentos. “ A comunicação é a chave da aprendizagem” (Dowing, 1999, p.1).

Partindo desta perspetiva, comunicar é vital para o desenvolvimento da pessoa, para a manutenção da sua saúde e do seu bem-estar. O homem é um ser eminentemente social. Transporta em si potencialidades para responder aos estímulos humanos, através de competências comunicativas. No entanto, para as exercer necessita, de interagir com outra pessoa, de ter razões para o fazer, quer seja para protestar ou aplaudir.

Comunicar requer uma interação com o outro, e pressupõe uma intenção para provocar algum efeito no outro, sendo um processo dinâmico. Comunicar é, segundo Orelove e Sobsey citado por (Nunes, 2001, p. 80) “ um processo complexo de troca de informação usado para influenciar o comportamento de outros”.

Comunicar é um processo que implica respeito, partilha e compreensão mútua. Sendo assim, podemos afirmar que a comunicação está relacionada com todas as áreas do desenvolvimento, pois requer uma complexa combinação de “skills” cognitivos, motores, sensoriais e sociais. Importa ainda salientar a comunicação não-verbal, como parte integrante de todo o processo e que pode ser usada de uma forma tão subtil como uma piscadela de olho, ou uma expressão facial e ser tão eficaz como o uso da palavra falada.

Importa aprofundar a interação comunicativa do professor do ensino regular em turmas de alunos com necessidades educativas especiais. Para podermos proporcionar uma educação adequada a todos os jovens independentemente das suas necessidades, é necessário analisar o modo com o professor comunica dentro da sala de aula.

Para a construção de uma escola para todos, temos de ter consciência das dificuldades dos professores em interagirem com os alunos com NEE, em contexto de sala de aula, para tal, só analisando e aprofundando essa análise nos é possível contribuir para uma melhoria das respostas dentro da sala de aula. Essa análise vai permitir adequação dos currículos da formação de professores, assim como desenvolver ações de formação contínua, contribuindo assim de forma consistente para a melhoria das respostas a todos os alunos.

2. Finalidade e Objetivos do Estudo

Procurámos estruturar o nosso trabalho em torno de um conjunto de aspetos que nos pareciam relevantes. Para nós tornava-se então de especial importância perceber em que medida os professores do ensino regular interagem com os alunos com NEE, incluídos nas suas turmas. Pelo que achamos pertinente estudar o processo de interação dos mesmos, através do conhecimento que os professores têm dos seus comportamentos não-verbais dentro da sala de aula com estes alunos e os efeitos que produzem ao nível emocional e afetivo dos mesmos.

O nosso objetivo geral: constava em perceber, o grau de consciência que os professores têm do seu comportamento não-verbal nas interações diárias que desenvolvem com os todos os seus alunos na sala de aula, interações comunicativas, tanto relacionadas com as aprendizagens, como com o estabelecimento de um clima emocional e psicológico de carácter positivo.

Primeiro objetivo. Conhecer, o grau de consciência que os professores têm do seu comportamento não-verbal nas interações diárias que desenvolvem com os todos os seus alunos na sala de aula. 1.1. Identificar o conhecimento que os professores têm dos seus comportamentos não-verbais no processo de aprendizagem em turmas com alunos integrados.

Segundo objetivo. Observar quais são os comportamentos mais utilizados pelo professor no processo de ensino- aprendizagem. 2.1. Apurar em que medida os comportamentos não-verbais dos professores favorecem a inclusão.

Terceiro objetivo. Analisar as interações comunicativas dos professores, e estratégias que utilizam no estabelecimento de um clima emocionalmente positivo na sala de aula.

Quarto objetivo. Verificar em que medida o Decreto-Lei nº3 de 2008 melhorou o processo de inclusão na sala de aula. 4.1. Conhecer a atitude dos professores perante a legislação; 4.2. Analisar o nível de concordância entre as representações mentais e as atitudes mostradas na sala de aula.

Quinto objetivo. Conhecer as necessidades de formação com vista a melhorar o processo comunicativo dos professores, particularmente com crianças com Necessidades educativas especiais.

3. Fundamentação Teórica

Este trabalho iniciou-se com uma elaborada pesquisa bibliográfica dos conceitos de educação especial ao longo dos séculos e da importância da comunicação e da comunicação não-verbal. Em termos específicos, estudou-se a génese e a evolução do conceito de necessidades educativas especiais e a importância da comunicação verbal e da comunicação não-verbal no processo de aprendizagem dos alunos com NEE. Ao nível da evolução histórica analisámos conceitos sociais tais como: a segregação, proteção, diferenciação, integração, inclusão, autodeterminação e qualidade de vida.

No que se refere a evolução histórica da legislação da educação especial abordámos os paradigmas da Declaração de Salamanca, da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a inclusão e a Lei de Bases do Sistema Educativo e legislação complementar. A introdução do novo enquadramento legal, o Decreto-Lei nº3/2008 e as suas implicações no sistema educativo Português. Através da análise do referido decreto, pretendemos conhecer como se processam atualmente as respostas educativas aos alunos com necessidades educativas especiais. Abordando os seguintes aspetos: a organização e funcionamento da educação especial, o processo de avaliação/ intervenção, programação e planeamento, o plano individual de transição, as respostas educativas e modalidades específicas de educação.

Analisamos o conceito de necessidades educativas especiais assim como os diferentes tipos: necessidades educativas especiais de carácter temporário (NEET) e necessidades educativas especiais de carácter permanente (NEEP). No primeiro tipo foram as referenciadas as dificuldades de aprendizagem, no segundo tipo, foram descritas as NEEP mais comuns no meio escolar: deficiência intelectual, transtornos do espetro de autismo, síndroma de Down, deficiência motora, paralisia cerebral, distrofias, espinha bífida, deficiência auditiva, visual, surdocegueira e multideficiência.

No capítulo da comunicação, foram analisados os modelos de comunicação interpessoal, a comunicação não-verbal, a paralinguagem e ainda a comunicação aumentativa e as tecnologias de apoio como ferramenta de apoio aos alunos com NEE. Nos modelos de comunicação interpessoal apresentamos: Codificação/ descodificação, intencionistas, perspetivistas e modelos dialógicos. Na comunicação não-verbal abordamos as diferentes funções; cinésica, expressões faciais, modo de olhar, comunicação tátil, proxémia, cronémia, aparência física e meio ambiente. Assim como o papel da comunicação não-verbal na regulação da comunicação humana. Fizemos ainda uma breve abordagem à comunicação aumentativa e às tecnologias de apoio, como ferramenta de apoio aos alunos com NEE. Indicamos tipos de sistemas, população alvo para o seu uso, fatores a considerar na sua escolha e implementação, o sistema de símbolos pictográficos para a comunicação e ainda tecnologias de apoio interfaces para acesso ao computador e sistemas integrados.

Referimos a importância da metacognição na comunicação não-verbal na escola inclusiva e a inclusão de todos os alunos numa aprendizagem de sucesso. Referenciámos o conceito de metacognição e a importância do mesmo no desenvolvimento de estratégias metacognitivas de aprendizagem, processos metacognitivos aplicados a comunicação e qual a sua importância nos comportamentos comunicativos não-verbais e sua contribuição no desenvolvimento dos aspetos emocionais nas aprendizagens dos alunos com NEE.

4. Metodologia da Investigação

O principal objetivo desta investigação era entender o conhecimento que os professores manifestam sobre a metacognição da comunicação não-verbal na escola inclusiva assim como a consciência que possuem dessa mesma sua comunicação não-verbal, a situação e o contexto em que estas ocorrem. Para o desenvolvimento do presente estudo, selecionámos um Agrupamento de Escolas da região de Leiria que se tem salientado pelas suas práticas inovadoras assim como pelos elevados padrões de sucesso dos seus alunos.

Este estudo é composto por três professores de educação regular, com atividade letiva em turmas compostas por alunos com e sem necessidades educativas especiais de carácter permanente. Os professores selecionados lecionam as disciplinas de matemática e ciências e possuem tempos de serviço diferenciados (6, 11e 18 anos). No nosso estudo, importa referir que centrámos a nossa análise essencialmente na interação que os professores desenvolveram com os alunos com NEE, pois a questão principal é saber qual a influência dos comportamentos não-verbais nas aprendizagens dos alunos com NEE e respetiva perceção dos professores em relação ao novo processo de inclusão que se iniciou no ano letivo 2007/2008.

Este estudo insere-se numa investigação de cariz qualitativo uma vez que decorre no ambiente natural da escola. O método etnográfico facilitou e tornou possível a recolha, organização, contextualização e entendimento dos comportamentos não-verbais manifestados pelos professores e alunos. As técnicas de recolha de dados foram efetuadas com base no uso de três instrumentos: Observação, através das videogravações das aulas, entrevista e questionário.

O nosso estudo ajusta-se ao desenho de um estudo de caso coletivo centrado no contexto escolar e do tipo descritivo. Em primeiro lugar, porque está circunscrito a um contexto muito particular, o meio escolar (Agrupamento de escolas) e dentro deste, as turmas do 5º ano de escolaridade com alunos com necessidades educativas especiais de carácter permanente. Em segundo lugar, não nos limitamos ao estudo de um único, mas análise detalhada de três casos que partilham algumas características comuns, como por exemplo a partilha da mesma turma e outras que os distinguem e diferenciam como os anos de experiencia profissional, a formação profissional e pedagógica dos professores envolvidos, a tipologia dos alunos com NEE que frequentam as diferentes turmas. Porquanto o uso destas três técnicas permite uma triangulação de dados e o confronto dos mesmos, o que nos garante a fiabilidade e objetividade das diferentes interpretações.

As gravações de vídeo foram efetuadas por duas câmaras, uma fixa e uma móvel. A que se encontrava fixa, na parte da frente da sala de aula tinha por objetivo captar os comportamentos dos alunos com necessidades educativas especiais. A câmara móvel foi usada para registar todas as interações comunicativas do professor. Foram usadas apenas duas câmaras dado que o número de alunos a observar era diminuto numa turma dois alunos e noutra uma aluna, dado que na turma a que pertenciam os dois alunos estes se encontravam juntos não houve necessidade de colocar outra câmara. Todo o equipamento foi colocado antes do início das aulas para evitar alterações no funcionamento das mesmas e no comportamento dos alunos e professores. As descrições etnográficas extraídas a partir da observação, assim como as interpretações derivadas das mesmas foram contrastadas com os dados obtidos nas entrevistas e questionários.

No nosso estudo, as entrevistas realizadas aos professores seguem um guião comum a todos, contudo são admitidas modificações de acordo com as particularidades resultantes da observação das aulas de cada professor, questões que os entrevistados consideram de interesse e que podem facilitar a compreensão e interpretação dos seus comportamentos não-verbais. A elaboração do guião permitiu-nos manter o foco da nossa entrevista impedindo assim uma dispersão dos nossos entrevistados.

No nosso estudo o recurso ao questionário tinha como objetivo recolher informação rápida e clara sobre as opiniões dos nossos participantes. O questionário foi elaborado após a análise das videogravações e das entrevistas, para além de pretendermos aferir quais as reações aos comportamentos não-verbais, pretendíamos igualmente saber qual a opinião destes acerca do processo de inclusão e do Decreto-Lei nº3 de 2008. Com base neste trabalho organizámos o nosso questionário em cinco partes distintas, não considerando aqui, naturalmente uma primeira parte que consiste num breve texto onde é explicitado o objetivo do questionário, informações sobre quem deve responder-lhe e onde são dadas algumas instruções de resposta. A Parte I destina-se a recolher informações sobre o perfil profissional. A Parte II destina-se a recolher informações sobre o grau de conhecimento sobre o novo enquadramento legal para a Inclusão (Decreto-Lei nº 3/2008). Através dela efetuamos a análise das respostas de acordo com diferentes perfis de respondentes, nomeadamente de acordo com a categoria profissional, a participação ou não, em ações de formação contínua. A Parte III é constituída pelas questões resultantes da adaptação das “interrogações” consideradas relevantes nas entrevistas e pela análise das videogravações. Assim como acerca do envolvimento/articulação entre os diferentes intervenientes no processo de inclusão. Estas questões acabam por se constituir como um modo de análise dos diferentes comportamentos não-verbais observados nas videogravações das aulas. Tendo em conta essas observações, foram colocadas um conjunto de questões de acordo com as categorias definidas. Com estas respostas verificamos em que medida os sujeitos participantes no nosso estudo perceberam aquelas interrogações, independentemente do modo como tinham sido analisadas na observação não-participante e nas entrevistas. Este conjunto de questões permite aferir a consciência que têm da utilização de determinados comportamentos não-verbais no decorrer das suas aulas e em particular com os alunos com NEEP.

5. Análise de Dados e Resultados

Cada professor foi estudado no seu contexto pessoal, para tal indicamos a idade, a formação académica possuída e os cursos frequentados. De seguida foram analisados os seus comportamentos não-verbais através da observação das videogravações das aulas. Com esta técnica observamos e interpretamos os comportamentos não-verbais de um modo claro e objetivo.

Em cada professor foi observado um conjunto de comportamentos não-verbais que posteriormente foram agrupados em categorias. Apresentando-se um esquema de categorização por professor. Todas as observações vão sendo confirmadas em cada um deles através das entrevistas. As suas interpretações vão nos mostrando a sua consciencialização acerca dos seus comportamentos.

Procedeu-se a uma análise conjunta (tabela individual por professor) de todo o material em que se compara a observação dos comportamentos com as respostas verbais da entrevista, que são espontâneas, e as respostas escritas do questionário que são mais refletidas.

O tratamento dos dados de cada participante no nosso estudo seguiu os seguintes domínios:

  • 1- Interpretação dada pelos seus comportamentos não-verbais nas aulas no estabelecimento do clima emocional nas seguintes áreas: expressões faciais; aspetos visuais; proximidade física; contacto físico e gestos e movimentos.
  • 2- Nível de consciência apresentado pelos professores dos comportamentos não-verbais
  • 3- Variáveis de proximidade mais frequentes e categorias manifestadas.
  • 4- A importância que cada um dos professores dá ao comportamento não-verbal no processo de ensino/aprendizagem dos alunos com NEE.
  • 5- A necessidade de formação.

6. Conclusões

Esta investigação contribuiu para o aprofundamento do conhecimento que os professores manifestam sobre a metacognição da comunicação não-verbal na escola inclusiva e as respostas aos alunos com necessidades educativas especiais em escolas portuguesas estatais, com particular ênfase para a importância da comunicação não-verbal no estabelecimento do clima emocional da sala de aula.

Das informações recolhidas através da análise da observação não participante através da videogravação de aulas, respostas a uma entrevista e respostas a um questionário, foi possível encontrar aspetos que nos possibilitaram perceber minimamente como é que os professores encaram hoje, já com alguma distância temporal, o processo de inclusão, os contributos dos seus comportamentos não-verbais dentro da sala de aula para todo este processo.

De um modo geral, todos os professores são unânimes na importância do uso dos comportamentos não-verbais, como meio de melhorar e contribuir para um ambiente emocional estável na sala de aula com os alunos com NEE. Os resultados são lineares e totalmente concordantes entre as diferentes fontes ao nível do entendimento da importância dos comportamentos não-verbais como modo de estabelecer e proporcionar um clima emocional adequado a estes alunos. Sendo assim, podemos concluir que os intervenientes no nosso estudo tem consciência da importância dos seus comportamentos não-verbais nas interações diárias que desenvolvem com estes alunos (NEE), contudo apresentam um baixo grau de consciência no que se refere à tipologia e intenção dos diferentes comportamentos não-verbais usados pelos mesmos.

Relativamente aos objetivos específicos que tínhamos colocado para o nosso trabalho e que foram enunciados na sua introdução foi possível extrair as seguintes conclusões:

1. Relativamente ao primeiro objetivo, identificar qual o grau de conhecimento e consciência que os professores têm dos seus comportamentos não-verbais no processo de aprendizagem dos alunos com NEE conclui-se:

  • 1.1. Diminuto conhecimento dos comportamentos não-verbais.
  • 1.2. Escassa consciência do papel da mensagem não-verbal no processo de aprendizagem.
  • 1.3. Detetou-se que em muitos dos comportamentos que os professores apresentam, quando não encontram explicação para os mesmos, tentam justificar a sua falta de consciência com razões relacionadas com a sua personalidade ou modo de se apresentarem.
  • 1.4. A maioria dos gestos foi adquirida através da experiência e posteriormente foram transformados em comportamentos ritualizados.
  • 1.5. Apesar do desconhecimento dos seus comportamentos não-verbais, todos os professores foram unanimes na importância do uso dos mesmos no desenvolvimento do clima emocional da sala de aula.
  • 1.6. Os professores analisados não se questionam em relação aos seus comportamentos não-verbais e ao modo como eles se processam e evoluem, apenas afirmam que não tiveram formação na área.
  • 1.7. Acreditam que os comportamentos não-verbais podem ser uma ferramenta preciosa na inclusão dos alunos com NEE.

Através da análise dos diferentes elementos de recolha de dados do nosso trabalho, podemos aferir que todos os intervenientes no nosso estudo concordam plenamente com a importância dos comportamentos não-verbais nas aprendizagens, contudo quando confrontados com o grau de consciência dos seus comportamentos mostram um enorme desconhecimento no uso dos mesmos. Apesar do nível de consciência ser diminuto, os nossos resultados indicam que os professores são capazes de descrever alguns gestos ilustrativos ao nível dêitico e icónico.

2. Em relação ao segundo objetivo, que pretendia perceber quais são os comportamentos mais utilizados pelos professores no processo de ensino- aprendizagem e em que medida esses comportamentos favorecem a inclusão, os dados recolhidos no nosso estudo são de grande relevância. Neste sentido podemos afirmar que as áreas presentes ao nível das manifestações não-verbais nos professores do nosso estudo são as seguintes: utilização do espaço (proxémia); contacto físico (comunicação tátil); gestos e movimentos corporais (cinésica); aspetos visuais; expressões faciais. Os resultados indicam que:

  • 2.1. Os professores apresentam um maior nível de conhecimento, domínio e consciência dos seus comportamentos não-verbais no que se refere a proxémia, aos aspetos visuais e ao contacto físico, sendo que este último apenas é utilizado por dois professores, referindo que esse contacto é fundamental para a autoestima e para inclusão plena destes alunos.
  • 2.2. No que se refere as expressões faciais, o sorriso e franzir ou arquear as sobrancelhas são expressões que são usadas de modo consciente, sendo a primeira usada com o objetivo de incentivar e estimular os alunos e a segunda de demostração de desagrado. Quando questionados sobre o conhecimento do efeito destas expressões dizem não saber, contudo podemos afirmar que o uso das mesmas é feito de modo consciente apesar do desconhecimento acerca das mesmas.
  • 2.3. Do ponto de vista da cinésica ou seja da multiplicidade de gestos, movimentos e partes do corpo que os docentes empregam com os alunos com NEE, podemos dizer que estes adquirem funções e formas distintas dependendo da situação. Quando questionados sobre os diferentes gestos os professores foram unânimes nas suas respostas, referindo que nunca tinham pensado que movimentavam tanto as mãos e mencionando que muitos dos seus comportamentos são produzidos de forma automática, portanto, não têm consciência da sua presença nem das possibilidades e finalidades que desempenham, apenas os utilizam para dar dinamismo às expressões verbais.
  • 2.4. No entanto, nas nossas observações podemos constatar que apesar das suas declarações, os professores utilizam e empregam conscientemente alguns gestos com as mãos e dedos e atribuem-lhes uma finalidade específica. Um dos objetivos da sua utilização está relacionado com a captação da atenção dos alunos através da utilização de gestos ilustrativos.
  • 2.5. No nosso estudo podemos observar que, apesar dos professores referirem que não tem consciência dos seus gestos, recorrem aos mesmos com muita frequência para elogiarem e ilustrarem conteúdos programáticos com estes alunos.

3. Para o terceiro objetivo, analisamos as interações comunicativas dos professores, e estratégias utilizadas no estabelecimento de um clima emocionalmente positivo na sala de aula. Relativamente à interpretação de alguns comportamentos não-verbais apresentados pelos professores podemos concluir o seguinte:

  • 3.1. O sorriso é a manifestação não-verbal que os professores empregam com maior frequência com os alunos. Consideram o sorriso como um meio para fomentar um clima de alento, aprovação e autoconfiança nos alunos.
  • 3.2. As expressões faciais como: franzir as sobrancelhas e o olhar fixo, juntamente com gestos manuais, são os comportamentos mais utilizados para interagir com os alunos com NEE.
  • 3.3. Circularem pela sala de aula é tido como um modo de facilitarem a interação com os alunos.
  • 3.4. A utilização de diferentes gestos com as mãos ou objetos tais como: a caneta, lápis, servem como um estímulo visual para facilitar a compreensão.
  • 3.5. O olhar individualizado e a aproximação física como um modo de chamar atenção e mostrar disponibilidade para acompanhar os alunos.
  • 3.6. O contacto físico como reforço e prova de confiança.

4. No quarto objetivo, procurámos aferir em que medida o Decreto-Lei nº3 de 2008 contribuí para a melhoria e otimização do processo de inclusão. Podemos constatar que por parte dos professores envolvidos no estudo:

  • 4.1. Existe uma certa insatisfação no modo como todo o processo tem decorrido. Quer pelos resultados obtidos através dos questionários quer pelos resultados obtidos através da entrevista.
  • 4.2. Todos os professores analisados são consensuais quanto à excessiva burocratização no processo de aplicação da legislação, assim como da escassez de orientações por parte do Ministério da Educação.

5. No quinto objetivo, pretendíamos conhecer as necessidades de formação com vista a melhorar o processo comunicativo dos professores, particularmente com crianças com Necessidades Educativas Especiais.

  • 5.1. Os professores do nosso estudo têm consciência da sua deficiente preparação tanto ao nível da sua formação inicial como ao longo da vida, sobre o processo comunicativo e especialmente ao nível da comunicação não-verbal.
  • 5.2. Referiram igualmente a necessidade de mais formação na área da educação especial.
  • 5.3. No que respeita a área da comunicação verbal e não-verbal todos os participantes sugeriram que esta temática deve ser alvo de uma unidade curricular na formação de professores, pois consideram a comunicação como uma ferramenta essencial e fundamental no processo de ensino aprendizagem.
  • 5.4. Todos os professores concordaram com a necessidade urgente da implementação de um programa de formação que contemple todos os professores e que tenha um carácter de obrigatoriedade.
  • 5.5. O nosso trabalho suscitou interesse pelo tema em todos os professores do nosso estudo e algumas das suas opiniões estão em sintonia com as nossas ao reconhecer que a comunicação não-verbal é fundamental para o estabelecimento de atitudes positivas com os alunos, e consequentemente para uma melhor otimização das aprendizagens e de uma escola para todos.

Algumas reflexões finais

Gostaríamos de terminar com algumas sugestões/reflexões finais que, não se constituindo especificamente objetivos do trabalho, permitiram-nos uma reflexão que gostaríamos de partilhar. Através deste estudo podemos referir que os professores têm pouca consciência do modo como os seus comportamentos não-verbais podem provocar atitudes positivas ou negativas nos alunos com NEE. Contudo podemos referir uma certa coerência na interpretação dos diferentes comportamentos por parte dos professores nas observações por nós efetuadas, em relação a alguns gestos característicos no contexto de sala de aula, tais como: sorrir, apontar com a mão, franzir as sobrancelhas e olhar fixamente para um aluno.

Dos três professores estudados podemos depreender o seguinte: apesar de nenhum deles manifestar uma consciência profissional da influência dos seus comportamentos não-verbais nos alunos com NEE, no que toca aos professores com mais anos experiência, pudemos constatar que, havia uma maior preocupação por parte destes no modo como interagiam (comunicação não-verbal) com os alunos com NEE. Para além de adaptarem e preparem antecipadamente as atividades manifestavam igualmente uma grande preocupação com o lugar físico que estes alunos ocupavam na sala de aula. Pelas observações efetuadas, podemos concluir que no nosso estudo a experiência pode ser tida como uma mais-valia, não só no processo comunicativo no que se refere às manifestações não-verbais, como em relação ao processo de inclusão destes alunos.

O interesse suscitado pelo nosso estudo por parte de todos os professores envolvidos permite-nos afirmar que a comunicação não-verbal pode melhorar o processo de inclusão dos alunos com NEE nas nossas escolas, contribuindo para uma melhoria do clima afetivo dentro da sala de aula e uma otimização das aprendizagens.

Os instrumentos de recolha de dados utilizados na nossa investigação e a reflexão sobre a própria recolha com os professores (entrevistas e questionários) permitiram uma reflexão e consciencialização por parte destes no modo como começaram a contemplar todo o processo comunicativo, nas aprendizagens.

Da análise do nosso trabalho podemos igualmente concluir que em virtude da formação inicial e contínua dos professores não contemplar o desenvolvimento do processo comunicativo nomeadamente ao nível da comunicação não-verbal, concluímos que é necessário desenvolver um plano de formação que permita a aquisição de técnicas de comunicação em particular ao nível da comunicação não-verbal.

Tendo sempre presente que o professor é quem toma as decisões finais dentro da sua sala de aula sobre o que é melhor para a educação dos seus alunos, não só ao nível dos conteúdos como ao nível das relações, apesar de muitas destas decisões ter como base as orientações curriculares, podemos afirmar que o professor é um modelo dentro do seu contexto.

A comunicação na sala de aula é fundamental, como tal deve ser estudada em profundidade, permitindo assim uma maior consciencialização por parte dos professores. O controlo do comportamento não-verbal é fundamental para a gestão da sala de aula.

Atualmente, a subvalorização da comunicação não-verbal e as diferentes características dos alunos com NEE nos programas de formação dos professores e na formação contínua dos mesmos é uma realidade. Se queremos uma escola para todos, temos de consciencializar os professores da importância do uso da comunicação não-verbal, pois esta é fundamental para o desenvolvimento do clima afetivo de qualquer aula.

O uso consciente da comunicação não-verbal vai permitir uma melhoria dos campos cognitivo e afetivo, pois estes não são parcelas independentes. Permite ainda, compreender melhor as mensagens dos alunos porque tendo o professor um conhecimento profundo dos comportamentos não-verbais, pode aplicá-los de forma consciente enviando sinais positivos que vão reforçar a aprendizagem dos alunos. Se os professores estiverem capacitados para analisar, questionar e modificar os seus próprios comportamentos não-verbais, podem melhorar a transmissão de conhecimentos através do estabelecimento de interações positivas.

O nosso trabalho pretendia extrair conclusões úteis para o processo de inclusão. Nesse sentido podemos inferir:

  • a) Que o processo de inclusão dos alunos com NEE seria mais bem-sucedido, se todos os professores tivessem consciência plena, do modo como manipulam os seus comportamentos não-verbais com estes alunos.
  • b) Para que se efetuem mudanças conscientes, é necessário que os professores tenham perceção das técnicas que podem utilizar, assim como da legislação, o que implica que seja traçado um plano de formação pelos centros de formação para os professores que se encontram em exercício e uma revisão do plano de formação inicial por parte das escolas de formação de professores.

Referências Bibliográficas

Decreto Lei nº 3/2008 de 7 de janeiro. Diário da República, 1.ª série - N.º 4. Ministério da Educação. Lisboa.

Dowing, J. D. (1999). Teaching Communication Skills to Students with Severe Disabilities. Inc. Baltimore, London, Toronto,Sydney: Paul Brookes Publishing Co.

Nunes, C. (2001). Aprendizagem Activa na Criança com Multideficiência guia para educadores. Lisboa: Ministério da Educação.

Ir para o índice

ARTIGO 6 - AS DIFERENTES DIMENSÕES NO JOGO SIMBÓLICO EM CRIANÇAS COM TEA (TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA)

Ana Saldanha

Membro do iACT

Citar este artigo: Saldanha, A. (2015). As diferentes dimensões no Jogo Simbólico em crianças com TEA (transtorno do Espectro Autista). In C. Mangas, C. Freire & M. Francisco (Orgs.), Inclusão e Acessibilidade em Ação - Diferentes percursos, um rumo. Leiria: iACT/IPLeiria, Artigo 6. [Online, disponível em http://iact.ipleiria.pt/]

Abstract

This paper is aimed at the study of the autism, particularly Autistic Spectrum Disorder (ASD), that seriously affects the development of children. It results in severe restrictions to education and social integration, yet the level of incapacity varies greatly from person to person, depending on the quality of the educational intervention. Consequently, we will attempt to use a scientific study, in order to decrease those difficulties, specifically through the use of symbolic game. This article is an excerpt from a great job of research on the playing ability of children with ASD. The purpose of this presentation is an updated review of the issue, through an analysis of the most significant instruments – that were created both specifically to diagnose play ability, as well as general instruments that include the assessment of a particular aspect of play – pre-symbolic, symbolic…With this analysis, we will then evaluate the effectiveness of symbolic game and its dimensions.

1. Enquadramento

O presente artigo é um estudo em que pretendemos demonstrar que nas diferentes dimensões do jogo simbólico podem-se identificar diferentes habilidades intelectuais em crianças com incapacidade, nomeadamente em crianças com TEA (transtorno do Espectro Autista). Segundo proclamou em 1959 a Assembleia Geral das Nações Unidas e ratificou em 1990 o Parlamento Espanhol, jogar é um direito da infância e dos adultos e temos que velar pelo seu cumprimento em todas as crianças ainda que, em algumas situações, se encontrem sérias dificuldades para o desenvolvimento desta atividade.

O jogo possibilita o desenvolvimento da própria capacidade física e mental, é uma fonte de autoafirmação, satisfação e prazer. Jogar significa ser ativo e preparar-se para a vida adulta. É através do jogo simbólico que a crianças exprime sensações, emoções e reflete o que deseja. Uma carência importante de jogo na infância ocasionará um desenvolvimento incorreto e incompleto da personalidade!

As crianças observam, exploram e chegam a conhecer-se melhor a si mesmas e ao mundo que as rodeia através do jogo, porque este é um meio educativo de importância indiscutível que proporciona a oportunidade de aprender e praticar as habilidades sociais. O contributo de Vygotsky (1999), sobre o jogo na infância, implica a sua valorização acrescida pela relação estreita que o autor estabelece entre jogo e aprendizagem. Defende que o jogo relaciona-se com o papel que a criança atribui à imaginação, e essa depende das necessidades, das experiências, dos sentimentos e dos interesses, assim como da capacidade combinatória e do exercício contido nessa atividade. Para que isso seja possível, existem dois tipos fundamentais de conduta humana que permitem essa plasticidade no cérebro: a atividade reprodutora, em estreita relação com a memória e a atividade criadora e combinatória, em estreita relação com a imaginação. A relação entre o jogo e o desenvolvimento cognitivo na criança deve também pretender a relação entre o jogo e a atividade combinatória do cérebro, a essência da criatividade. Segundo o autor, uma das questões mais importantes da pedagogia infantil e da psicologia, diz respeito à criatividade das crianças, ao seu desenvolvimento e à importância do trabalho criado para a evolução e maturação da criança. Como o próprio autor afirma, os processos de criação são observáveis sobretudo nos jogos da criança, porque no jogo a criança representa e produz muito mais do que aquilo que viu. “Todos conhecemos o grande papel que nos jogos da criança desempenha a imitação, com muita frequência estes jogos são apenas um eco do que as crianças viram e escutaram nos adultos, não obstante estes elementos da sua experiência anterior nunca se reproduzem no jogo de forma absolutamente igual e como acontecem na realidade. O jogo da criança não é uma recordação simples do vivido, mas sim a transformação criadora das impressões para a formação de uma nova realidade que responda às exigências e inclinações da própria criança” (Vygotsky, 1999, p. 12). Esta ideia de transformação criadora, a que se refere Vygotsky, é completamente diferente da teoria de Piaget sobre a assimilação do real ao eu. Estes autores falam em transformação do real por exigência das necessidades da criança, mas enquanto que para Vygotsky a criança cria (desenvolve o comportamento combinatório) a partir do que conhece, das oportunidades do meio e em função das suas preferências e necessidades, para Piaget (1961) a imaginação da criança é uma atividade deformante da realidade.

Lieberman (1965, 1967) propõe o estudo das manifestações do comportamento através do jogo. No entanto, na sua perspectiva falta-lhe uma abordagem às teorias prévias, proporciona o campo lúdico com um foco numa disposição comportamental, evocando assim, uma mudança paradigmática em comportamentos discretos do jogo. A autora define jogo lúdico como: uma espontaneidade física, social e cognitiva, manifestando alegria e humor, e relata que o lúdico nas crianças é uma predisposição comportamental unitária.

Um estudo realizado por Lieberman (1977) sobre o carácter de jogo nas crianças e a sua criatividade, sustenta a hipótese de que o carácter do jogo pode ser definido em função de cinco rasgos: a espontaneidade física, a espontaneidade social e cognitiva, as manifestações de alegria e o sentido de humor. Concluiu que as crianças mais brincalhonas tiveram melhores resultados nas provas de pensamento divergente que as menos brincalhonas.

Muitos outros autores estudaram a relação do jogo com o desenvolvimento sociocognitivo, tal como aqueles que já fizemos referência, ou como Rogers & Sawyers (1995), Levy (1978) e Erikson (1940), que defenderam que o lúdico é diferente de jogo e que os rituais lúdicos (cultura que serve de função social que facilita a transição de um membro de uma determinada cultura para um status social) são formalizados pelo humanos. O ponto de vista deste autor baseia-se no jogo lúdico e na forma de perceber o papel da ritualização na experiência do homem.

Para Wallon (1981), as pesquisas em relação à importância do jogo na infância são várias, e as diferentes concepções sobre este são muitas vezes confundidas. São como uma actividade que se mantém espontânea e não recebe o seu devido valor nas disciplinas educativas.

Conforme diz Winnicott (1975), uma criança que não brinca não se desenvolve de forma saudável, tendo prejuízos ao longo do seu desenvolvimento motor e sócio/afectivo. Possivelmente tornar-se-á apática perante situações que proporcionam o raciocínio lógico, a interação, a atenção etc. O brincar leva ao crescimento e por conseguinte, ao desenvolvimento.

Com a socialização da criança, o jogo adopta regras ou adapta cada vez mais a imaginação simbólica aos dados da realidade, sob a forma de construções ainda espontâneas mas imitando o real; sob estas duas formas, o símbolo de assimilação individual cede assim o passo quer à regra colectiva, quer ao símbolo representativo ou objectivo, quer aos dois reunidos.

Poderá dizer-se que o jogo lúdico se desliga do ritual, sob a forma de esquemas simbólicos, graças a um progresso decisivo no sentido da representação. Esse progresso concretiza-se, precisamente, quando da passagem da inteligência empírica para a combinação mental e da imitação exterior para a imitação interna ou diferida (Piaget, 1971).

Segundo diversos autores, como por exemplo, Ungerer et al. (1981), Lowe, (1975) Lowe & Costello (1976) e McCune-Nicolich, Kalmsnson, Fleck, Glazewski e Sillari (1990), com o objectivo de estabelecer uma avaliação correta ou um diagnóstico acertado, tal como conseguir aceder ao potencial real evolutivo da criança, os profissionais recorrem frequentemente ao jogo. Desta forma, a criança colabora e as sessões diagnósticas tornam-se em momentos lúdicos. Normalmente numa avaliação completa, juntamente à avaliação da linguagem e da comunicação e da avaliação cognitiva, uma avaliação do jogo simbólico é incluída, tanto em crianças pequenas como em crianças com psicopatologias diversas.

É fundamental o uso sistemático e com métodos estandartes e replicáveis, que permitam a reavaliação e um certo controlo evolutivo de métodos de avaliação do jogo simbólico. Caso contrário, a avaliação do jogo simbólico será baseada em observações gerais ou em situações impressionantes.

Esta necessidade crescente de utilizar métodos estandartes do jogo simbólico tem vindo-se a comprovar devido a: por exemplo, na hora de valorar as possibilidades de utilização de sistemas não vocais de comunicação alternativos e/ou aumentativos é fundamental conhecer o nível de simbolização. Passar a todas as crianças não-verbais (com a mesma igualdade), sem ter em conta que os seus níveis de simbolização são muito diferentes, é um erro tremendo (García-Sanchéz, 1991

Após esta situação propõe-se uma definição de jogo simbólico ou pretend play (usa-se de forma intercambiável) e distingue-se do jogo real ou funcional (Baron-Cohen, 1987).

Assegurar-se de que existe um jogo simbólico significa que a criança sabe qual é o objecto que usa e sabe qual é o objecto representado, com o que se desacataria o jogo simbólico por erro ou confusão. Ele supõe uma representação simultânea ou “duplo conhecimento” (McCune-Nicolich, 1981). Além disso, o jogo supõe uma qualidade como por exemplo, comer a papa com uma pedra, como se fosse um prato e tivesse comida. Outro aspecto a incluir é a qualidade transformacional dos objetos reais em simultâneo ou simbólico. O jogo simbólico pode ver-se como algo generativo e produtivo, não é um produto degradado em relação à inteligência (Piaget, 1961).

Baron-Cohen (1987), partindo desta definição de jogo simbólico, operacionaliza-a da maneira seguinte: o jogo simbólico dá-se quando aparecem evidências de uso de um objecto como se fosse outro objecto diferente; e/ou atribuição de propriedades a um objecto sem possui-las; e/ou referência a um objecto ausente como se estivesse presente. Esta análise baseia-se num jogo simbólico observado. Este autor, observa o jogo em três amostras de autistas, normais e crianças com síndrome de Down (igualados), 10 em cada grupo. Os resultados indicam que os autistas, em comparação com os normais e os Down`s, apenas apresentam jogo simbólico ou de simulação. Nos sofredores de Down e nos normais, o jogo simbólico é correlativo ao seu nível mental. Confirma os estudos prévios e sugere que o défice no jogo simbólico ou pretend play é específico do autismo. Outro resultado a criticar é o alto nível de acordo inter-observador em respeito às categorias definidas. Os deficientes com jogo simbólico só se diferenciam dos deficientes sem jogo simbólico pela idade mental não-verbal.

Entre os autistas, os que manifestaram simbolização frente aos que não, também manifestaram uma idade mental maior. Por outro lado, os autistas apresentaram uma grande quantidade de jogo sensório-motor e funcional, o que coincide com os diversos estudos e apoia a noção de que os autistas fracassam no jogo simbólico ou de simulação frente ao jogo funcional ou de realidade (Baron-Cohen 1987).

Marchesi, Alonso, Paniagua e Balmaceda (1995) fazem um estudo das dimensões de jogo simbólico a 12 crianças surdas profundas. Nesse estudo identificam quatro dimensões de jogo simbólico e dentro de cada dimensão faz subdivisões, tais como: Descentramento, é entendido como a capacidade de realizar atividades referidas a um objecto (passivo ou ativo), ou auto referidas, atribuindo-lhes ações simbólicas, "vida" ou "sentimentos". É, portanto, um processo progressivo pelo qual a criança vai assumindo pouco a pouco o ponto de vista dos outros), e dentro desta subdivide em ações simbólicas autoreferidas; ações simbólicas referidas a um agente passivo, ações simbólicas referidas a agente ativo (normalmente as crianças chegam a este nível entre os dezassete e os vinte e seis meses de idade); ações simbólicas referidas a agente ativo, mas atribuindo sentimentos ou ações mais complexas (34/28 meses); interação entre vários agentes (31/25 meses);interação entre vários agentes, atribuindo ações mais complexas e/ou sentimentos (39/32meses). Dentro desta dimensão, estes autores chamam-nos à atenção pelo facto de existir uma “pequena” dimensão dentro desta primeira, designada como identidade, em que as crianças são capazes de nomear os bonecos, identificá-los como uma personagem (esta poderia entender-se como parte da dimensão de descentramento, já que se está em definitivo desenvolvimento e a capacidade de realizar ações simbólicas referidas a agente ativo.

A segunda dimensão é designada por substituição (capacidade da criança para utilizar objetos com uma determinada função, para outra função distinta) e é constituída por: utilização de objetos realistas; substituição de um objecto ambíguo. Substituição de vários objetos ambíguos numa sequência de jogo (28 meses); substituição de um objecto realista por outra função diferente da sua (21 e 34 meses), e substituição no vazio. (3-15 meses aos 29/ 37 meses).

A terceira dimensão a que se referem estes autores chama-se integração de ações (crescente capacidade da criança para integrar ações em sequência) e é composta por: ações simbólicas isoladas; a mesma ação repete-se com vários agentes; sequência ilógica de duas ações; sequência ilógica de mais de duas ações (15 meses); sequência lógica de duas ações (20 meses); sequência lógica de mais de duas ações (25 meses); sequência lógica em que interatuam vários agentes (21/ 37 meses); sequência lógica de várias ações em que cada ação é qualitativamente mais complexa, configurando um tema único em que se pode vislumbrar um princípio e um fim (28 meses até 34 meses) e, finalmente, a última dimensão é designada por planificação (um plano que se manifesta pelos preparativos que a criança faz ou pelas suas emissões linguísticas. Precede ao desenvolvimento do jogo (a criança prepara um plano). Esta dimensão é composta por: ausência de planificação; planificar uma ação isolada (14 / 32 meses); planificação de uma ação, mas integrada numa sequência de jogo (34 meses) (46 meses); planificação de várias ações dentro de uma sequência lógica de várias ações (25 / 38 meses); e como última, planificação de toda uma sequência de jogo.

Estes autores advertem que dentro da dimensão planificação é interessante observar a sua correlação com a dimensão de identidade. Quando as crianças são capazes de planificar várias ações dentro de uma sequência, sendo fácil observar que atribuem identidades aos bonecos (Marchesi, Alonso, Paniagua e Balmaceda, 1995).

Ao postular que de uma maneira sistemática se avalie o jogo simbólico, não tem senão uma finalidade: que este seja considerado sistematicamente na intervenção (educativa, terapêutica, etc.); é desejável a generalização do conhecimento e uso destes métodos. A par do desenvolvimento de métodos de jogo simbólico, deveriam ser desenvolvidos métodos de intervenção de jogo simbólico, visto que a este nível existe uma grande lacuna. O desenvolvimento evolutivo deveria ser dividido e deveriam ser elaborados métodos de treino, tal como já existem noutras áreas, como na da linguagem. Esta necessidade é mais urgente que a anterior, se bem que, não se podem separar os métodos de avaliação dos de intervenção, e um conhecimento profundo da avaliação normal pode preparar grande parte do caminho.

Neste caso, o interesse é de carácter não só teórico, tentando aprofundar o núcleo do problema autista, mas também tem a finalidade de contribuir para diagnóstico diferencial e na intervenção precoce (García-Sánchez, 1992).

2. Desenho do Estudo

A seguinte contribuição é um excerto de um estudo mais amplo sobre o jogo em crianças com TEA (Transtorno do Espectro Autista). A parte que aqui apresentamos refere-se à investigação no que concerne às dimensões do jogo simbólico.

Objectivos:

Comprovar que no jogo simbólico podem se identificar dimensões que fazem referência a diferentes habilidades intelectuais específicas.

Método:

A nossa amostra é não probabilística voluntária composta por um grupo de quarenta e quatro crianças portadoras da perturbação autista, dos dois aos quatorze anos de idade, pertencentes a um concelho de Espanha.

Tabela 1 - Distribuição da amostra por sexo

Género

Frequência

Percentagem

Percentagem válida

Percentagem

b>acumulada

Feminino

9

20,45%

20%

20%

Masculino

35

79,55%

80%

100%

Total

44

100%

100%

 

gráfico circular indicando que 79,55% são do sexo masculino

Gráfico 1 - Distribuição da amostra por género.

Tabela 2 - Distribuição da amostra por idade

 

Frequência

Percentagem

Percentagem válida

Percentagem acumulada

2

3

6,8

6,8

6,8

3

8

18,2

18,2

25,0

4

3

6,8

6,8

31,8

5

3

6,8

6,8

38,6

6

2

4,5

4,5

43,2

7

7

15,9

15,9

59,1

8

2

4,5

4,5

63,6

9

4

9,1

9,1

72,7

10

2

4,5

4,5

77,3

11

4

9,1

9,1

86,4

12

1

2,3

2,3

88,6

13

2

4,5

4,5

93,2

14

2

4,5

4,5

97,7

15

1

2,3

2,3

100,0

Total

44

100,0

100,0

 

A tabela acima desenhada, caracteriza a nossa amostra segundo a idade. Podemos dizer que a 50% da nossa amostra situa-se abaixo dos 7 anos de idade e outros 50% acima dos 7, tendo em conta que a nossa amostra varia dos 2 aos 15 anos de idade.

gráfico de barras indicando o número de sujeitos por idade

Gráfico 2 - Distribuição da amostra por idade.

3. Instrumentos:

Como referimos anteriormente este estudo é fruto de um estudo anterior, onde nos propomos a elaborar um questionário que avalie as dimensões de jogo em crianças com a perturbação autista. Perante a ausência de instrumentos que nos servissem para o cumprimento do nosso objectivo, vimo-nos com a necessidade de construir um que fosse idóneo para a finalidade pretendida: questionário atual aos dias de hoje, que avalia-se todas as dimensões de jogo simbólico, simples, conciso e de fácil aplicação. Por conseguinte, para elaborarmos o nosso questionário recorremos a autores que em estudos anteriores fizeram uma análise de jogo.

Na elaboração do nosso complexo questionário recorremos também à literatura científica e nela as aportações de autores que em estudos teóricos ou experimentais analisaram este aspecto do jogo. Aproveitando todo o tipo de estudos: evolutivos, cognitivos, condutuais, afectivos, sociais, lúdicos, etc, operativizámo-los, adaptámo-los e realizámos distintas variações ou aproximações ao nosso questionário, recorrendo aos Níveis e estádios de Piaget; Níveis e estádios de Ingre Bretherton; Níveis e estádios de McCune-Nicolich; Dimensões do jogo simbólico segundo Marchesi, Alonso, Paniagua & Balmaceda e aprova de jogo simbólico de Lowe & Costello.

3.1 Procedimentos:

A primeira etapa baseou-se na pesquisa de autores que tivessem estudado o jogo em crianças, e analisar as etapas e os estádios por eles criados. Por outro lado, fizemos também uma pesquisa exaustiva de artigos e trabalhos, tal como de revistas especializadas, que nos parecessem adequadas ao tema de que tratamos. A ideia de consultar especialistas de jogo na hora de formular os itens, não foi descartada, tal como observar o comportamento das crianças a jogar na rua, de forma discreta. Pensamos que este último procedimento poderia favorecer a espontaneidade e a exuberância das ideias. A observação não participante, concentra-se na atenção em certos aspectos da conduta, sem intervenção entre o observador e o sujeito ou grupo observado. Este tipo de observação é extremamente usada no modelo racionalista de investigação, tanto em estudos experimentais como correlacionais, como técnica de recolha de dados (Buéndia, Colás e Hernandéz, 2001). O sentir-se observado ou julgado, em certa forma, pela investigadora, poderia condicionar as suas asseverações. A observação favorece uma compreensão melhorada do comportamento e uma maior acessibilidade aos sujeitos que se observam, se bem que por vezes leva ao perigo da subjetividade, como por exemplo, atribuir ao sujeito observado, sentimentos ou juízos do observador! É de salientar que a nossa observação foi meramente uma atitude “curiosa” com o objectivo de ver como é que as crianças “brincam umas com as outras”, e com o objectivo de ver também as atitudes de jogo simbólico.

Deste trabalho resultou um questionário com 24 itens.

O autismo é uma das várias áreas nas quais a análise comportamental tem sido aplicada com sucesso. Com esta formação e com o convívio diário com crianças autistas num centro altamente especializado e preparado para este tipo de crianças, apercebemo-nos que mesmo assim tínhamos um questionário extenso para o tipo de amostra a que iríamos aplicar.

Durante diversas conferências que tivemos e durante os curtos períodos de observação, podemos de imediato constatar que o nosso questionário para a ser aplicado a crianças com esta síndrome, continuava muito extenso. Por conseguinte, voltamos a fazer um estudo ainda mais profundo de item a item, o qual resultou o questionário definitivo, que é composto por 24 itens.

3.1 Questionário final:

O nosso questionário definitivo foi elaborado com o objectivo de avaliar a capacidade simbólica das crianças com TEA, e está constituído por 24 itens e dividido em duas partes.

A primeira é nomeada como Pré-Simbólica (10 itens) e a segunda de Simbólica (14 itens). Optámos por fazer esta pequena distinção entre os itens, porque segundo diversos autores, a criança a partir dos oito, nove meses, ou até antes, começa com comportamentos que podem significar o início do jogo. Deste modo, a nossa fase de jogo Pré-Simbólica é constituída por 10 itens, entre os quais não existe grau de dificuldade e baseia-se em itens de jogo de exercícios simples, tais como agarrar num objecto, olhar, balançar-se, saltar, correr, etc..

A fase Simbólica, propriamente dita, é composta por 14 itens, entre os quais vai aumentando o grau de dificuldade. Os exercícios descritos no nosso questionário, foram realizados de acordo com os diversos estádios, níveis e dimensões de jogo simbólico dos autores a que fizemos referencia anteriormente. Todos os itens avaliam acções simbólicas.

Por exemplo: a criança vê o brinquedo desejado e tenta chegar a ele.

pergunta realizou a atividade? sim ou não. se sim: 1-verbal, 2-visual, 3-imitação

Figura 1. Forma gráfica da avaliação do questionário

4. Resultados:

4.1 Média para a Dimensão “Descentramento”

A primeira Dimensão encontrada e tal como defendiam autores como Marchesi & Alonso (1995), entre outros, é a chamada de Descentramento, ou seja, é a capacidade de realizar atividades referidas a um objecto (passivo ou ativo), ou auto referidas, atribuindo–lhes ações simbólicas, "vida" ou "sentimentos". É, portanto, um processo progressivo pelo qual a criança vai assumindo pouco a pouco o ponto de vista dos outros.

Tabela 3 - Média para a Dimensão “Descentramento”

Grupo

Descentramento

Pontuações

Frequências

Percentagem

Percentagem acumulada

Média

Desvio Padrão

1

Nenhuma

0,00 - 0,19

3

7%

7%

1,48

0,97

2

Alguma

0,20 - 1,32

19

43%

50%

3

Bastante

1,33 - 1,88

6

14%

64%

4

Plena

1, 89 - 3,00

16

36%

100%

 

Total

 

44

100%

 

Nesta Dimensão é importante destacar que 36% da nossa amostra tem capacidade de realizar o jogo como uma criança normal e a grande maioria joga com dificuldade, 43%.

gráfico circular com as percentagens de descentramento

Gráfico 3 - Representação gráfica da Dimensão “Descentramento”

4.2 Média para a Dimensão “Substituição”

A segunda Dimensão encontrada e tal como defendiam autores como Marchesi & Alonso (1995), entre outros, é a chamada de Substituição, ou seja, é quando a criança é capaz de nomear os bonecos, identifica-los como uma personagem (mamã, bebé, médico..) e fazer com que realizem ações próprias do papel que lhes foi atribuído.

Tabela 4- Média para a Dimensão “Substituição”

Grupo

Capacidade de Jogo simbólico

Pontuações

Frequências

Percentagem

Percentagem acumulada

Média

Desvio Padrão

1

Nenhuma

0,00 - 0,19

23

52%

52%

0,27

0,42

2

Alguma

0,20 - 1,32

18

41%

93%

3

Bastante

1,33 - 1,88

3

7%

100%

4

Plena

1, 89 - 3,00

0

0%

100%

 

Total

 

44

100%

 

Nesta dimensão é de destacar que 52% da nossa amostra não é capaz de realizar a “Substituição” e que 41% sim consegue mas com dificuldade. Nenhuma criança foi capaz de realizar este tipo de atividades como faria uma criança normal.

gráfico circular com as percentagens relativas a substituição

Gráfico 4 - Representação gráfica da Dimensão “Substituição”

A representação gráfica facilita-nos uma melhor observação do que acabamos de dizer, tendo como grande destaque 52% da nossa amostra que não realiza seguido de 41% que realiza com dificuldade.

4.3 Média para a Dimensão “Interação de Ações”

A terceira Dimensão encontrada e tal como defendiam autores como Marchesi, &Alonso, entre outros, é a chamada de “Interação de Ações”. Esta dimensão refere-se à crescente capacidade da criança integrar as suas ações numa sequência.

Tabela 5 - Média para a Dimensão “Interação de Ações”

Grupo

Capacidade de Jogo simbólico

Pontuações

Frequências

Percentagem

Percentagem acumulada

Média

Desvio Padrão

1

Nenhuma

0,00 - 0,19

36

82%

82%

0,23

0,64

2

Alguma

0,20 - 1,32

5

11%

93%

3

Bastante

1,33 - 1,88

1

2%

95%

4

Plena

1, 89 - 3,00

2

5%

100%

 

Total

 

44

100%

 

Podemos dizer que nesta dimensão é relevante a falta de capacidade para a desenvolver, uma vez que só 18% foi capaz de fazer atividades de jogo.

gráfico circular com as percentagens relativas a interação

Gráfico 5- Representação gráfica da Dimensão “Interação de Ações”

A representação gráfica facilita melhor essa visão. Mostrando-nos deste forma, que 19% tem capacidade de realizar jogo simbólico, ou seja, interação de ações.

4.4 Média para a Dimensão “Planificação”

A quarta Dimensão encontrada e tal como defendiam autores como Marchesi, & Alonso entre outros, é a chamada de “Planificação”. Esta dimensão manifesta-se pelos preparativos que a criança faz, ou por emissões linguísticas, antes de realizar do jogo.

Tabela 6 - Média para a Dimensão “Planificação”

Grupo

Capacidade de Jogo simbólico

Pontuações

Frequências

Percentagem

Percentagem acumulada

Média

Desvio Padrão

1

Nenhuma

0,00 - 0,19

40

91%

91%

0,07

0,23

2

Alguma

0,20 - 1,32

4

9%

100%

3

Bastante

1,33 - 1,88

0

0%

100%

4

Plena

1, 89 - 3,00

0

0%

100%

 

Total

 

44

100%

 

Podemos dizer que nesta dimensão, é muito pequena a percentagem de crianças que a consegue realizar. Como podemos ver na nossa análise , só 9% da nossa amostra foi capaz de realizar atividades de jogo simbólico nesta dimensão, mas com dificuldade.

gráfico circular com as percentagens relativas a planificação

Gráfico 6 - Representação gráfica da Dimensão “Planificação”

Com o auxílio do gráfico circular, podemos ver o que acabámos de dizer anteriormente. “Capacidade de jogo simbólico” e “joga como uma criança normal” não teve representatividade da nossa amostra.

5. Conclusões:

Na parte simbólica do nosso questionário encontramos as quatro dimensões mais importantes do jogo simbólico. Dimensões essas que vão aumentando o grau de dificuldade de dimensão para dimensão e aumentando também o grau de dificuldade de item para item dentro de cada dimensão.

Na primeira dimensão “Descentramento”, a criança de forma progressiva vai sendo capaz de realizar ações de jogo. Nesta dimensão, 7% da nossa amostra não conseguiu jogar e 36% jogou como uma criança normal, ou seja, sem qualquer tipo de dificuldade nem de ajuda. 43% jogou com alguma dificuldade, mas jogou. O que podemos afirmar que 93% da nossa amostra demonstrou ter esta capacidade de realizar ações simbólicas, do tipo descentramento.

Na segunda dimensão “Substituição”, 48% da nossa amostra revela capacidade para identificar personagens nos seus bonecos e atribuir-lhes papéis. Embora 52% não tenha conseguido demonstrar capacidade de realizar ações simbólicas do tipo substituição.

Na terceira dimensão “Interação de Ações”, devido já a sua complexidade, (não esquecendo que esta dimensão refere-se à crescente capacidade da criança integrar as suas ações numa sequência), 82% das nossas crianças não conseguiram realizar nenhuma atividade proposta. 18% revelou ter capacidade de realizar ações simbólicas do tipo, “Interação de Ações”. Com “Alguma” dificuldade, 11% conseguiu desenvolver as atividades, 2% conseguiram chegar ao nível “Bastante”, e 5% ao nível “Plena”.

Na quarta dimensão, tal como o nome indica, “Planificação”, são todas as emissões linguísticas, ou não, preparativos que a criança faz antes de realizar o jogo. Da nossa amostra só 9% das crianças explicaram/ prepararam o que iriam fazer antes de iniciar a atividade e com alguma ajuda. Podemos assim dizer que 91% das crianças não tiveram a dimensão “Planificação”.

Como podemos ver na breve análise que fazemos às dimensões do jogo simbólico, cada dimensão é identificada por um determinado grau de desenvolvimento evolutivo e/ou grau de capacidade intelectual. Grau esse, que vai aumentando de dificuldade de forma gradual. É visível, portanto como a percentagem de lograr essa capacidade vai diminuindo de forma extremamente brusca.

Em relação à dimensão de "Descentramento", podemos dizer que uma grande percentagem da nossa amostra realizou as atividades propostas. A referência é de 93% frente a 7% que não conseguiram realizar as atividades relacionadas com esta dimensão. É também interessante observar que os alunos maioritariamente utilizaram a imitação e a ajuda verbal, e que só 11% realizou jogo de miniaturas, enquanto que a ajuda visual PEC`s, não foi utilizada por nenhuma criança.

Na dimensão “Substituição", encontra-se já uma grande diferença em relação a “Descentramento”; 52% das crianças não são capazes de realizar algum tipo de ações desta dimensão. 41% tem “Alguma” capacidade de “Substituição simbólica”, enquanto que o 7% restante teve “bastante” ou plena capacidade. Nesta dimensão nenhuma criança com TEA foi capaz de realizar este tipo de atividades como fazia uma criança normal (todas as atividades realizadas foram com ajuda ou apoios). Destacar também, que a atividade de “Substituição no vazio”, ou seja, realizando o gesto no ar, foi a menos realizada chegando a existir um 89% de não realização e os 11% que a realizaram foi através do apoio de imitação.

Continuando com esta tendência, na dimensão “Interação de Ações”, 82% das crianças não realizou nenhum item, 11% demonstrou ter “Alguma” capacidade simbólica, 2% “Bastante” e curiosamente, 5% jogou como uma criança normal, ou seja, de forma plena. Chamamos a atenção de que precisamente no item das sequências ilógicas de mais de duas ações foi onde estas crianças (7% citado), se destacaram a nível do apoio dado, sendo suficiente que a educadora dissesse o que teriam que fazer (apoio verbal), para que 89 % de forma voluntária jogasse de forma “Plena” voluntária e autonomamente, enquanto que o 11% restante realizou a atividade através do apoio por imitação.

Finalmente na dimensão “Planificação”, 91% não conseguiu realizar nenhum tipo de itens, e só 9% conseguiu realizar algum tipo de atividade, sendo o suporte de ajuda o apoio de “imitação”. Recordamos que esta dimensão requer um grau de exigência cognitivo mais elevado.

Em resumo, podemos dizer que se detecta um crescente grau de dificuldade de uma dimensão a outra e de item a item dentro de cada dimensão, o qual é coerente já que o questionário tem uma importante componente evolutiva, e permite nos detectar onde se encontram as maiores dificuldades da criança. O que nos possibilita programar intervenções adequadas para que a criança consiga alcança-las de acordo com o seu desenvolvimento evolutivo e cognitivo.

As crianças avaliadas em diferentes graus colocam a manifesto que têm capacidades desenvolvidas para levar a cabo alguma ou várias dimensões do jogo. O que nos permite inferir que as crianças com TEA podem desenvolver algumas destrezas e habilidades que permitam ter capacidade para adquirir as diferentes dimensões do jogo simbólico.

A prova elaborada mostrou ter uma percentagem significativa, útil para identificar as dimensões do jogo simbólico na nossa amostra. Ao delimitar estas dimensões como parte de um contínuo, de conteúdos evolutivos e cognitivos, que podem desenvolver-se através de estratégias de ensino-aprendizagem.

Podemos dizer que, com base nos resultados obtidos, a dimensão Descentramento, é facilmente alcançável em alunos com TEA. 93% amostra conseguiu realizar as atividades propostas. Na dimensão Substituição, 48% da nossa amostra conseguiu realizar os itens de jogo, nomeadamente a nomear, identificar as bonecas como personagens, e designar ações. Na dimensão Interação de Ações , a percentagem que alcançou a realizar este tipo de itens, se reduz 18%. E finalmente na dimensão Planificação, só 9% conseguiu realizar atividades deste tipo. Resulta evidente que não é fácil para uma criança com TEA conseguir descrever e planificar toda a ação de jogo antes de começar. Há que ter em conta, além disso, que uma grande percentagem de crianças com autismo tem transtorno a nível da comunicação.

Do conjunto das dimensões detectadas, Inferimos que, sim a criança autista apresenta alguma dimensão do jogo simbólico, e sim partimos da dimensão já conseguida pela criança, teremos um instrumento adequado para fomentar as habilidades sociais. Estamos convencidos de que as diferentes dimensões de jogo simbólico são susceptíveis de desenvolver e portanto que sim são trabalhadas , nossos alunos com TEA poderiam melhorar a sua capacidade de jogar e por consequência melhorar a sua integração e competência social. Ao conhecer as dimensões exatas do jogo em que as crianças com TEA têm mais dificuldades no seu desenvolvimento. A detecção e avaliação destas habilidades e destrezas requeridas, dão-nos informação sobre o nível de desenvolvimento comunicativo e social alcançado pela criança, e portanto, qual tem que ser o ponto de partida para a aplicação de um programa de intervenção.

Em definitivo, este trabalho serviu para identificar as dimensões no jogo simbólico a alunos/as com TEA e para "abrir" uma janela à esperança em relação à ideia de que as crianças com TEA podem ter capacidade para jogar e desenvolver o jogo simbólico. Seguiremos confiando nas potencialidades e capacidades das pessoas com incapacidade e em concreto com as pessoas com TEA, defendendo que qualquer capacidade pode ser despertada, se trabalha e ensina adequadamente!

Referências Bibliográficas:

Baron-Cohen, S. (1987). Autism and Symbolic Play. British Journal of Developmental Psychology, 5, 139-148.

Erikson, H. (1940). Studies in the interpretation of Play: Clinical Observation of Play disruption in young children. Genetic Psychology Monographs, 22, 557-671.

García-Sánchez, J. (1991). Intervención Psicoeducativa y Juego Simbólico: estúdio observacional. I Congresso International de Psicología y Educación: Intervención Psicoeducativa (21-23, p. 115). Madrid: INEF.

García-Sánchez, J. (1992). Imitacion y Juego Simbólico: Evaluacion y Desarrolo. Valência:Promolibro.

García-Sánchez, J. (1992). Autismo. Valencia: Promolivro.

Levy, J. (1978). Play Behavior. N.Y.: Wiley.

Lieberman, N. (1965). The Relationship between Playfulness and Divergent Thinking at the Kindergarten Level. Journal of Genetic Psychology, 107, 219-24

Lieberman, N. (1967). A Developmental Analysis of Playfulness as a Clue to Cognitive Style. Journal of Creative Behavior, 1, 391-97.

Lieberman, N. (1977). Playfulness: its relationship to imagination and creativity. New York: Academic Press.

Lowe, M. (1975). Trends in the development of representational Play in infants from one to three years – na observation study. Journal of Child Psychology and Psychiatry, 16, 33-47.

Lowe, M. y Costello, A. (1976). The Symbolic Play Test. Windsor: NFER – Nelson Publishing Company Ltd.

Marchesi, A.; Alonso, P.; Paniagua, G.; Balmaceda, M. (1995). Desarrollo del Lenguaje y del Juego Simbólico en Ninos Sordos Profundos. Madrid: Ministerio de Educación y Ciencia.

McCune-Nicolich, L. (1981). Toward symbolic functioning: structure of early pretend games and potencial parallels with language. Child Development, 52, 785-797.

McCune-Nicolich, L., Kalmanson, B., Fleck, M. Glazewski, B., Sillari, J. (1990). An interdisciplinary model of infant assessment. In S.J. Meisels e J.P. Shonkoff (Ed.). Handbook of early childhood intervention (pp. 219-245). Cambridge: Cambridge University Press.

Piaget, J. (1961). La Formación del Símbolo en el Niño. México: Fondo de Cultura Economica.

Rogers, S. & Sawyers, K. (1995). Play in the lives of young children. Washington, DC: national Association for the Education of young Children. (Original work published 1988).

Vygostsky, L. (1999). Imaginación y creación en la edad infantil. La Habana: Editorial Pueblo y Educación.

Wallon, H. (1981). A Evolução Psicológica da Criança. Lisboa: Edição 70.

Winnicott, D. (1975). O brincar e a realidade. Rio de Janeiro: IMAGO.

Ungerer, A., Sigman, M. (1981). Symbolic Play and Language Comprehension in Autistic Children. Journal of Child Psychiatry and Journal of the American Academy of Child Psychiatry, 20 (2), 318-337.

Ir para o índice

ARTIGO 7 - A IMPORTÂNCIA DA VOZ NA PESSOA COM SURDEZ

Ana Isabel Martins

Membro do iACT

Citar este artigo: Martins, A. I. (2015). A importância da voz na pessoa com surdez. In C. Mangas, C. Freire & M. Francisco (Orgs.), Inclusão e Acessibilidade em Ação - Diferentes percursos, um rumo. Leiria: iACT/IPLeiria, Artigo 7. [Online, disponível em http://iact.ipleiria.pt/]

Resumo

O presente estudo teve como objetivos explorar o significado e a importância que os indivíduos com surdez, que usam a fala como meio de comunicação, atribuem à Voz, e sensibilizar a comunidade ouvinte para a importância que a Voz pode assumir nesses indivíduos. A amostra do estudo foi constituída por quinze indivíduos surdos com surdez congénita, na sua maioria de grau profundo bilateral, compensada por próteses auditivas ou implante coclear. Dez indivíduos usam a fala como principal meio de comunicação, enquanto cinco usam a língua gestual. As respostas ao questionário utilizado no estudo são concordantes com o facto da perda auditiva não ser impeditiva da perceção de caraterísticas vocais. As respostas indicam que os indivíduos em estudo atribuem caraterísticas e sentimentos positivos à Voz, o que sustenta a importância que ela desempenha nas suas comunicações diárias. Os indivíduos que apresentam uma opinião negativa quanto à sua Voz evocam a diferença existente entre a Voz dos indivíduos com surdez e a Voz dos indivíduos ouvintes. Os resultados alertam para um possível impacto multidimensional que uma Voz alterada pode assumir na população em estudo e, também, para a possibilidade de os indivíduos com surdez constituírem um grupo mais vulnerável ao aparecimento de alterações vocais. Estes resultados justificam a necessidade dos vários profissionais efetuarem uma intervenção precoce e direcionada para a redução das alterações vocais nos indivíduos surdos falantes.

Palavras-Chave: voz, surdez, comunicação, intervenção precoce.

Abstract

The present study aimed to explore the meaning and significance that individuals with deafness, who use speech as a medium of communication, attach to the Voice, and sensitize the community listener to the importance that the Voice can take these individuals. The study sample consisted of fifteen deaf individuals with congenital deafness, mostly with profound bilateral hearing loss, offset by hearing aids. Ten subjects use speech as the primary means of communication, while five use sign language. The answers to the questionnaire used in the study are in agreement with the fact that hearing loss not preclude the perception of vocal characteristics. The study subjects attribute characteristics and positive feelings to the Voice, which supports the importance it plays in their daily communications. The individuals who have a negative opinion about their voice, evoked the difference between the voice of individuals with deafness and the Voice of listeners. The results emphasize the possible impact that a multidimensional changed Voice can take in the study population and also the possibility of individuals with deafness constitute a more vulnerable group for an altered voice. These results justify the need of various professionals to effect an early intervention and targeted for reducing vocal in deaf individuals to communicate by speech.

Keywords: voice, deafness, communications, early intervention

1. Introdução

Os estudos efetuados na área da produção da Voz indicam que a surdez é um de vários quadros clínicos que se carateriza por uma alteração vocal (Wirz, 2001, Behlau, 2005 e Prado, 2007).

De acordo com vários autores, os indivíduos normo-ouvintes tendem a rotular a Voz das pessoas com surdez como diferente. Nestes casos, a alteração das caraterísticas da Voz decorre da incapacidade de os falantes com perda auditiva usarem a sua sensibilidade auditiva para monitorizar a sua produção vocal. Como o feedback auditivo está alterado devido a uma perda de audição, os indivíduos com surdez têm de usar sentidos adicionais - o sentido visual, o táctil e/ou o cinestésico – que não fornecem uma informação tão precisa para o controlo vocal como o sentido da audição (Svirsky et al, 1998, Lejska, 2004, Behlau, 2005 e Prado, 2007).

Apesar da literatura evocar um conjunto de fatores a considerar no grau da alteração vocal dos indivíduos com surdez, como a idade de surgimento da perda auditiva, o uso e a idade de introdução de ajudas auditivas (v.g. prótese auditiva), o grau e o tipo de perda auditiva, a filosofia comunicativa com que se é educado, etc., é possível identificar um conjunto de caraterísticas vocais que estão normalmente presentes nesses indivíduos. Assim, em relação à qualidade vocal, verifica-se a presença de uma Voz tensa, soprosa e/ou áspera. Ao nível da ressonância vocal, a bibliografia indica a presença de uma Voz com hipernasalidade ou uma Voz do tipo cul de sac. Por sua vez, a frequência aguda é bastante referenciada e a intensidade está quase sempre aumentada. Por fim, verifica-se, geralmente, uma produção vocal com padrões rítmicos alterados e padrões de entoação pobres (Rodrigues, 1997, Buosi, 2002, Bommatiro, 2002, Prado, 2007, Behlau, 2005).

2. Objetivo

O presente estudo tem como principal objetivo explorar o significado e a importância que os indivíduos com surdez, que usam a fala como meio de comunicação, atribuem à Voz. Pretende-se ainda, sensibilizar a comunidade ouvinte e a comunidade profissional para a importância que a Voz pode assumir nos indivíduos com surdez que usam a fala como meio de comunicação.

3. Material e métodos

No sentido de obter dados face aos objetivos traçados, procedeu-se à elaboração de um questionário dirigido à população com surdez que usa a fala como meio de comunicação nas suas interações do dia a dia.

O questionário utilizado foi constituído por três partes (consultar anexo), de acordo com diferentes objetivos. Assim, numa primeira parte pretendeu-se obter dados de identificação dos indivíduos em estudo; numa segunda parte, tinha-se como objetivo averiguar a importância que a Voz assume nos indivíduos com surdez; e, por fim, a última parte do questionário tinha o intuito de explorar a opinião sobre uma possível relação entre a melhoria da Voz nos indivíduos com surdez e a área da terapia da fala.

Numa primeira fase, elaborou-se um pré-teste do referido questionário, com vista à sua adequação linguística, por intermédio de alguns profissionais na área da surdez, como um terapeuta da fala e um professor de educação especial. A primeira versão do questionário foi aplicada a três indivíduos com surdez que usavam a fala como meio de comunicação, no sentido de adequar a linguagem escrita e averiguar a pertinência das questões inseridas. Após as alterações necessárias, obteve-se a versão final do instrumento sob duas formas de apresentação: no formato escrito e no formato de vídeo interpretado em língua gestual portuguesa. Neste último caso, para esclarecimento de eventuais dúvidas que pudessem surgir, o preenchimento do questionário ocorreu na presença de um intérprete de língua gestual portuguesa. Assim, de acordo com o seu perfil comunicativo e de domínio linguístico, os indivíduos em estudo poderiam ter acesso às questões do questionário e responder a elas de acordo com as duas formas de comunicação disponíveis.

Para a recolha dos dados foram feitos pedidos de autorização à Associação Portuguesa de Surdos e à Associação de Surdos da Alta Estremadura. A obtenção dos dados foi presencial e decorreu, na maioria dos casos, nessas mesmas Associações, entre os dias 18 de março e 8 de abril de 2013.

4. Amostra

Na seleção da amostra foram usados vários critérios de seleção:

  • apresentar perda auditiva congénita ou adquirida, variável de grau ligeiro a profundo e de estabelecimento estável;
  • não possuir outras condições clínicas acompanhadas de afeção cognitiva;
  • ter idade igual ou superior a 18 anos;
  • utilizar da fala como meio comunicativo nas interações do dia a dia e ser falante da língua portuguesa.

No total, foram aplicados 29 questionários, mas apenas 15 foram validados. A anulação de 14 questionários deveu-se ao facto de terem surgido dúvidas se efetivamente os indivíduos em estudo tinham entendido o conceito de Voz que o questionário utilizado queria explorar. De facto, muitas das respostas dos indivíduos, durante o preenchimento do seu questionário, caraterizavam-se pela vantagem dos indivíduos com surdez dominarem uma língua oral e pela importância de apresentarem uma fala inteligível e bem articulada para se integrarem na comunidade ouvinte.

Face ao exposto, a amostra do presente estudo é constituída por 15 indivíduos com surdez, 11 do sexo feminino e 4 do sexo masculino, na usa maioria, com idades compreendidas entre os 18 e os 45 anos de idade. O nível mínimo de ensino da amostra obtida é o secundário (é o caso de 5 indivíduos), sendo que 6 deles têm já um curso superior e os restantes 4 indivíduos estavam, na altura do estudo, a frequentar um curso superior. 13 dos indivíduos da amostra apresentam uma surdez congénita e apenas 2 uma surdez adquirida pré-locutória. Relativamente ao grau de surdez da amostra, os indivíduos apresentam perdas entre o grau moderado a severo, embora a maioria deles apresente uma surdez profunda bilateral compensada pelo uso de ajudas auditivas. Na realidade, verifica-se que apenas 1 indivíduo não usa qualquer tecnologia de apoio à audição e que, contrariamente, 11 deles usam próteses auditivas nos dois ouvidos. Quanto aos restantes indivíduos, 2 deles usam o implante coclear simultaneamente com a prótese retroauricular no ouvido contralateral e apenas 1 indivíduo usa num dos ouvidos uma prótese retroauricular. Por fim, no que se refere aos meios de comunicação usados nos seus dia a dia, 9 dos indivíduos são bilingues, comunicando através da língua portuguesa (nas formas oral e escrita) e da língua gestual portuguesa, enquanto os restantes apenas usam a língua portuguesa. Porém, relativamente ao meio preferencial de comunicação, 10 indivíduos preferem usar a fala nas suas interações comunicativas e apenas 5 deles preferem usar a língua gestual.

5. Resultados

De acordo com os dados obtidos no instrumento de recolha de dados, mais especificamente na segunda parte do questionário que procurava explorar a importância que a Voz assume na população em estudo, verifica-se, pela tabela I, que os indivíduos com surdez tendem a definir a Voz como algo objetivo resultante de uma ação fisiológica corporal. Pelas respostas dadas, verifica-se também que a Voz é, para eles, uma fonte de comunicação com várias formas de expressão, que permite a distinção entre falantes.

Tabela I – Categorização e respetivo número das respostas da questão “Diga o que é, para si, a VOZ?”

categorização/Nº das Respostas

Exemplos de Respostas

Caraterização Anatomofisiológica e/ou com menção a indicadores de qualidade vocal

9 respostas

 «É o som das cordas vocais»;

 «É o som que é transformado em palavras»;

 «Pode ser grossa que se percebe melhor, a Voz fina não».

Funções comunicativas da Voz

6 respostas

 «É o som que serve para falar»;

 «É uma ferramenta de comunicação que usamos para exprimir ideias e sentimentos».

Formas de expressão vocal

4 respostas

 «O canto usa a Voz»;

 «Quando estou irritada a minha Voz é diferente, como acontece com os gestos que são mais bruscos».

Traço distintivo/de identificação

4 respostas

 «É diferente de pessoa para pessoa»;

 «Eu não penso que as pessoas tenham a Voz igual, mas há Vozes semelhantes»;

 «As Vozes dos surdos são menos bonitas que a dos ouvintes».

A grande maioria dos indivíduos da amostra em estudo considera que a Voz é importante na sua vida. De facto, na questão “Pensa que a VOZ é importante na sua vida?”, apenas 2 não responderam afirmativamente (1 respondeu negativamente e 1 não soube responder). Na justificação das respostas dadas a essa questão, muitos dos sujeitos optaram por expressar as várias funções que a Voz desempenha no seu dia a dia, como por exemplo: comunicar, falar, ouvir os sons e a música, cantar, transmitir ideias e pensamentos, chamar as pessoas, socializar, emitir ruídos, individualizar-me enquanto pessoa, etc.

Face às respostas obtidas nas questões “Gosta da sua VOZ?” e “Pensa que as outras pessoas gostam da sua VOZ?”, considerou-se pertinente comparar as respostas em dois grupos distintos da amostra, separados segundo o seu meio preferencial de comunicação (consultar anteriormente a caraterização da amostra). Assim, no grupo composto pelos 10 indivíduos que preferem usar a fala como meio de comunicação, a maioria (8 indivíduos) afirma gostar da sua Voz; ao invés, no grupo formado pelos 5 indivíduos que preferem usar a língua gestual como meio de comunicação, apenas 1 afirma gostar da sua Voz. As respostas obtidas neste último grupo da amostra foram semelhantes às obtidas na segunda questão mencionada relativa à opinião do próprio sujeito sobre o facto de os outros poderem ou não gostar da sua Voz; contudo, no grupo dos indivíduos que preferem usar a fala para comunicar, as respostas obtidas entre a primeira e a segunda questão já foram bastante diferentes, uma vez que mais de metade dos indivíduos (6 indivíduos) indica não saber se os outros gostam da sua Voz; além disso, nesse mesmo grupo, apenas 3 dos 10 indivíduos deram uma resposta afirmativa à segunda questão.

Relativamente às caraterísticas que os indivíduos com surdez atribuem à sua Voz, foi possível constatar algumas diferenças entre os dois grupos mencionados anteriormente, embora em ambos os grupos as caraterísticas percetivas tivessem sido as mais assinaladas (Voz alta, Voz aguda, Voz grave). Assim, verifica-se no grupo que não usa a fala como meio preferencial de comunicação o assinalar de caraterísticas unicamente depreciativas (v.g. Voz estranha, Voz incómoda, Voz feia) e no outro grupo o assinalar de apenas 2 respostas favoráveis (Voz bonita). Nenhum dos dois grupos indicou que a sua Voz era “agradável”, uma opção de resposta também disponível. Tendo oportunidade de indicar outras caraterísticas além das disponíveis, 1 indivíduo em cada um dos grupos indicou que a sua Voz era diferente da Voz dos ouvintes.

Na terceira e última parte do questionário, que pretendia averiguar a opinião dos indivíduos em estudo sobre a relação entre a Voz e a terapia da fala, observou-se que dos 13 indivíduos que já tiveram terapia da fala, apenas 1 deles referiu que um dos objetivos desse acompanhamento foi o de melhorar a sua Voz. Apesar disso, praticamente todos os indivíduos consideram que a terapia da fala é importante na melhoria dos parâmetros vocais dos indivíduos com surdez.

6. Discussão

As respostas dadas à segunda parte do questionário do estudo revelam que os indivíduos com surdez atribuem caraterísticas e sentimentos positivos à Voz, o que sustenta a importância que ela desempenha nos seus atos de comunicação, quer ao nível da fala, quer ao nível de outras manifestações vocais. As respostas cedidas são também concordantes com a afirmação de que a perda auditiva não é impeditiva da perceção de caraterísticas vocais, já que essas caraterísticas podem ser percebidas por outros meios que não a audição (a visão, o sentido tátil, o sentido cinestésico, etc.) (Svirsky et al, 1998, Lejska, 2004, Behlau, 2005 e Prado, 2007). Estes meios multissensoriais permitem, pois, a esses indivíduos, qualificar a Voz e atribuir-lhe um traço distintivo e único entre falantes. As respostas dadas indicam ainda que atos de performance vocal mais exigentes são vividos pelos indivíduos com surdez e que, nesse sentido, a perda auditiva não constitui uma barreira ao gosto da música ou de outras manifestações vocais, como já comprovado em vários estudos (Gfeller, 1999, Filho et. al, 2003, Laborit, 2003, Martins, 2006). Estas considerações revestem-se de uma maior relevância, ao considerar-se que, no questionário do presente estudo, surgiram respostas como «sonhar» ou «locutor», como sendo palavras que, aos indivíduos inquiridos, fazem lembrar a Voz.

Nas questões relativas à opinião que os indivíduos têm sobre a sua Voz – se gostam ou não da sua Voz e que caraterísticas é que lhe atribuem -, a par com a questão sobre se pensam que os outros gostam ou não da sua Voz, observam-se diferenças no tipo de resposta cedida entre os dois grupos de indivíduos, separados de acordo com o meio preferencial de comunicação. Na verdade, apesar de ambos os grupos apresentarem respostas desfavoráveis nas questões indicadas, o grupo que não usa a fala como meio preferencial de comunicação manifestou um maior número de respostas desfavoráveis. Considerando que todos os sujeitos desse mesmo grupo apresentam uma surdez bilateral de grau profundo, pode equacionar-se a hipótese de o maior número de respostas desfavoráveis se dever ao facto desses mesmos indivíduos apresentarem uma perda auditiva mais elevada, o que, segundo a bibliografia, conduz a alterações mais significativas nos vários parâmetros vocais (Bommarito, 2002, Lejska, 2004 e Prado, 2007). Além disso, pode ainda considerar-se que o facto dos indivíduos desse mesmo grupo não usarem a fala como meio preferencial de comunicação, leva a que apresentem menos interações comunicativas na modalidade oral, o que, por sua vez, contribui para o julgamento de que eles próprios não gostam da sua Voz e de que os outros encaram a sua Voz de uma forma depreciativa. Apesar do exposto, é de assinalar que em ambos os grupos se obtiveram respostas desfavoráveis, especialmente pelo facto dos indivíduos em cada grupo considerarem a sua Voz como diferente da dos indivíduos ouvintes.

No que se refere às últimas questões, todos os indivíduos da amostra que já tiveram acompanhamento em terapia da fala referem que esse mesmo apoio é fundamental na melhoria da produção vocal em casos de perda auditiva. Esta consideração é particularmente importante perante a bibliografia existente que defende que as alterações vocais podem comprometer de modo acentuado o sucesso da comunicação, apesar de a intervenção nessa área parecer ser de menor importância (Rodrigues, 1997 e Behlau, 2005). Neste contexto, vários autores afirmam que, na pessoa com surdez, se não ocorrer intervenção, as alterações vocais modificam-se e acentuam-se com o passar dos anos (Wirz, 2001, Rodrigues, 1997, Behlau, 2005). Além disso, Wirz (2001) acrescenta que os vários tipos de disfonias podem ocorrer nos falantes com surdez com o mesmo grau de incidência com que ocorrem nos falantes normo-ouvintes. Segundo a mesma autora, pode até considerar-se que as disfonias que são causadas por stress emocional ou por mau uso/abuso vocal podem ocorrer mais frequentemente na população com surdez que usa a fala como meio de comunicação, já que, pela falta de feedback auditivo adequado, ocorrem comportamentos de maior uso e abuso vocal (v.g. tensão excessiva de todo o trato vocal e posições e movimentos desadequados) e um maior impacto emocional resultante de uma Voz alterada Wirz, 2001).

7. Conclusão

A Voz é uma ferramenta poderosa na comunicação de qualquer falante, com ou sem perda auditiva.

De acordo com as respostas cedidas no instrumento de recolha de dados usado no presente estudo, torna-se importante refletir, no caso do indivíduo com surdez, sobre o impacto que uma imagem negativa sobre a própria Voz pode assumir e, igualmente, sobre o impacto que uma Voz alterada pode despoletar ao nível psicoemocional, linguístico, profissional e social. Na verdade, se para qualquer indivíduo sem perda auditiva uma alteração da qualidade vocal pode apresentar um impacto tremendo a vários níveis, qual será o impacto de uma alteração vocal na população com surdez que usa a fala como meio de comunicação?

A discussão apresentada no presente artigo indicia, pelo confronto com a bibliografia existente, que a população com surdez é um grupo mais vulnerável ao aparecimento de alterações vocais. Tal suporta a necessidade de haver uma intervenção precoce e específica nessa área, bem como a necessidade de a população com surdez estar consciente dos comportamentos de higiene e saúde vocal.

Referências Bibliográficas

Buosi, M. (2002). A interdependência entre habilidades auditivas e produção vocal. Fono Atual. 20:53-57;

Bommarito, S. (2002). O efeito de um método de terapia de voz na qualidade vocal e na inteligibilidade da fala de indivíduos surdos. Tese de Mestrado. São Paulo, Universidade Federal de São Paulo;

Behlau, M. et al. (2005). Disfonias Congênitas. Voz-O Livro do Especialista. Volume II. Behlau, M. Rio de Janeiro, Revinter;

Filho, A.; Vieira, D.; Parreira, M. & Dias, T. (2001). Musicoterapia e surdez: a Reação dos Surdos aos Instrumentos Musicais. Revista Temas Sobre Desenvolvimento. 54: 28-34;

Gfeller, K. (1999). Music: A Human Phenomenon and Therapeutic Tool. An Introduction to Music Therapy: Theory and Practice. E.U.A., McGraw-Hill Companies;

Labotir, E. (2003). O Grito da Gaivota. Lisboa, Editorial Caminho;

Lejska, M. (2004). Voice Field Measurements – A New Method of Examination: The Influence of Hearing on the Human Voice. Journal of Voice. 2: 209-215;

Martins, A. (2006). O Impacto da música no Adolescente Surdo. Monografia de Conclusão do 1º ciclo da Licenciatura Bietápica em Terapêutica da Fala. Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto, Porto;

Prado, A. (2007). Principais Caraterísticas da Produção Vocal do Deficiente Auditivo. CEFAC. 3: 404-410;

Rodrigues, M. (1997). Aspectos Vocais no Deficiente Auditivo. Monografia de Conclusão do Curso de Especialização em Voz. São Paulo, CEFAC;

Svirsky, M. et al. (1998). The Effect of Auditory Feedback on the Control of Oral-Nasal Balance by Pediatric Cochlear Implant Users. Ear & Hearing. 5: 385-393;

Wirz, S. (2001). A Voz do Surdo. Disfonias: Diagnóstico e Tratamento. Fawcus, M. Rio de Janeiro, Revinter.

Ir para o índice

Parte II

ARTIGO 8 - NOVAS ILUSTRAÇÕES HÁPTICAS EM LIVROS TÁTEIS PARA CRIANÇAS CEGAS

Dannyelle Valente

Universidade Paris 1, Panthéon-Sorbonne/ Comunicação decorrente da Conferência Internacional para a Inclusão - INCLUDiT

Citar este artigo: Valente, D. (2015). Novas ilustrações hápticas em livros táteis para crianças cegas. In C. Mangas, C. Freire & M. Francisco (Orgs.), Inclusão e Acessibilidade em Ação - Diferentes percursos, um rumo. Leiria: iACT/IPLeiria, Artigo 8. [Online, disponível em http://iact.ipleiria.pt/]

Resumo

O livros táteis illustrados são livros associando texto e imagem em relevo destinados a crianças deficientes visuais. No âmbito de uma política de inclusão fortalecida nas últimas duas décadas, estes recursos estão cada vez mais presentes nas escolas, bibliotecas e centros culturais. Uma história que associa texto e imagens desenvolve um papel essencial na aquisição de competências linguísticas e comunicacionais, desperta o prazer da leitura, além de favorecer momentos de troca entre cegos e videntes. Neste artigo, discutiremos os aspectos perceptivos e comunicacionais envolvidos na criação de ilustrações táteis para crianças cegas. Buscaremos destacar as diferenças entre dois modelos ilustrativos específicos: o modelo mais comum “ilustração visual em relevo” e um novo modelo proposto que denominamos “ilustração háptica”. A especificidade do modelo do tipo háptico está no fato de explorar experiências múltiplas de nosso corpo em contato com os objetos e o meio. Através de exemplos, buscaremos destacar de que forma estas ilustrações parecem ser mais apropriadas ao contexto perceptivo das crianças cegas, ao passo que promovem novas práticas inclusivas e novos meios de troca e interação entre cegos e videntes.

Palavras-Chave: Acessibilidade, Deficiência visual, Livros táteis, Design Inclusivo, Ilustrações hápticas.

Abstract

The tactile books are devices that combine Braille text and tactile pictures for blind children. In a context of a inclusion policy rather strengthened in the last two decades, the use of these devices has increased in schools, libraries and cultural centers. A story that combines text and images develops an essential role in the development of linguistic and communicational skills, stimulates the contact book in a playful way and promote moments of exchange between blind and sighted people. In this paper, we will discuss the communicational and perceptual aspects involved in the creation of tactile pictures for blind children. We will analyze more closely two types of illustrations created for the blind: one most common model “raised visual illustrations”, and an alternative model “haptic illustrations”. The specificity of the haptic model that it explores multiple experiences of our body in contact with the objects and the environment. We shall use examples of books to show why this model is most appropriated for blind children and its advantage in terms of inclusion and sharing between blind and sighted.

Keywords: Accessibility, Visual disability, Tactile books, Inclusive design, Haptic illustrations

1. Introdução

Vivemos imersos em um mundo visual onde as imagens estão por toda parte: nas ruas, nas escolas, no cinema, na internet, nas telas dos telefones e nos tablets. Os videntes aprendem a interpretar estas imagens como signos de um mundo visível e ao qual foram familiarizados deste criança. Todos os dias, como explica com clareza Oliver Sacks , « nossos olhos se abrem e se deparam com um mundo que aprendemos a ver durante toda a nossa vida – pois este mundo não nos vem pronto, ele é construído constantemente por meio de experiências, categorizações, memórias e relações » (Sacks, 1999 : 20).

Considerando essa experiência prévia necessária para interpretar as imagens que nos rodeiam, podemos nos questionar de que modo uma pessoa cega pode ler com as mãos uma imagem em relevo nos museus, nos manuais escolares ou nos livros ilustrados. Que significação é atribuída às linhas e formas tocadas? O que é a representação tátil de um rosto ou de uma paisagem para alguém que nunca viu?

Cabe lembrar que as primeiras tentativas de tornar acessível o universo das imagens às pessoas cegas datam do século XIX. Estes recursos eram fabricados por profissionais que trabalhavam nos poucos estabelecimentos de ensino especializados da época, muitas vezes em um único exemplar. Entre as primeiras técnicas utilizadas, constam a estampagem em papel (gaufrage em francês) e o uso de linhas pontilhadas em relevo (Eriksson, 2008). Tratam-se das primeiras tentativas do que hoje chamamos “imagens táteis”. Tempos depois, outras técnicas de produção de relevo foram desenvolvidas e atualmente descobertas revolucionárias como a impressora 3D trazem novas expectativas para este campo.

Hoje, as imagens táteis são utilizadas, sobretudo, em três campos principais: campo artístico e cultural (reproduções táteis em museus), campo pedagógico e escolar (mapas em relevo, esquemas gráficos em biologia, em matemática, entre outros) e, por fim, o campo da literatura infantil (livros ilustrados, álbuns infantis e abecedários). É para este último campo que orientamos nossa atenção neste artigo.

As reflexões aqui apresentadas são fruto de uma parceria entre o grupo de pesquisa Semiótica das Artes e do Design da Universidade Paris 1, Panthéon-Sorbonne e a editora francesa Les Doigts Qui Rêvent (www.ldqr.org), especializada na edição de livros em braille com ilustrações para crianças cegas. Os projetos de pesquisa, iniciados em 2010, buscam avaliar a compreensão das imagens táteis por crianças cegas, questionando-se sobre como tornar estes conteúdos mais acessíveis a este público. Nos últimos anos, busca-se refletir sobre novos métodos de criação e novos modos de ilustrar em respeito aos princípios do Design Inclusivo, também chamado Design for All ou Design Universal. O Design Inclusivo trata-se de uma vertente do design criada nos anos 80 nos Estados Unidos junto aos movimentos pelos direitos das pessoas com deficiência (como o movimento Disabled People’s International, criado em 1981). Na “Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência” (Nações Unidas, 2006), o Design Inclusivo é definido como “o design de produtos, ambientes, programas e serviços a serem utilizados por todas as pessoas, na sua máxima extensão, sem a necessidade de adaptação ou de design especializado”.

Buscando aplicar estes princípios ao campo do livro tátil, a ideia é promover uma nova forma de ilustrar que se afaste dos padrões visuais para explorar outras experiências sensoriais compartilhadas por cegos e videntes. O novo modelo ilustrativo proposto, e cujas bases serão apresentadas a seguir, traz consigo uma necessária tranformação na maneira de pensar a deficiência: não considerá-la somente como uma falta ou uma anomalia, mas, ao invés disso, valorizar suas especificidades, considerando-as como um motor de inovação para todos (Houriez & al., 2013: 25; Pullin, 2009).

Para compreender os fundamentos deste novo modelo de ilustração tátil, cabe primeiramente destacar de que modo ele se difere das práticas mais comuns de adaptação de ilustrações visuais em livros para crianças cegas. Na primeira parte deste artigo, buscaremos destacar as diferenças entre dois tipos de modelo ilustrativo: «ilustração visual em relevo » e « ilustração háptica». Nesta parte, serão também apresentados resultados de pesquisas no campo da psicologia cognitiva e da semiótica acerca das especificidades da percepção tátil e da compreensão do desenho por pessoas cegas. Por fim, serão apresentados exemplos de ilustrações hápticas presentes nos livros da editora Les Doigts Qui Rêvent, buscando destacar a importância destas enquanto veículo de inclusão e de troca de experiências.

2. A problemática de criação de imagens táteis para pessoas cegas

A maior parte das imagens táteis são pensadas por videntes que tentam se colocar no lugar de alguém que não vê, buscando imaginar como os cegos podem “ler” com as mãos. Fechando os olhos e tentando se desprender por um instante de um mundo visual, onde encontram-se arraigados seus hábitos perceptivos e representacionais, eles procuram “fazer de conta”, para ter uma vaga idéia da experiência de mundo de uma pessoa cega.

Para buscar entender melhor o que acontece nesse processo, propomos ao leitor um rápido exercício. Obervando a imagem abaixo do Pequeno Príncipe (figura 1), pedimos que tente responder a seguinte pergunta:

Como tornar esta imagem acessível a uma pessoa cega?

imagem retirada do livro

Figura 1 - Imagem visual do Pequeno Príncipe.

Descrição da imagem: O personagem do Pequeno Príncipe está em pé ao lado direito da imagem. A imagem mostra somente uma pequena parte da superfície do planeta onde ele se encontra. Frente ao personagem, há uma pequena flor. O céu é mostrado em segundo plano onde encontram-se retratados um sol e uma estrela.

Sempre que este exercicio é proposto em conferências e encontros com educatores, profissionais e estudantes, a resposta obtida é bastante semelhante. As pessoas questionadas afirmam que para esta imagem se torne acessivel, é necessario colocá-la em relevo. Como veremos a seguir, esta solução, embora necessária, só resolve uma parte do problema: o problema do acesso ao suporte. Poder ter acesso a algo nem sempre quer dizer acessibilidade. Para ilustrar essa questão, apresentamos na figura abaixo uma simulação do resultado que pode-se obter pela produção do relevo desta imagem do Pequeno Príncipe:

imagem semelhante à anterior

Figura 2 - Imagem tátil do Pequeno Príncipe.

Descrição da imagem: Trata-se de mesma imagem mostrada anteriormente, onde as linhas de contorno dos elementos foram disponilizadas ao tato.

As linhas em preto correspondem as linhas de contorno da imagem reproduzidas em relevo. É incontestável que esta versão tátil do Pequeno Príncipe pode ser efetivamente “lida” com as mãos, sendo a percepção tátil capaz de distinguir a forma, o tamanho e a localização das linhas. Mas será que estas formas e linhas sentidas podem ser identificadas por alguém que nunca viu como representações do personagem Pequeno Príncipe, do sol ou da estrela?

Diferentes pesquisas foram realizadas para tentar entender o que acontece quando uma pessoa cega percebe através do tato um objeto representado no espaço bidimensional. Cabe lembrar que o tato é uma modalidade sensorial que se destaca das outras modalidades pelo fato de possuir uma dupla função sensorial e de motricidade (Heller & Gentaz, 2014; Gentaz, 2009; Hatwell, 2003; Hatwell, Streti & Gentaz, 2000; Lederman & Klatzky, 2000). A psicologia distingue o tato passivo (o contato imóvel da mão sob uma superfície) do tato ativo - igualmente chamado “sentido háptico”. O termo háptico introduzido por Révész em 1950 no campo da psicologia engloba não somente aquilo que sente a pele em contato com uma superfície mas também todas as informações cinestésicas e proprioceptivas do corpo durante o movimento de exploração.

No campo da psicologia, um debate se mantém no que se refere ao tipo de informação que pode ser apreendida pelo sistema háptico e sua diferença com relação à visão. Enquanto alguns trabalhos salientam os aspectos comuns à visão e ao tato (abordagem amodal), outros ficam mais focados nas particularidades de cada sistema sensorial. Como aponta Hatwell (2003), é de ser esperar que cada abordagem pressuponha práticas educacionais distintas e por vezes completamente opostas. Esta questão pode ser observada com clareza nos estudos norteando a compreensão de imagens e desenhos por pessoas cegas. Os estudos que defendem existir correspondências entre a visão e o tato são mais otimistas com relação à capacidade das pessoas cegas em compreender conteúdos bidimensionais. Esta é tese a defendida por Kennedy (2000, 1993), autor dos estudos mais conhecidos sobre o desenho de pessoas cegas. Apostanto em uma abordagem realista e externalista da percepção, Kennedy defende que as pessoas cegas podem explorar tatilmente as bordas e arestas visíveis dos objetos. Segundo o autor, estas linhas identificadas pelo tato são as mesmas encontradas nos desenhos de contorno de objetos tangíveis.

Entretando, resultados de testes experimentais de produção e de identificação de desenho por pessoas cegas, inclusive realizados pelo próprio autor, têm mostrado que estas pessoas tem dificuldades em compreender as regras de representação dos objetos no desenho (Valente, 2012; Vinter & Fernandes, 2010; Millar, 1991). A tese defendida por Kennedy sustentada também por autores como D’Angiulli & Maggi (2003) e Heller (2006) é que esta dificuldade não se deve a uma limitação do tato em si, mas sobretudo a um problema de interpretação. A pouca familiaridade com a representação em duas dimensões abre um grande leque de possibilidades e as pessoas cegas apresentam dificuldades em identificar somente um objeto em particular nas formas exploradas. Em pesquisa de doutorado (2012) realizada no âmbito do projeto pluridisciplinar “Imagem da ponta dos dedos”” (ANR – Agência Nacional de Pesquisa, França) abordamos estas questões sob o ângulo da semiótica e da comunicação. Através da análise de produções gráficas de jovens cegos elaboradas durante o jogo Tactilonary (jogo de desenho tátil, para mais detalhes consultar: Valente & Darras, 2013; Valente, 2012), este estudo mostrou que as pessoas cegas desconhecem os códigos de diferenciação e de categorização dos objetos no desenho. Conclui-se que a capacidade em produzir e compreender desenhos pressupõe possibilidades perceptivas específicas mas também a participação do sujeito nos diferentes processos de aprendizagem e de comunicação gráfica desencadeados na cultura visual.

Outros estudos têm também mostrado que a percepção tátil possui especificidades com relação à visão. Citemos aqui as pesquisas de Lederman & Klatsky (2000, 1990), cujos resultados experimentais mostram que o sistema háptico reconhece mais facilmente um objeto pela sua textura, seu peso ou sua temperatura. Para os autores, as propriedades formais dos objetos configuradas nos conteúdos bidimensionais parecem ter pouca utilidade para as pessoas cegas. Estas diferenças entre o mundo perceptivo visual e mundo perceptivo tátil também são apontadas com clareza nos relatos sobre pessoas cegas que passam a ver após operações (Gregory & Wallace, 1963; Sacks, 1999). Eles relatos mostram as dificuldades dos pacientes em se desprender de seus hábitos perceptivos frente a um mundo estrangeiro de aparências visuais.

A esta altura, já pode-se entender porque a solução de adaptação da imagem do Pequeno Príncipe mostrada acima resolve somente parte do problema. O conteúdo foi disponibilizado ao tato, mas as pessoas deficientes visuais somente poderão compreendê-lo se possuírem as ferrramentas interpretativas necessárias. Esse tipo de adaptação segue uma lógica que podemos representar metaforicamente através da imagem abaixo:

imagem de mão aberta de dedos esticados

Figure 3 - Mão com pequenos olhos na ponta dos dedos.

Imaginar alguém com pequenos olhinhos na ponta dos dedos é algo um tanto quanto inusitado, não é mesmo? Surpreendentemente, imagens visuais transpostas em relevo feitas para pessoas cegas com olhos na ponta dos dedos é o que não faltam hoje em dia em museus e escolas. Tratam-se de simples transposições em relevo do conteúdo visual original, pressupondo assim que o problema está somente na materialidade do suporte e que as pessoas cegas seriam capazes de ler estes desenhos como se elas pudessem “ver” com os mãos. As imagens táteis produzidas hoje seguem uma lógica preconcebida de ocularização do tato, fazendo com que, no fim das contas, nada tenham de tátil (De Almeida, Carijó & Kastrup, 2010).

3. O caso dos livros táteis: ilustrações em relevo e illustrações hápticas

Esta mesma tendência de « ocularização do tato » é observada em ilustrações táteis destinadas às crianças cegas. Dentre as técnicas mais conhecidas de adaptação neste campo, constam a técnica de termoformagem com plástico a partir de moldes, as técnicas de reprodução de linhas de contorno e a técnica de colagem de texturas. Exemplos destas ilustrações são mostrados abaixo:

conjunto de 3 imagens

Figura 4 - Exemplos de ilustrações táteis.

Descrição da imagem: Da esquerda para a direita: 1) Ilustração do livro Kotkäppchen (A história de Chapéuzinho Vermelho), 1990, Grenzelos, Alemanha – técnica de termoformagem em plástico. 2)Ilustração do livro Ernest et Célestine: le Patchwork, 1991, Fellings, Bélgica – Imagem original à esquerda e adaptada em termogravura (linhas de contorno) 3) Ilustração do livro Roi de Misère (Rei de Miséria), 2001; Les Doigts Qui Rêvent, França – técnica de colagem de texturas

Nos três casos, trata-se de um universo visual traduzido em relevo. Nos dois primeiros, a imagem visual de origem é simplesmente duplicada em versão tátil e, no terceiro, as formas são simplesmente « coloridas » com texturas diferentes (De Almeida, Carijó e Kastrup, 2010).

Como alternativa a este tipo de prática, é possivel desenvolver um novo modelo ilustrativo que denominamos « háptico ». O sistema perceptivo háptico, como vimos acima, refere-se às sensações sensoriais e motoras de nosso corpo quando realizamos ações como subir uma escada, nadar ou andar de bicicleta.

No esquema abaixo são apresentadas duas ilustrações de casa. No modelo 1, à esquerda, a casa é representada pelo esquema gráfico visual composto por um quadrado para a parede e um triângulo para o telhado. No caso de uma criança cega que percebe esta ilustração através do tato, duas situações são possíveis: ou essa criança já teve uma experiência prévia com desenhos táteis lhe permitindo interpretar esta imagem como a representação de uma casa (situação ainda rara hoje em dia) ou, sem qualquer experiência, ela não poderá estabelecer uma relação entre as formas tocadas e um objeto percebido. Considerando que esta ilustração da casa faz parte de uma cultura figurativa e de um mundo visível desconhecido, ela só podera interpretá-la através de códigos visuais aprendidos.

No segundo modelo que chamamos «háptico », a casa é representada através da ação pertinente de entrar em casa figurado pelo conceito “porta que abre”. Através de um sistema de interação de abre e fecha acoplado à página do livro e uma maçaneta, a criança pode efetivamente abrir e fechar a porta. Na extremidade direita da porta encontram-se pequenos cortes em forma de pontas que, em contato com a superfície da página, produzem um som específico de porta abrindo. A grande vantagem desse tipo de ilustração está no fato de retratar uma experiência da casa que é a mesma para cegos e videntes. Podemos assim esperar menos diferenças interpretativas nessas duas situações.de leitura.

tabela com 3 imagens inseridas: uma imagem de casa e 2 imagens da mesma porta numa está fechada e noutra uma mão a abri-la.

Figura 5 - Ilustração visual em relevo e ilustração háptica.

Nas últimas décadas, o setor da literatura infantil tem se destacado pela emergência de novas propostas buscando romper com os limites dos livros ilustrados convencionais. Os novos livros « pop-up » ou os livros-jogo convidam o leitor a novas experiências de leitura por meio de narrativas originais e interativas (Boulaire, 2012 ; Fouquier, 2012). Este contexto nos parece bastante propício para a exploração de novas formas de ilustração fundamentadas em experiências hápticas. Temos a convicção que estas novas ilustrações pensadas inicialmente no contexto das crianças cegas tem um potencial de inovação no campo da literatura infantil em geral, uma vez que propõem sistemas de manipulação e surpresas sensoriais ricas para todas as crianças.

4. Exemplos de ilustrações hápticas presentes nos livros da editora Les Doigts Qui Rêvent

A editora Les Doigts Qui Rêvent tem explorado essa proposta de figurar expêriencias hápticas em seus livros. Au pays d’Amandine dine dine (No país de Amandine dine dine), primeiro livro editado em 1994, já buscava explorar novas vertentes ilustrativas baseadas em experiências do corpo. Neste livro, a criança imita passos de ginástica por meio de elásticos e brinca de gangorra no parque. Outras ilustrações do tipo háptico são encontradas também nos livros recentes Wa-Wa (i.e. expressão familiar em francês para designar « banheiro ») e Hiver Magique (Inverno Mágico). No livro Wa-Wa (2012) que trata das primeiras apreensões das crianças pequenas quando deixam de usar a fralda, a criança pode ela mesma puxar a descarga através de um cordão acoplado à pagina (ver figura 6). No livro Hiver magique, editado no mesmo ano, a criança pode « caminhar » na neve pressionando os dedos contra uma textura específica que reproduz de modo bastante fiel o barulho e a sensação dos pés caminhando sobre a neve:

conjunto de 2 imagens

Figura 6 - Ilustrações dos livros Wa-Wa e Hiver Magique.

Descrição da imagem: Em WaWa (à esquerda) a criança puxa a descarga através de um cordão e em Hiver Magique (à direita) ela pode “caminhar” na neve.

O conceito de percurso e de trajetória através diferentes espaços e paisagens é uma nova estratégia explorada nos livros da editora. No novo projeto editorial La chasse à l’ours (Caça ao urso, título original em inglês : We’re going on a bear hunt), os criadores exploram uma experiência original baseada nesta ideia de percurso. Uma primeira adaptação tátil deste livro publicado em inglês em sua versão original foi realizada por Susette Wright da American Printing House for the Blind (APH). Solène Négrerie, ilustradora da editora Les Doigts Qui Rêvent trabalhou em uma segunda versão com a ajuda de dois estudantes da Escola Superior de Arte de Lorraine-Epinal (França). A ideia do projeto é fazer com que a criança se sinta realmente imersa em paisagens diversas como a floresta, o campo e a neve. Para isso, se utilizou um botão que desliza através de um elástico de uma extremidade a outra da página, imitando a trajetória do corpo através diferentes paisagens.

conjunto de 2 imagens

Figura 7 - Ilustrações do livro La Chasse à l’Ours .

Descrição da imagem: Adaptação do livro La Chasse à l’Ours: através de um botão que desliza de uma extremidade a outra da página, nos encontramos imersos em ambientes como a floresta ou a neve.

5. Perspectivas futuras

Os novos projetos de pesquisa e desenvolvimento da editora Les Doigts Qui Rêvent buscam igualmente testar um novo método de criação de ilustrações táteis. Buscando evitar uma estratégia do tipo « projetiva » (um vidente que se coloca no lugar de uma pessoa cega), um novo método de criação participativa está em fase de teste. Tomando como base uma metodologia em Pesquisa-ação e em Design participativo trata-se de desenvolver oficinas de criação de livros ou ferramentas educativas multissensorias contando a com participação de pessoas cegas, professores, designers e artistas.

Um primeiro projeto de criação participativa sobre o tema da história em quadrinhos teve início em novembro de 2013. Foram realizados 6 encontros de experimentação multissensorial sobre o tema da história em quadrinhos com um grupo de 10 adolescentes deficientes visuais. Durante as oficinas, o grupo coordenado pela pesquisadora e a ilustradora da editora Les Doigts Qui Rêvent tinha como meta criar uma mala pedagógica multissensorial sobre o tema da história em quadrinhos para ser futuramente utilizada como recurso de mediação em bibliotecas. A mala está neste momento em fase de teste (mais informações sobre este projeto podem ser consultadas no site : https://accessibibabf.wordpress.com/2014/10/31/un-coffret-multi-sensoriel-sur-la-bande-dessinee-concu-par-et-pour-les-enfants-non-voyants/). Em novembro de 2014, foi iniciado um segundo projeto onde serão realizadas oficinas de criação participativa de um livro com um novo grupo de crianças cegas.

As propostas de um novo modelo ilustrativo e de novas opções metodológicas aplicadas aos projetos da editora Les Doigts Qui Rêvent buscam apontar novos caminhos e possibilidades para as práticas de adaptação no campo do livro tátil. Busca-se ir além de uma mera reprodução de padrões visuais propondo uma nova prática editorial baseada em um princípio de igualdade e de valorização das múltiplas formas de perceber o mundo.

Referências Bibliográficas

Boulaire, C. (2012). Faire bouger les lignes de l’album. La Revue des Livres pour Enfants, 264, 80-89.

De Almeida, M.C; Carijó, F.H., & Kastrup, V. (2009). Abordagem da enação no campo da deficiência visual. Informática na educação: teoria e prática, v.2, n°2, 114-122.

D’Angiulli, A., & Maggi, S. (2003). Development of drawing abilities in a distinct population: depiction of perceptual principles by three children with congenital total blindness. International Journal of Behavioral Development, 27 (3), 193-200.

Eriksson, Y. (2008). Images tactiles : représentations picturales pour les aveugles, 1784-1940, Talant : Les Doigts Qui Rêvent.

Foulquier, F. (2012). L’album, terrain d’aventure. La Revue des Livres pour Enfants, 264, 90-103.

Gentaz, E. (2009). La main, le cerveau et le toucher, Paris: Dunot.

Gregory, R.,Wallace, J. (1963). Recovery from Early Blindness: a case study. Experimental Psychology Society, Monograph n°2, disponível em: www.richardgregory.org, acesso em novembro de 2010.

Hatwell, Y. (2003). Psychologie cognitive de la cécité précoce, Paris : Dunot.

Hatwell, Y. , Streti, A., & Gentaz, E. (2000, Ed.). Toucher pour connaître : psychologie perceptive de la perception tactile manuelle, Paris : Presses Universitaires de France.

Heller, M.A., & Gentaz, E. (2013). Psychology of touch and blindness, New York: Psychology Press.

Heller, M. (2006). Picture Perception and Spatial Cognition in Visually Impaired People In M. Heller, M., & S. Ballesteros, S. (Ed.) Touch and Blindness: psychology and neuroscience (pp.49-71). New Jersey: LEA.

Houriez, S., Houriez,J., Kounakou, K & Leleu-Merviel, S. (2013). Accessibilité dans les musées: de la conception pour les enfants sourds au design for all In : B.Darras & D.Valente (Ed.). MEI 36 Handicap & Communication (pp.25-38). Paris : l’Harmattan, 25-38.

Kennedy, J. (2000). Recognizing outline pictures via touch: alignment theory In: M. Heller (Ed.) Touch, Representation and Blindness (pp.67-98).Oxford: Oxford University Press.

Kennedy, J. (1993). Drawing and the Blind, New Haven: Yale University Press.

Lederman, S. ; Klatzky, R. (2000). L’identification haptique des objets significatifs In: Y Hatwell, A. Streti, & A. Gentaz (Ed.) Toucher pour connaître : psychologie cognitive de la perception tactile manuelle (pp.109-128). Paris : PUF.

Lederman S.J., Klatzky, R., Chataway, C., & Summers, C.D. (1990). Visual mediation and the haptic recognition of two-dimensional pictures of common objects. Perception & Psychophysics, 47 (1), 54-64.

Millar, S. (1991). A reversed lag in the recognition and production of tactual drawings : theorical implications for haptic codind In M. Heller & Schift, W. (Ed.) The psychology of touch, (pp. 301-325). Hillsdale: LEA.

Pullin, G. (2009). Design meets Disability, Camgridge : The Mitt Press.

Révész, G. (1950). Exploring the Word of Touch: Psychology and Art for the Blind, trad. A-H. Wolff, Londres: Longmans.

Sacks, O. (1999). Premier Regard, Paris : Édition du Seuil.

Valente, D. & Darras, B. (2013). Communication graphique et cécité : étude sémiotique pragmatique de la production et l’interprétation de signes figuratifs produits par des jeunes non-voyants In B. Darras et D. Valente (Ed.) MEI 36 Handicap et Communication (pp.77-91). Paris: L’Harmattan.

Valente, D. (2012). Dessin et cécité : étude de la communication graphique des jeunes aveugles, Tese de doutorado em Design e Estudos Culturais, UFR Arts et Sciences de l’Art, Université Paris 1 Panthéon- Sorbonne.

Vinter, A., & Fernandes, V. (2010). Le dessin chez l’enfant malvoyant et chez l’enfant aveugle. Terra Haptica 1, 22-30.

Ir para o índice

ARTIGO 9 - PLURAL&SINGULAR – ÓRGÃO DE COMUNICAÇÃO DEDICADO À TEMÁTICA DA DEFICIÊNCIA

Paula Teixeira e Sofia Pires

Plural & Singular/ Comunicação decorrente da Conferência Internacional para a Inclusão - INCLUDiT

Citar este artigo: Teixeira, P. & Pires, S. (2015). Plural&Singular – Órgão de comunicação dedicado à temática da deficiência. In C. Mangas, C. Freire & M. Francisco (Orgs.), Inclusão e Acessibilidade em Ação - Diferentes percursos, um rumo. Leiria: iACT/IPLeiria, Artigo 9. [Online, disponível em http://iact.ipleiria.pt/]

Resumo

A Plural&Singular é um órgão de comunicação digital dedicado à temática da deficiência que se desdobra em duas vertentes: uma revista trimestral e um site para colmatar a lacuna temporal entre as edições digitais. Arrancou em dezembro de 2012, simbolicamente no dia 3, Dia Internacional das Pessoas com Deficiência. A Plural&Singular está a lançar a sua 9.ª edição da revista digital trimestral, numa altura em que também, assinalando o Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, faz o remate do concurso de fotografia "A inclusão na diversidade". Além de oferecer reportagens da equipa editorial – Catarina de Castro Abreu, Paula Fernandes Teixeira, Rita Machado e Sofia Pires – a revista, bem como as secções de breves, notícias alargadas e opinião do site, contêm rúbricas permanentes de entidades e pessoas ligadas à área da deficiência. A finalidade principal deste projeto é colocar a temática da deficiência na rota da comunicação diária, nacional, lusófona e internacional transpondo as barreiras das diversas deficiências.

Palavras-Chave: Deficiência; Inclusão; Comunicação; Plural&Singular

Abstract

Media dedicated to the topic of disability that unfolds in two ways: a quarterly magazine and a website to bridging the time gap between the digital editions. Plural & Singular started in December 2012, symbolically on day 3, the International Day of Disability. In addition to offering reports of the editorial team - Catarina de Castro Abreu, Paula Fernandes Teixeira, Rita Machado e Sofia Pires - the magazine and the website contains permanent items from entities and persons related to the field of disability. The main purpose of this project is to make sure that these issues are part of the daily, national, Portuguese speaking and international media, overcoming the barriers of different disabilities.

Keywords: Disability; Inclusion; Media; Plural&Singular

1. Introdução: a Plural&Singular

A Plural&Singuar é um órgão de comunicação digital dedicado à temática da deficiência, tendo como público-alvo portadores de deficiência, seus cuidadores, instituições, profissionais, empresas e outras entidades ligadas a esta área. A missão deste projeto passa por dar voz e informar com qualidade e abrangência, tendo também em perspetiva o desenvolvimento sólido e sustentado da publicação.

Tem como visão de médio prazo, transpor as barreiras das diversas deficiências.

Valores: qualidade, rigor, sensibilidade, dedicação, atualidade, interação --> Inclusão!

Os órgãos de comunicação generalistas fazem referência a temas da área da deficiência de forma pontual e na maioria das vezes associados à dicotomia do 'herói' e do 'coitadinho'. A Plural&Singular pretende fazer um acompanhamento regular e contínuo dos temas em causa, sempre de uma forma positiva e natural.

É o primeiro e único órgão de comunicação português de informação especializada que vem colmatar uma lacuna de mercado relativamente a conteúdos jornalísticos relacionados com a temática da deficiência, não existindo qualquer outro meio de comunicação que aborde esta temática.

As pessoas com deficiência de entre toda a discriminação de que são alvo, também padecem da falta de informação sobre os temas da deficiência e da inclusão. A Plural&Singular, além de acabar com a infoexclusão, também se propõe a aproximar mundos e a aproximar-se das pessoas sem deficiência, para que se quebrem preconceitos, contribuindo para a verdadeira inclusão.

Partindo desta convicção a revista digital trimestral da Plural&Singular aborda vários temas, tendo sido preocupação das promotoras do projeto cobrir/divulgar o máximo de temáticas possível através de secções diferenciadas que vão desde a ‘Saúde e Bem-estar’, à ‘Tecnologia e Inovação, passando pelo ‘Desporto’ e pela ‘Cultura’. Além das secções, a revista contém rúbricas nas quais se podem inserir projetos, instituições e/ou personalidades que são dados a conhecer sob a forma de ‘Retrato’ ou ‘Perfil’ ou nos nossos espaços ‘Lugar’ e ‘Plural&Singular’. Isto sem esquecer que cada revista faz naturalmente enfoque especial a um determinado tema ou área através do artigo de capa que cruza e descreve vários pontos de vista e ideias.

2. Suportes

Trata-se de um projeto pioneiro em Portugal que se desdobra em duas vertentes:

1. Revista trimestral disponibilizada através do site para download de PDF e visualização online, tendo sido lançadas já nove revistas digitais, cada uma com mais de cem páginas, nas quais é feita uma “viagem” ao mundo da deficiência através de secções como desporto, cultura, saúde e bem-estar, tecnologia e inovação, entre outras áreas.

2. Site que tem como finalidade manter os princípios de atualidade e de proximidade com os leitores, colmatando a lacuna temporal entre as edições digitais, através da publicação de notícias e de informação útil sobre esta área, desde eventos a concursos, entre outros.

A Plural&Singular tem dois produtos e consequentemente dois públicos-alvo e respetivos mercados potenciais:

  • Conteúdos jornalísticos: os utilizadores/leitores têm acesso gratuito a informação aprofundada e atualizada sobre a temática da revista.
  • Difusão comercial de produtos e serviços: os clientes – empresas e entidades que farão publicidade e publirreportagens, darão apoios e patrocínios – terão um veículo de mediação para chegar aos seus potenciais clientes, leitores da Plural&Singular.
  • Projetos paralelos: Mas além de ser uma publicação de natureza informativa, querendo cumprir a sua função essencial perante a sociedade e sobretudo perante o público-alvo ao qual se direciona, a Plural&Singular também se propõe a desenvolver projetos paralelos (organização de eventos, seminários, workshops) e a oferecer serviços de assessoria de comunicação que estejam relacionadas com a temática em questão.

3. Conteúdos Editoriais

A elaboração de conteúdos jornalísticos dando visibilidade/mediatismo à área da deficiência é o core business da Plural&Singular. Este órgão de comunicação pretende difundir informação e manter os leitores a par das novidades desta área. Partindo do mote oficial da Disabled Peoples International, “Nada sobre nós, sem nós”, foi “recriado” o apelo “Nada sobre vós, sem vós”, sendo este o slogan da Plural&Singular, ao qual as promotoras se atrevem a juntar: “Nada sobre vós, sem vós, dando-vos VOZ”!

O conteúdo da Plural&Singular é produzido a partir de uma rede de comunicação entre as entidades relacionadas com a área da deficiência e a redação da revista.

Além de oferecer reportagens da equipa editorial – Catarina de Castro Abrewu, Paula Fernandes Teixeira, Rita Machado e Sofia Pires – a revista contém rúbricas permanentes de entidades e pessoas ligadas à área da deficiência, tais como: Associação Portuguesa de Deficientes; Sociedade Portuguesa de Sexologia Clínica; Associação Portuguesa de Terapeutas Ocupacionais; Federação Portuguesa de Desporto para Pessoas com Deficiência; Ordem dos Médicos através do Colégio de Medicina Física e de Reabilitação; Federação Nacional de Cooperativas de Solidariedade Social; Grupo de Reflexão Média e Deficiência; Josélia Neves, docente e coordenadora da Unidade de Investigação Inclusão e Acessibilidade em Ação (iACT), no Instituto Politécnico de Leiria; Mafalda Ribeiro jornalista, escritora e cronista e tem a chamada "doença dos ossos de vidro", chama-se Osteogénese Imperfeita; o sociólogo Fernando Fontes, doutorado em Sociologia e Políticas Sociais pela Universidade de Leeds, Reino Unido, mestre em Sociologia pela Universidade de Coimbra (UC), atualmente é pós-doutorando do Centro de Estudos Sociais da UC e do Department of Education and Social Care, University of Northumbria (Newcastle); Carlos Iglésias, licenciado em Direito na Universidade de Lisboa em 1993, é técnico superior da Direção de Serviços de Consultadoria Jurídica e Contencioso na Direcção-Geral dos Impostos, atual Autoridade Tributária e Aduaneira. Foi dirigente associativo, designadamente na ACAPO - Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal.

4. Percurso de dezembro a dezembro, de 2012 a 2014

Dezembro 2012: Lançamento no dia 3, Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, do órgão de comunicação digital Plural&Singular e da 1.ª edição da revista trimestral

Janeiro 2013:A Plural&Singular foi notícia em vários órgãos de comunicação digital, nomeadamente na Agência Lusa, RTP, no P3, na Visão Solidária, no Expresso, Rádio Renascença

Março 2013: Lançamento da 2.ª edição da revista trimestral com o tema de capa “Guimarães Cidade Europeia (Inclusiva) do Desporto” ; Candidatura ao Prémio de Jornalismo Dignitas da Associação Portuguesa de Deficientes (APD)

Abril 2013: A Plural&Singular foi convidada para participar na reunião mensal do Grupo de Reflexão Média e Deficiência; Candidatura ao Prémio de Jornalismo Diversidade Cultural

Maio 2013: A Plural&Singular marcou presença na NORMÉDICA e na AJUTEC (14.ª Feira Internacional de Tecnologias de Apoio para Necessidades Especiais), na Exponor.

Junho 2013: Lançamento da 3.ª edição da revista trimestral com o tema de capa: “Próximo destino: turismo acessível a TODOS”; A Plural&Singular participou, como moderadora, nas Jornadas Técnicas de Agências de Viagens e Operadores Turísticos & Turismo para Todos, promovidas pelo IPCA

Julho 2013: O poster da Plural&Singular que esteve afixado durante a Includit - Conferência Internacional para a Inclusão, que se realizou na Escola Superior de Educação e Ciências Sociais do Instituto Politécnico de Leiria, venceu o prémio “Melhor Poster”. Este foi o evento final e de encerramento do projeto IPL (+) INCLUSIVO, promovido ao longo de todo o ano letivo pela Unidade de Investigação Acessibilidade e Inclusão em Ação (iACT), do IPL.

Agosto 2013: O programa “Consigo” da RTP2 faz referência à Plural6Singular na sua rúbrica “Sabia que…”, alertando os telespetadores para o aparecimento de uma órgão de comunicação online que dá destaque à temática da deficiência.

Setembro 2013: Lançamento da 4.ª edição da revista trimestral com o tema de capa: “O regresso às aulas da Educação Inclusiva”

Outubro 2013: O Instituto Nacional para a Reabilitação, I. P. convidou a Plural&Singular para integrar a secção de Boas Práticas do seu site www.inr.pt; 1000 gostos no facebook

Dezembro 2013: Lançamento da 5.ª edição da revista digital trimestral com o tema de capa: “Emprego é a meta e igualdade a palavra de ordem”; 1.º aniversário deste projeto

Janeiro 2014: Foi convidada para o Programa Sociedade Civil (17 de janeiro de 2014), que é transmitido todos os dias na RTP2, com o tema “O cidadão com deficiência no local de trabalho”; Participação nas Jornadas de Hotelaria e Turismo da Escola de Hotelaria e Turismo do Porto

Maio 2014: Participação no Concurso de Ideias de Empreendedorismo Social 2014; Candidatura ao Programa de Apoio a Empresas Sociais – PAES do BIS - Banco de Inovação Social; Candidatura ao Passaporte para o Empreendedorismo

Junho 2014: Lançamento da 7.ª edição da revista digital trimestral com o tema de capa: “Festivais de música para TODOS os festivaleiros”

Julho 2014: Participação na Includit - Conferência Internacional para a Inclusão, que se realizou na Escola Superior de Educação e Ciências Sociais do Instituto Politécnico de Leiria; Lançamento do concurso de fotografia “A Inclusão na Diversidade” em parceria com o Centro Português de Fotografia; Reunião Universidade do Minho – Protocolo com Ciências da Comunicação

Setembro 2014: Lançamento da 8.ª edição da revista digital trimestral com o tema de capa: “Era uma vez…a sexualidade e os afetos no país das maravilhas”

Dezembro 2014: Lançamento da 9.ª edição da revista digital trimestral com o tema de capa: “Concurso de fotografia – A Inclusão na Diversidade”; Assinalar o aniversário da Plural&Singular e o Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, no dia 3 de dezembro na parte da tarde no Centro Português de Fotografia, no Porto.

5. Projetos paralelos

Projeto sexualidade e afetos: com a preparação do tema de capa sobre a sexualidade e os afetos das pessoas com deficiência, surgiu a ideia de integrar no site da Plural&Singular uma secção inteiramente dedicada a este tema. Durante primeiro trimestre de 2015 será aberta uma área – nome ainda a decidir - dedicada à sexualidade e afetos com informação e dicas sobre a temática sexual de uma forma em geral e, em particular, sobre questões mais direcionadas às pessoas com deficiência que conta com o contributo do movimento informal “Sim, nós fodemos”, de Maria d’Alte Fontes, uma jovem recém licenciada em Psicologia e do sexólogo Jorge Cardoso que será responsável pelo esclarecimento de dúvidas através de um email criado para o efeito. A Plural&Singular pretende estabelecer outras parcerias para alimentar a secção com conteúdos sobre esta temática, nomeadamente com a Sociedade Portuguesa de Sexologia Clínica e a APF - Associação para o Planeamento da Família, um curso de Belas Artes ou Design de Comunicação para a ilustração da secção e outras ainda a definir.

Infoacessibilidade ao site: A Plural&Singular celebrou um protocolo com o Departamento de Informática da Universidade do Minho com o objetivo de assegurar uma adequada implementação da cooperação no domínio de acessibilidade web, informática e comunicacional do site da Plural&Singular levando ao cumprimento das diretrizes e técnicas WCAG (Web Content Accessibility Guidelines). Este protocolo já celebrado também conta com a participação do Gabinete para a Inclusão da UM. Por sua vez, a Plural&Singular pretende promover ações de sensibilização e formação junto da comunidade académica relativamente a esta questão.

Cobertura jornalística nacional e sensibilização aos futuros jornalistas: A Plural&Singular prepara-se para celebrar um protocolo com o Departamento de Ciências da Comunicação da Universidade do Minho para a cooperação na área da comunicação e do jornalismo. Por um lado, serão integrados trabalhos ligados à área da deficiência nas unidades curriculares que se considerem adequadas para o desenvolvimento de projetos jornalísticos e de investigação em Comunicação e, por outro, os alunos serão orientados em relação aos trabalhos jornalísticos a elaborar e, posteriormente, publicar na revista trimestral ou no site da Plural&Singular. Este protocolo deverá ser estendido a outras universidade e politécnicos que tenham a licenciatura em Ciências da Comunicação, para que os futuros jornalistas tenham um contacto enquanto estudantes com o mercado de trabalho e que, depois, enquanto profissionais estejam mais sensíveis a esta temática que tanto precisa de visibilidade.

Parceria institucional: a Plural&Singular, dentro em breve, pretende celebrar um protocolo de cooperação com a mpt®, uma empresa de planeamento e gestão da mobilidade que promove a investigação do design inclusivo para tornar os territórios acessíveis no edificado, no espaço público, nos transportes, na comunicação e na infoacessibilidade, executando todos os trabalhos com o objetivo de desenhar cidades e vilas com mobilidade para Todos. Paula Teles – Professora Universitária, Presidente do instituto de Cidades e Vilas com Mobilidade, Engenheira Civil e Mestre em Planeamento Urbano e Gestão da Mobilidade Urbana Inclusiva – é a responsável por esta empresa que trabalha para o Governo, autarquias, entidades públicas e empresas. O protocolo a celebrar pretende facilitar o acesso da Plural&Singular a conteúdos relacionados com a área de atuação da empresa que fará, em diversas ocasiões, a ponte entre a Plural&Singular e os respetivos cliente e leitores.

Mediapartners e assessoria: queremos constituir uma rede de parceiros composta pelas instituições representativas das pessoas com deficiência para alimentar os conteúdos da revista e desenvolver outro tipo de projetos. Também o trabalho de assessoria (publirreportagens e coberturas de eventos e divulgação de projetos e outras novidades, envio de newsletters, etc) é um serviço que a Plural&Singular pretende explorar, mesmo que seja à margem da publicação trimestral e do site, porque se entende que há espaço para explorar esta via que contribuirá para a exequibilidade do projeto no seu todo. O trabalho realizado para a PCAND - Paralisia Cerebral - Associação Nacional de Desporto, na cobertura do Campeonato da Europa de Futebol de 7 Maia 2014 de 20 de julho a 3 de agosto, foi o “teste-piloto” deste serviço. A Plural&Singular ficou responsável pela elaboração da newsletter diária do evento a dar conta de todas as novidades da competição e a fazer um acompanhamento próximo da prestação da seleção portuguesa que acabou em 7.º lugar e conseguiu garantir a participação no Mundial de 2015. Foram enviadas 12 newsletters com cerca de 24 artigos e outras informações do campeonato.

Concurso de fotografia: para assinalar o aniversário da Plural&Singular e o Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, ambos comemorados a 3 de dezembro de 2014, este órgão de comunicação, em parceria com o Centro Português de Fotografia, promoveu um concurso de fotografia intitulado "A Inclusão na Diversidade" para captar através de uma imagem o verdadeiro sentido de inclusão ou que denuncie a falta dela. A entrega de trabalhos decorreu entre os dias 28 de julho e 30 de setembro e os vencedores do concurso são anunciados publicamente com o lançamento da 9.ª edição da Plural&Singular durante a manhã do dia 3 de dezembro de 2014 e numa cerimónia a realizar na parte da tarde no Centro Português de Fotografia, no Porto.

6. Objetivos futuros

A finalidade principal deste projeto é colocar a temática da deficiência na rota da comunicação diária, nacional, lusófona e internacional.

A Plural&Singular é um órgão de comunicação digital, por isso, está acessível online para o mundo inteiro. Mas depois de explorar e fidelizar o mercado português, a Plural&Singular pretende chegar aos países lusófonos onde também existe uma lacuna de informação jornalística sobre esta área.

Também está em aberto a hipótese de criar revistas temáticas dentro da revista mais generalista da Plural&Singular que aborda temas da Saúde e Bem-Estar, Tecnologia e Inovação, Desporto e Cultura, mas acima de tudo, o que se pretende é diminuir a periodicidade da revista e torná-la mensal.

A Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) – Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe, Timor-Leste em termos de área do globo terrestre ocupada é muito vasta - 7,2 por cento da terra do planeta (148 939 063 km2), espalhadas por quatro Continentes – Europa, América, África, Ásia.

A Internet torna estes nove Estados-membros da CPLP muito mais próximos do que estão na realidade, mas ainda assim é muito difícil explorar estes mercados que em termos de políticas para a deficiência estão pouco desenvolvidos, à imagem do respetivo desenvolvimento económico geral. Também é preciso salientar que, nestes casos, o acesso à internet é muito restrito e, por isso, é necessário arranjar outros meios para chegar ao mercado potencial da Plural&Singular.

Ir para o índice

ARTIGO 10 - A ATITUDE DOS PROFESSORES EM RELAÇÃO À INCLUSÃO DE ALUNOS COM DEFICIÊNCIA VISUAL NA ESCOLA E NA SALA DE AULA

Luís Ferreira

Membro do iACT/ Comunicação decorrente da Conferência Internacional para a Inclusão - INCLUDiT

Citar este artigo: Ferreira, L. (2015). A atitude dos professores em relação à inclusão de alunos com deficiência visual na escola e na sala de aula. In C. Mangas, C. Freire & M. Francisco (Orgs.), Inclusão e Acessibilidade em Ação - Diferentes percursos, um rumo. Leiria: iACT/IPLeiria, Artigo 10. [Online, disponível em http://iact.ipleiria.pt/]

Resumo

A escola inclusiva é aquela em que todos os alunos têm o direito de a frequentar em situação de equidade. Este estudo exploratório pretendeu analisar as atitudes dos professores relativamente à inclusão de alunos com deficiência visual na sala de aula, a aquisição das suas competências sociais e académicas e a atitude em relação às competências do professor. Foi aplicado um questionário, construído para o efeito, a 114 professores dos 2.º e 3.º Ciclos do Ensino Básico e do Secundário: 72 participantes lecionavam em escolas de referência e 42 davam aulas em escolas de não referência. 39.5% dos professores foram favoráveis à inclusão permanente do aluno com DV na sala de aula, 71.9% optou pela inclusão em algumas aulas, tendo as restantes na sala de educação especial. Dos participantes 73.7% demonstraram ter atitudes positivas em relação à aquisição das competências sociais do aluno comdeficiência visual, 33.7% consideraram igualmente importantes as competências do professor, 29.9% concordaram com as competências académicas. Lecionar ou não numa escola de referência para alunos com DV parece ter influenciado as respostas em relação às competências sociais e às competências do professor, tal como o nível de ensino e o tempo de serviço dos docentes.

Palavras-Chave: Deficiência visual, inclusão, atitudes, professores, alunos, escolas de referência, educação especial, ensino regular, turmas, sala de aula

Abstract

The inclusive school is one in which all students have the right to attend classes in a situation of equal opportunities. This exploratory study aims to analyse teachers’ attitudes towards the inclusion of students with visual impairment in the classroom; to address students’ social and academic competencies in view of those had by the teacher. A specially devised questionnaire was passed to 114 teachers, working at primary and secondary levels. 72 participants were based in schools of reference and 42 in non-reference schools. 39.5% are in favour of the permanent inclusion of students with visual impairment in all classes, 71.9% think they should be included only in some classes, whilst attending the other classes within the context of special education. 73.7% of the participants showed positive attitudes towards the visually impaired students’ acquisition of social competencies, 33.7% considered the teachers’ competencies to be equally important, and 29.9% agreed to the academic competencies. The answers on the relationship between social competencies and the teachers’ competencies appear to have been influenced by whether the teachers belonged to a school of reference or not, as well as by the school level and by the teachers’ teaching experience.

Keywords: Visual Impairment, inclusion, attitudes, teachers, students, reference schools, special education, regular education, classes, classroom

1. Introdução

1.1. A deficiência visual

Segundo a Organizaçção Mundial de Saúde (OMS) em 2001 na classificação internacional da funcionalidade (CIF) existe uma deficiência sempre que se conjugam uma perda ou desvio numa estrutura do corpo (no caso da deficiência visual (DV) são consideradas as estruturas que fazem parte do olho, os músculos intrínsecos e extrínsecos do olho, o trato ótico e as áreas corticais da visão); numa das funções visuais: acuidade visual, campo visual, controlo oculomotor, motilidade ocular, acomodação e sensibilidade à luz, à cor e ao contraste; fatores ambientais e fatores pessoais. Estes fatores podem ser considerados barreiras ou facilitadores das atividades e das formas de participação do indivíduo na sociedade (OMS, 2001).

Os fatores ambientais dizem respeito ao meio físico, relações com os membros da comunidade, atitudes, aos serviços e as políticas estabelecidas (OMS, 2001). Segundo a mesma organização, os fatores pessoais referem-se ao indivíduo: idade, nível social, nível de escolaridade, e as suas experiências ao longo da vida.

A tabela 1 define as duas categorias de baixa visão e as três de cegueira incluídas na DV pela OMS (2010)

Tabela 1 – Classificação dos níveis de DV segundo OMS (2010)

Categorias de DV

Acuidade visual com correção

Máximo (inferior a)

Mínimo (igual ou melhor)

Baixa Visão Moderada

3/10 (0.3)

1/10 (0,1)

Baixa Visão Grave

1/10 (0,1)

1/20 (0,05)

Cegueira

1/20 (0,05)

1/50 (0,02)

Cegueira

1/50 (0,02) consegue contar dedos a 1 metro

Com perceção luminosa

Cegueira

Sem perceção luminosa

Sem perceção luminosa

Apesar desta classificação da OMS, em Portugal, a cegueira legal continua a ser definida pelo decreto-lei n.º49331 de 1969. De acordo com o n.º 2 do referido decreto-lei a pessoa é considerada cega se tiver ausência total de visão ou que tenha situações irrecuperáveis na qual a acuidade visual no melhor olho e com correção seja inferior a 1/10 (0.1) ou tenha acuidade visual superior a 1/10 (0.1) mas um campo visual igual ou inferior a 20º.

1.2. Conceito de inclusão

Em termos genéricos a educação inclusiva é aquela em que todas as crianças e jovens, independentemente do género, nacionalidade, cultura, etnia, comunidade linguística, religião, situação económica, deficiência, dificuldades de aprendizagem e sobredotação têm direito a frequentar a escola regular da sua localidade em equidade com os restantes alunos (Unesco 1994); (Ainscow, 2003).

Em Portugal o decreto-lei n.º 3/2008 veio definir os apoios especializados a prestar em todos os níveis de ensino não superior dos setores público, privado e cooperativo aos alunos com necessidades educativas especiais (NEE) de caráter permanente, de forma a tornar a escola inclusiva capaz de acolher e manter na comunidade educativa estes alunos. O n.º 2 do artigo 1.º define como funções da educação especial (EE) tornar a escola inclusiva no ponto de vista social e académico, proporcionar ao aluno autonomia, estabilidade emocional, a promoção da igualdade de oportunidades entre todos os alunos e a preparação para o prosseguimento de estudos ou para a vida ativa.

Os agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas de referência para os alunos com DV concentram os alunos cegos e com baixa visão de um ou vários concelhos, tendo em conta a sua localização e a rede de transportes existente, tal como o definido no art.º 24 do referido Decreto-Lei.

2. Os estudos sobre a atitude dos professores em relação à inclusão de alunos com DV

Os investigadores Wungu e Seonghee (2011) efetuaram um estudo em Dki-Jakarta na Indonésia com professores dos Ensinos Primário, Secundário Júnior e Secundário Sénior a fim de determinarem as atitudes dos docentes face à inclusão de alunos com DV na escola e aos aspetos social e académico dos alunos com DV e da competência dos professores de alunos com DV. Neste estudo, foi utilizado um questionário subdividido em demografia dos participantes e atitudes face à inclusão nos aspetos sociais e académicos dos alunos com DV e da competência dos professores de alunos com DV. Os resultados indicaram que 51,21% dos docentes tinham atitudes negativas face à inclusão de alunos com DV na sala de aula e apenas 43% tinham atitudes positivas relativamente à inclusão de alunos com DV. Em relação aos aspetos sociais da inclusão de alunos com DV, este estudo permitiu concluir que (76.80%) tinham atitudes positivas; no aspeto académico as atitudes da maioria dos professores (73.44%) eram positivas. No aspeto das competências dos professores, 48.8%, mostraram que os professores tinham competências para dar aulas a alunos com DV. As atitudes face à inclusão variaram consoante o nível de ensino, sendo os docentes do Ensino Primário e do Ensino Secundário Sénior mais desfavoráveis à inclusão dos alunos com DV do que os professores do Ensino Secundário Júnior, os quais tinham atitudes mais positivas. Neste estudo, os professores apontaram ainda diversas razões que poderão estar na origem das suas atitudes negativas face à inclusão de alunos com DV: estes alunos precisavam de diversas adaptações como livros em braille e infraestruturas adaptadas, que muitas vezes não existiam nas escolas; muitos referiram a falta de formação em educação inclusiva; um número significativo mencionou as turmas demasiado grandes com trinta ou mesmo quarenta alunos, o que é incompatível com a presença de alunos com DV que têm de aprender de um modo diferente, devido à ausência de visão.

Num estudo realizado na província de Manitoba Canadá, Wall (2002) analisou a atitude dos professores em relação à inclusão de estudantes com DV, distinguindo estes entre cegos ou com baixa visão (BV). Wall dividiu os professores em três grupos: no primeiro grupo os alunos que tinham tido alunos com DV no ano anterior; o segundo grupo era constituído por docentes que tinham tido um contato mínimo com alunos com DV e um terceiro grupo em que participaram docentes que nunca tinham tido alunos com DV. Os professores que tinham tido experiência direta ou indireta com alunos com DV mostraram uma atitude mais positiva em relação à sua inclusão na sala de aula regular, no entanto nos três grupos, os professores mostraram ser mais favoráveis à inclusão de alunos com BV do que em relação a alunos cegos. As atitudes dos docentes diferiram nos três grupos quanto ao facto de os alunos serem cegos ou terem BV. Assim, 50% dos docentes com experiência no ano anterior consideraram que alunos com BV melhoravam as suas habilidades e interação ao estarem incluídos na sala de aula, mas esse valor desceu para 37.50% em relação a alunos cegos; a mesma relação ocorreu quando os professores tiveram um contato mínimo com alunos com DV, 52.50% defendiam que os alunos com BV beneficiavam na sua interação e habilidades, mas esse número baixou para 42.11% quando se tratava de alunos cegos; finalmente, os professores que nunca tinham tido contato com alunos com DV 35.85% consideraram ser positivo para a interação e desenvolvimento das habilidades dos alunos com BV, mas só 28.30% deste grupo tiveram igual opinião em relação a estudantes cegos. Este estudo apresentou algumas oscilações em relação à avaliação dos materiais, recursos, espaço e turmas pequenas. A adaptação do currículo, a modificação da exposição das aulas era 33.33% dos professores do primeiro grupo benéfico que se fizesse para estudantes com BV e 29.17% também defendia que se deveria fazer para alunos cegos; no segundo grupo, as opiniões positivas foram 26.32% para alunos com BV e 36.84% consideraram que se deveria ter essa atitude em relação a alunos cegos; no terceiro grupo 15.09% foi da opinião que se deveria fazer para alunos com BV e 18.87% consideraram ser pertinente para alunos cegos.

Em Espanha, Simón, Echeita, Sandoval & López (2010) efetuaram um estudo com cinquenta e seis participantes. A atitude dos docentes foi mais negativa nos professores do Ensino Secundário (Simón et al., 2010). Segundo estes autores, os professores referiram ainda a falta de informação sobre as NEE dos seus alunos com DV e algumas dificuldades na inclusão dos alunos com DV em disciplinas como Educação Física e Educação Tecnológica.

Na Irlanda do Norte, os alunos com DV têm sido muitas vezes desencorajados a estudar determinadas disciplinas como Matemática, Desenho, Educação Física e Educação tecnológica, geralmente por falta de livros, materiais adequados e por razões de saúde e de segurança (Gray, 2009). A maioria dos participantes neste estudo não tinha qualquer formação em DV. Muitos docentes consideraram importante a inclusão de alunos com DV na escola, porque eles poderiam aproveitar os aspetos da socialização.

3. Método

O objetivo deste estudo foi analisar as opiniões dos docentes do ensino regular em relação à inclusão dos alunos com DV na escola e na sala de aula. Este objetivo suscitou uma questão: qual a atitude dos professores em relação à inclusão de alunos com DV na escola e na sala de aula?

Na recolha de dados foi utilizado um inquérito por questionário, constituído por catorze questões divididas em quatro grupos: identificação dos participantes, questões 1 a 9; atitude face à inclusão do aluno na escola e o papel desta relativo à inclusão, questões 10 e 11; vinte e três afirmações para verificar o grau de concordância, segundo uma escala de Likert, em relação a competências sociais e académicas do aluno com DV e as competências dos professores do ensino regular de alunos com DV; e resposta aberta relativa a facilitadores/barreiras à inclusão de alunos com DV, questões treze e catorze.

Neste estudo exploratório foi utilizado o método quantitativo com recurso ao software SPSS 19,0 para o tratamento das variáveis resultantes das doze primeiras questões e o método qualitativo para as duas questões abertas, sobre as quais foram criadas categorias que depois foram tratadas estatisticamente também. Foi feita estatística descritiva (frequências absolutas e frequências relativas e medidas de tendência central e de dispersão) e estatística inferencial(com os testes não paramétricos: Teste de independência do Qui-quadrado, por vezes com correcção de continuidade de Yates, teste de Mann-Whitney e teste de correlação de Spearman) com um intervalo de confiança de 95,0%.

Nas questões relativas à identificação as variáveis são nominais, exceto a idade, anos de serviço e alunos com DV que o docente teve que são quantitativas. As vinte e três afirmações da questão doze são ordinais e as questões treze e catorze originaram variáveis nominais.

O estudo foi realizado durante o primeiro semestre de 2012, e envolveu cinco escolas dos ensinos Básico e Secundário, três de referência para a DV e duas de não referência, da Região Centro de Portugal. Foram obtidos centro e catorze questionários válidos, setenta e dois nas escolas de referência e quarenta e dois nas escolas de não referência.

4. Resultados

Dos 114 participantes, 75,4% eram do género feminino e 24,6% do género masculino. A média de idades era de 46,82 e tinham 22,14 anos de serviço docente. 81,6% dos participantes tinham como grau académico uma licenciatura pré-Bolonha. 27,2% lecionavam ao 2.º Ciclo, 54,4% lecionavam ao 3.º Ciclo e 49,1% lecionavam ao ensino Secundário. A maioria, 57,0% dos docentes já tinham tido ou tinham naquele ano lectivo alunos com DV.

4.1. Inclusão dos alunos com DV na escola e na sala de aula

Segundo a tabela 2, 44.4% dos docentes das escolas de referência e 31,0% dos docentes das escolas de não referência eram favoráveis à inclusão do aluno com DV na escola e em todas as aulas com a restante turma.

Tabela 2 – Frequências relativas e absolutas da opinião dos docentes sobre as diversas formas de inclusão e a pro-atividade da escola em relação à inclusão dos alunos com DV (N = 114)

 

Escolas de Referência

Escola de não Referência

Total

10.1 - Estar em permanência na sala

32

44.4%

13

31%

45

39.5%

10.2 - Estar em sala regular e EE

54

75%

29

69%

82

71.9%

10.3 - Todas as aulas em sala EE

2

2.8%

2

4.8%

4

3.5%

10.4 - Escola especial para alunos com DV

4

5.6%

6

14.3%

10

8.8%

11 - Escola tem atitude pró-ativa face à DV

59

81.9%

32

76.2%

91

79.8%

Total

72

63.2%

42

36.8%

114

100%

Quanto à possibilidade dos alunos terem, conforme as disciplinas, umas aulas com a turma e as restantes na sala de Educação Especial (EE) 75% dos professores das escolas de referência e 69% dos participantes das escolas de não referência, disseram que esta seria mais benéfico para um aluno com DV.

81,9% dos docentes das escolas de referência e 76,2% dos participantes das escolas de não referência eram da opinião que a escola se empenha para eliminar ou reduzir a discriminação dos alunos com DV.

Os docentes com opinião favorável à inclusão do aluno com DV na escola e em todas as aulas com a turma verificou-se sobretudo entre os docentes que lecionam ao 2.º Ciclo do Ensino Básico, facto comprovado pelo teste do Qui-quadrado com a correção de Yates (X2 = 4.161, p = .041 e N = 31), pelos professores que lecionavam ao ensino Secundário, teste do Qui-quadrado (X2 = 12.966, p = .000 e N = 56) e pelo número de anos que os docentes possuem de experiência no ensino, teste de Mann-Whitney (U = 1183.000, Z = -2.144, p = .032 e N = 114). A resposta à hipótese de o aluno estar na escola, mas ir apenas a algumas aulas, consoante as disciplinas, foi influenciado pelo nível de ensino a que lecionavam os docentes – ensino Secundário, teste do qui-quadrado (X2 = 12.130, p = .000 e N = 56).

4.2. Atitudes dos docentes relativamente às competências sociais dos alunos com DV.

De acordo com os dados da tabela 3, pode verificar-se que a atitude dos docentes em relação às diversas afirmações é positiva. O somatório das respostas das atitudes positivas das competências sociais dos alunos com DV, tem uma média de 4.26, mediana de 4.40, moda = 4.6/8, desvio padrão de 0.560. Apenas 7% têm uma atitude totalmente positiva, 66.7% têm uma atitude parcialmente positiva, logo 73% têm atitudes positivas em relação às competências sociais.

Tabela 3 – Medidas descritivas de tendência central e de dispersão, frequências absolutas e relativas das atitudes em relação à socialização do aluno

12.1

12.2

12.3

12.4

12.5

12.6

12.7

12.8

Total – Somatório das respostas de socialização do aluno - Atitudes Positivas

O aluno com DV tem o direito de estar na escola inclusiva e na sala de aula com a restante turma.

A inclusão do aluno com DV na sala de aula promove a igualdade entre todos os alunos

A autoestima do aluno com DV pode melhorar se ele estiver na sala de aula com a restante turma

O aluno com DV é ridicularizado ou marginalizado, na sala de aula, pelos restantes colegas

A inclusão do aluno com DV na escola e nas aulas regulares aumenta o seu círculo de amigos

Os alunos com visão sentem-se felizes ao conviverem com alunos com DV

A inclusão de alunos com DV nas aulas regulares irá aumentar a sua rejeição

A inclusão do aluno com DV nas aulas permite que as crianças sem DV o reconheçam como um dos seus pares

N

Válidos

112

112

113

112

112

108

112

113

114

n/a

2

2

1

2

2

6

2

1

0

Média

4.61

4.53

4.49

1.94

4.39

3.55

1.65

4.45

4.26

Mediana

5.00

5.00

5.00

2.00

5.00

4.00

1.00

5.00

4.40

Moda

5

5

5

1

5

3

1

5

4.6/8

Desvio Padrão

.689

.710

.709

1.117

.884

.911

.946

.732

.560

Respostas

 

Discordo totalmente

1

.9%

0

0%

1

.9%

55

49.1%

2

1.8%

3

2.8%

67

59.8%

2

1.8%

1

.9%

Discordo parcialmente

2

1.8%

4

3.5%

0

0%

26

23.2%

3

2.7%

6

5.6%

26

23.2%

0

0%

1

.9%

Nem concordo, nem discordo

1

.9%

2

1.8%

8

7.1%

15

13.2%

9

8%

44

40.7%

10

8.9%

4

3.5%

28

25%

Concordo parcialmente

32

28.6%

37

33%

38

33.6%

15

13.4%

33

29.5%

39

36.1%

9

8%

46

40.7%

76

66.7%

Concordo totalmente

76

67.9%

69

61.6%

66

58.4%

1

0.9%

65

57%

16

14.8%

0

%

61

54%

8

7%

A idade e o tempo de serviço estão directamente relacionadas com as atitudes dos docentes em relação às competências sociais já que existe uma relação entre estes factores e cinco das oito afirmações. Lecionar ao ensino Secundário influenciou quatro das oito afirmações desta categoria e o estar a lecionar ao 2.º Ciclo do Ensino Básico e o lecionar ou não numa escola de referência influenciaram as respostas de três das oito afirmações. 5%).

4.3. Competências académicas dos alunos com DV

A tabela 4 apresenta os dados relativos às competências académicas dos alunos com DV. O somatório das respostas das atitudes positivas tem uma média de 3.59, uma mediana e uma moda de 3.6 e um desvio padrão igual a 0.611 com um N de 114. Apenas 0.9% dos docentes concordaram totalmente com estas competências e 29% concordaram parcialmente e 58% tiveram uma opinião neutra.

Tabela 4 – Medidas descritivas de tendência central e de dispersão, frequências absolutas e relativas das atitudes em relação às competências académicas dos alunos com DV.

 

12.9

12.10

12.11

12.12

12.13

Total – Somatório das respostas de competências académicas do aluno - Atitudes Positivas

O aluno com DV deve ser encorajado a participar nas aulas

A criança com DV tem mais dificuldades em aprender se estiver numa sala de aula regular

O aluno com DV precisa de instruções específicas nas aulas para aprender e desempenhar as tarefas que lhe são pedidas: os restantes alunos poderão ser beneficiados

O aluno com DV, na sala de aula, adquire confiança nas suas atividades académicas

O tempo para ensinar os restantes alunos da turma é prejudicado por causa do tempo despendido para ensinar o aluno com DV

 N

Válidos

112

112

110

110

113

114

n/a

2

2

4

4

1

0

Média

4.82

2.72

3.06

4.15

3.12

3.59

Mediana

5.00

2.00

3.00

4.00

4.00

3.60

Moda

5

2

3

4

4

3.6

Desvio Padrão

.506

1.268

1.136

.869

1.314

.611

Respostas

 

Discordo totalmente

1

.9%

22

19.6%

14

12.7%

2

1.8%

20

17.7%

1

.9%

Discordo parcialmente

0

0%

35

31.3%

16

14.5%

3

2.7%

18

15.9%

13

11%

Nem concordo, nem discordo

0

0%

15

13.4%

38

34.5%

13

11.8%

17

15%

66

58%

Concordo parcialmente

16

14.3%

32

28.1%

33

30%

50

45.5%

45

39.8%

33

29%

Concordo totalmente

95

84.8%

8

7.1%

9

8.2%

42

38.2%

13

11.5%

1

.9%

Os factores que influenciaram as atitudes em relação a parte destas afirmações foram o nível de ensino, a idade, o tempo de serviço, lecionar ao 2.º Ciclo e ter contato regular com pessoas com DV.

4.4. Competências do professor

Os dados relativos às atitudes dos docentes em relação competências dos professores que lecionam a alunos com DV encontram-se na tabela 5. Relativamente, ao total dos itens desta categoria, a média é de 3.67, mediana 3.67, moda 3.8, desvio padrão de 0.623. 33,3% dos docentes tiveram uma atitude parcialmente positiva em relação a esta categoria.

Tabela 5 Medidas descritivas de tendência central e de dispersão, frequências absolutas e relativas das atitudes em relação às competências do professor.

 

12.14

12.15

12.16

12.17

12.18

12.19

12.20

12.21

12.22

12.23

Total – Somatório das respostas de competências do professor - Atitudes Positivas

Na execução de determinadas tarefas, o aluno com DV poderá ser apoiado pelos colegas

Durante as aulas, é vantajoso para o aluno com DV a presença de outro professor da mesma área disciplinar

Durante as aulas, o professor de EE – domínio da visão – deve estar presente para apoiar o aluno

O professor titular é o responsável pelo aluno com DV, na sua área disciplinar

Uma turma com vinte alunos é adequada para o ensino do aluno com DV

O professor titular poderá atender às necessidades dos alunos com DV, nas suas aulas

Apenas o professor de EE com formação na área da visão poderá ensinar o aluno com DV

O professor titular deve conduzir as aulas de modo a atender às especificidades do aluno com DV

Deve existir colaboração entre o professor titular da turma e o professor de EE – domínio da visão

O tempo que o professor demora a preparar uma aula que inclua um aluno com DV é maior

 N

Válidos

111

110

109

106

110

109

110

110

111

110

114

n/a

3

4

5

8

4

5

4

4

3

4

0

Média

4.61

3.78

3.58

3.62

2.85

3.45

2.09

3.45

4.87

4.57

3.67

Mediana

5.00

4.00

4.00

4.00

3.00

4.00

2.00

4.00

5.00

5.00

3.80

Moda

5

4

4

4

1

4

1

4

5

5

3.7

Desvio Padrão

.489

1.207

1.279

1.082

1.447

1.067

1.154

1.238

.360

.735

.623

Respostas

 

Discordo totalmente

0

0%

8

7.3%

9

8.3%

4

3.8%

31

28.2%

4

3.7%

43

39.1%

8

7.3%

0

0%

1

.9%

3

2.6%

Discordo parcialmente

0

0%

9

8.2%

16

14.7%

13

12.3%

16

14.5%

21

19.3%

36

32.7%

25

21.9%

0

0%

1

.9%

7

6.1%

Nem concordo, nem discordo

0

0%

19

17.3%

19

17.4%

26

24.5%

17

15.5%

21

19.3%

12

10.9%

8

7.3%

1

.9%

7

8.2%

66

57.9%

Concordo parcialmente

43

38.7%

37

33.6%

33

30.3%

39

36.8%

31

28.2%

48

44%

16

14.5%

48

43.6%

12

10.8%

26

23.6%

38

33.3%

Concordo totalmente

68

61.3%

37

33.6%

32

29.4%

24

22.6%

15

13.6%

15

13.8%

3

2.7%

21

19.1%

98

88.3%

75

68.2%

0

0%

Os fatores que mais influenciaram as respostas sobre as competências do professor foram o lecionar ao 2.º ciclo e o número de alunos com DV que os professores já tiveram.

4.5. Aspetos referidos pelos professores como sendo facilitadores da inclusão de alunos com DV: questão 13

Os facilitadores da inclusão mais referidos foram: turmas pequenas com (26.3%); formação de professores que lecionam a alunos com DV (20.2%); disponibilidade de materiais didáticos adaptados (14.9%).

A categoria, outros, engloba 33.3% das respostas dadas pelos professores que não puderam ser englobadas em nenhuma das 16 categorias referidas na tabela 6, nem que puderam constituir uma nova categoria, por serem referidas isoladamente por um único participante.

Tabela 6 – Frequências relativas e absolutas dos aspetos referidos pelos docentes como podendo contribuir para a inclusão do aluno com DV na sala de aula

Aspetos que podem contribuir para a inclusão de alunos com DV na sala de aula

N = 114

100%

13.1 Turmas pequenas.

30

26.3%

13.2 Formação de professores que lecionam a alunos com DV.

23

20.2%

13.3 Disponibilidade de materiais didáticos adaptados

17

14.9%

13.4 Disponibilidade de equipamentos tecnológicos acessíveis.

11

9.6%

13.5 Apoio ao aluno na sala de aula pelo professor de EE – domínio da visão.

15

13.2%

13.6 Apoio ao aluno com DV na sala de aula por outro professor da mesma área.

2

1.8%

13.7 Espaço físico da sala de aula acessível ao aluno com DV.

6

5.3%

13.8 Recetividade dos alunos em relação ao colega com DV.

13

11.4%

13.9 Civismo dos alunos para com o colega com DV.

3

2.6%

13.10 Aumento da autoestima do aluno com DV.

14

12.3%

13.11 Tratar o aluno com DV da mesma forma que se tratam os restantes.

3

2.6%

13.12 Redução do horário do professor para preparação de aulas e materiais.

2

1.8%

13.13 Cooperação entre o professor de EE e o professor de ensino regular.

9

7.9%

13.14 Inclusão do aluno em trabalhos de grupo ou de pares.

5

4.4%

13.15 Incentivar o aluno com DV a participar nas atividades da aula.

4

3.5%

13.16 Partilha de experiências

3

2.6%

13.17 Outros

38

33.3%

Os aspectos que mais contribuíram para a referência destes facilitadores foram o tempo de serviço e a idade.

4.6. Aspetos referidos pelos professores como sendo barreiras à inclusão de alunos com DV: questão 14

Os docentes consideraram como barreiras à inclusão de alunos com DV na sala de aula: as turmas demasiado grandes referido por 33.3% dos participantes; formação de professores que lecionam a alunos com DV (21.9%); escassez de materiais didáticos adaptados (20,2%).

A categoria, outros, engloba respostas isoladas de 31,6% dos professores participantes que não puderam ser englobadas em nenhuma categoria nem constituir por si uma categoria.

Tabela 7 – Frequências relativas e absolutas dos aspetos que podem dificultar a inclusão do aluno com DV na sala de aula.

Aspetos que podem dificultar a inclusão do aluno com DV na sala de aula.

N = 114

100%

14.1 Turmas demasiado grandes

44

33.3%

14.2 Falta de formação de professores que lecionam a alunos com DV.

25

21.9%

14.3 Escassez de materiais didáticos adaptados.

23

20.2%

14.4 Falta de equipamentos tecnológicos acessíveis.

15

13.2%

14.5 Falta de apoio do professor de EE  – domínio da visão – nas aulas.

17

14.9%

14.6 Existência de barreiras físicas na escola e nas salas de aula

8

7.0%

14.7 Falta de recetividade dos alunos da turma, em relação ao colega com DV.

17

16.9%

14.8 Inexistência de um professor de EE – domínio da visão – na escola.

8

7.0%

14.9 Existência de indisciplina nas aulas.

12

10.5%

14.10 Utilização de máquinas de braille antiquadas e barulhentas.

4

3.5%

14.11 Outros

36

31.6%

De entre os fatores que influenciaram diretamente estas respostas dos docentes destacaram-se: lecionar ou não em escola de referência; o ter tido ou não alunos com DV e a formação no atendimento a alunos com DV na sala de aula.

5. Discussão dos resultados

Nas escolas de referência 44.4% dos participantes concordaram com a inclusão dos alunos com DV na escola e em todas as aulas com a restante turma, mas esse valor desceu para 31% nas escolas de não referência. Tendo em conta a totalidade dos participantes em todas as escolas pôde verificar-se que 39.5% dos docentes foram favoráveis à inclusão permanente do aluno com DV na sala de aula. Idêntico resultado foi obtido no estudo de Wungu e Seonghee (2011), no qual 43% tinham uma atitude favorável à inclusão de alunos com DV na sala de aula.

O nível de ensino a que lecionavam os docentes e o número de anos de serviço estão relacionados com a opinião dos docentes acerca da inclusão do aluno na escola e em todas as aulas. No estudo de Wungu e Seonghee (2011), o nível de ensino a que lecionavam os docentes, influenciou também a sua atitude em relação à inclusão.

71.9% dos professores concordaram com a possibilidade de frequência de umas aulas com a turma, por parte do aluno com DV e a permanência na sala de EE nas restantes aulas, tendo em conta as disciplinas. 75,0% dos docentes que lecionavam nas escolas de referência manifestaram uma maior concordância, enquanto 69% dos professores das escolas de não referência concordaram com este modo de ensino como sendo a melhor para o aluno com DV. O único fator estatisticamente relevante foi o lecionar ao ensino Secundário.

Dos participantes, 79,8% foram da opinião que a escola tem uma atitude proactiva em relação à eliminação de todas as formas de discriminação dos alunos com DV. As opiniões mais favoráveis à pro-atividade da escola em relação à inclusão do aluno com DV foram os participantes das escolas de referência com 81.9.%.

A maioria dos docentes, 73.7), disseram ter uma atitude favorável relativamente a aquisição das competências sociais na sala de aula.

No estudo de Wungu e Seonghee (2011), 76,80% tinham atitudes favoráveis à socialização dos alunos com DV na escola inclusiva. Os fatores diretamente relacionados com as opiniões que os professores manifestaram em relação a esta categoria foram a idade, o tempo de serviço e o nível de ensino a que os docentes lecionavam.

No estudo de Wungu e Seonghee (2011), 73,44% dos professores concordaram que o aluno com DV na sala de aula adquiria competências académicas. Neste estudo apenas 0,9% concordaram totalmente e 29,0% concordaram parcialmente com o facto de o aluno com DV adquirir estas competências na sala de aula com a restante turma, logo existe uma dissonância entre os dois estudos. Apenas o nível de ensino a que lecionavam os professores – 2.º Ciclo do Ensino Básico e Secundário – tiveram influência na avaliação dos itens desta categoria.

Na categoria competências do professor, 33.3% tiveram uma atitude favorável à totalidade das afirmações desta categoria. Mais de metade, 57.9% tiveram uma atitude neutra em relação à totalidade destas afirmações.

Existe alguma dissonância com o resultado obtido no estudo de Wungu e Seonghee (2011), onde 48.31% dos professores tiveram atitudes positivas em relação às competências do professor.

Os fatores de caraterização dos docentes que mais influenciaram as atitudes em relação a esta categoria, foram o nível de ensino - 2.º Ciclo e Secundário, o género, a quantidade de alunos com DV que o participante já teve e o ter tido ou não formação no ensino de alunos com DV.

Nos aspetos que os professores referiram como podendo facilitar a inclusão do aluno com DV na sala de aula, salienta-se a referência a turmas pequenas referido por 26.3% dos participantes e a formação de professores que lecionam a alunos com DV referido por 20.2%. Os fatores que mais influenciaram a referência aos dezassete aspetos desta categoria foram a idade e o tempo de serviço.

Em relação às barreiras à inclusão de alunos com DV na sala de aula, os docentes referiram onze aspetos diferentes dos quais se destacam: as turmas demasiado grandes referido por 33.3% e a falta de formação de professores que lecionam a alunos com DV referido por 21.9%. Estes aspetos também foram referidos pela maioria dos participantes no estudo de Wungu e Seonghee (2011).

De entre os factores de caracterização dos docentes que mais caracterizaram estas respostas destacaram-se: o lecionar ou não em escola de referência; o ter tido alunos com DV e a formação de professores em DV.

6. Conclusão

Analisando os resultados obtidos pode-se verificar que apenas uma minoria concorda que o aluno com DV pode estar permanentemente na sala de aula com a restante turma.

Parece que a maioria dos docentes considera mais benéfico para o aluno com DV frequentar as aulas de umas disciplinas com a turma na sala de aula e que nas restantes disciplinas o aluno deve estar na sala de EE.

Estes resultados indicam que a grande maioria dos docentes do ensino regular não têm uma opinião favorável à educação inclusiva dos alunos com DV. A maioria dos docentes admite que a escola tem um papel ativo na luta contra à discriminação de alunos com DV. Grande parte dos docentes admite que a presença de alunos com DV na sala de aula é benéfico para a sua socialização, no entanto apenas 29,9% consideraram que o aluno com DV adquire as competências académicas na sala de aula.

Em relação às competências que os professores do ensino regular têm para leccionar a alunos com DV, a maioria também não concorda que esses docentes tenham competência para ensinar a estes alunos. Pode concluir-se que a maioria dos docentes pode ter dúvidas quanto à inclusão de alunos com DV na escola e em todas as aulas com a restante turma.

Os docentes também consideraram que o tamanho das turmas e a formação dos docentes que leccionam a alunos com DV podem ser facilitadores ou barreiras à inclusão de alunos cegos ou com baixa visão.

Limitações e recomendações

Este estudo abrangeu apenas cinco escolas da Região Centro de Portugal, logo é fundamental que no futuro surjam estudos idênticos a nível regional ou nacional.

No estudo de Hall (2002), sobre a atitude dos docentes em relação a alunos com DV, estes foram divididos em cegos e BV, tendo os docentes atitudes mais desfavoráveis em relação a alunos cegos. O grau de DV poderá permitir verificar a existência de diferentes atitudes dos professores em relação à sua inclusão.

Tal como nos estudos de Gray (2009) e de Simón et al. (2010), poder-se-á analisar as áreas disciplinares que os docentes consideram ser mais dificultosas para a inclusão do aluno com DV na sala de aula.

Referências Bibliográficas

Ainscow, M. (2003). Dessarrollo de Sistemas Educativos Inclusivos. Conferência apresentada em San Sebastian, Espanha. Outubro de 2003. Disponível em: sid.usal.es/idocs/F8/FDO6565/mel_ainscow.pdf acedido a 15 de dezembro de 2011.

Decreto-Lei n.º49331/69 de 28 de outubro. N.º 253. 2.ª série. pp. 1462

Decreto-Lei n.º 319/91 de 23 de agosto. DR. Nº. 193. 1ª. Série. pp. 4389

Gray, C. (2009). A qualitatively different experience: mainstreaming pupils with a visual impairment in Northern Ireland, European Journal of Special Needs Education, Volume 24: Nº. 2. Routledge: London P. 169-182. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1080/08856250902793644 acedido a 25-09-2011.

Organização Mundial de Saúde (OMS,. 2001). CIF: Classificação internacional da funcionalidade, incapacidade e saúde [ICF: International Classification of Functioning, Disability, and Health]. (Tradução de Amélia Leitão da Direcção-Geral de Saúde, 2004). Disponível em http://www.inr.pt/uploads/docs/cif/CIF_port_%202004.pdf

Organização Mundial de Saúde (OMS, 2010). International Statistical Classification of Diseases and Related Health Problems 10th Revision.

Disponível em http://apps.who.int/classifications/icd10/browse/2010/en. Acedido a 15 de janeiro de 2012.

Organização das Nações Unidas [ONU] (1948). Declaração Universal dos Direitos do Homem. Disponível em http://www.fd.uc.pt/ - acedido em 01-09-2012

Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura [UNESCO] (1994). Declaração de Salamanca e Enquadramento da Acção na área das necessidades educativas especiais. Conferência Mundial sobre necessidades educativas especiais: acesso e qualidade. Salamanca, Espanha.7 de junho de 1994 Disponível em: www.unesdoc.unesco.org/images/0013/001393/139394por.pdf acedido a 12-12-2011

Simón, C.; Echeita, G.; Sandoval, M.; López, M. (2010). The Inclusive Educational Process of Students with Visual Impairments in Spain: An Analysis from the Perspective of Organizations. Journal of Visual Impairments and Blidiness. Volume 104 Nº. 9 P. 565-570. Disponível em: http://www.afb.org/afbpress/pubjvib.asp?DocID=jvib040909 Acedido a 16-08-2011.

Wall, R (2002). Teachers’ exposure to people with visual impairments and the effect on attitudes toward inclusion. RE:view, Volume 34, Nº. 3. P. 111-119. Disponível em: http://www.isar-international.com/literatur/literatur_detail_autor.php?literatur_id=42 acedido a 8 de dezembro de 2011

Wungu, E. e Seonghee H. (2011). General Teachers’ Attitude Toward The Inclusion Of Students With Visual Impairments (Vi): A Study In Dki-Jakarta Indonesia. Disponível em: http://repository.unpad.ac.id/handle/123456789/366 Acedido a 07-11-2011

Ir para o índice

ARTIGO 11 - A PRODUÇÃO DE CONTEÚDOS INCLUSIVOS: SENSIBILIZAÇÃO E FORMAÇÃO DE UTILIZADORES NUM CONTEXTO UNIVERSITÁRIO

Bruno Marçal, Célia Pinto e Denise Santos

ISCTE-IUL – Instituto Universitário de Lisboa/ Comunicação decorrente da Conferência Internacional para a Inclusão - INCLUDiT

Citar este artigo: Marçal, B., Pinto, C. & Santos, D. (2015). A produção de conteúdos inclusivos: sensibilização e formação de utilizadores num contexto universitário. In C. Mangas, C. Freire & M. Francisco (Orgs.), Inclusão e Acessibilidade em Ação - Diferentes percursos, um rumo. Leiria: iACT/IPLeiria, Artigo 11. [Online, disponível em http://iact.ipleiria.pt/]

Resumo

Este artigo surge no seguimento da participação da Biblioteca do ISCTE-IUL nas duas edições já realizadas da INCLUDiT onde tivemos a oportunidade de apresentar uma comunicação e um poster nos quais foi descrito o percurso desenvolvido pelo ISCTE-IUL no domínio do apoio a alunos com Necessidades Educativas Especiais (NEE), com particular destaque para o trabalho realizado pela Biblioteca da instituição, nunca perdendo de vista a interação da mesma com os restantes serviços internos. Enunciámos igualmente um conjunto de iniciativas que pretendíamos desenvolver entre as quais se destaca a produção de conteúdos digitais mais inclusivos e a sensibilização de toda a comunidade para esta questão. O texto que apresentamos visa, por um lado, dar a conhecer um conjunto de boas práticas para a elaboração de documentos digitais que cumpram as regras de acessibilidade e a forma como pretendemos partilhar esse conhecimento junto da comunidade ISCTE-IUL, nomeadamente, os produtos, canais e estratégias de comunicação a seguir. Por outro lado, dar esforço despendido na produção dos conteúdos fazendo uso de plataformas de preservação digital, como são os casos do Repositório ISCTE-IUL e da aplicação de e-learning, possibilitando desta forma, uma reutilização e partilha dos mesmos pelos alunos com NEE. Em paralelo, contextualizando a nossa ação, pretendemos igualmente transmitir uma mensagem muito clara de que a criação de boas condições de trabalho para todos os alunos que chegam ao ISCTE-IUL, respeitando o princípio da igualdade e evitando uma política meramente assistencialista, é uma prioridade institucional. Ao nível da Biblioteca podemos referir a constituição de um grupo de trabalho para apoio aos alunos com NEE que organizou, entre outras atividades, um conjunto de iniciativas que decorreram entre os dias 1 e 5 de dezembro de 2014, semana que teve a designação “Por uma sociedade mais inclusiva”, ou mesmo, a colaboração no reforço de parcerias e protocolos com instituições estratégicas, como é o caso da Fundação PT que, por via da disponibilização de financiamento, equipamentos, serviços ou mesmo de know how, nos permitem dar uma resposta mais eficaz às necessidades dos nossos utilizadores.

Palavras-Chave: Necessidades Educativas Especiais, Formação de utilizadores, Produção de conteúdos inclusivos, Biblioteca ISCTE-IUL

Abstract

This article arises about the participation of ISCTE-IUL Library in the previous editions of INCLUDiT. We had the opportunity to present a communication and a poster where we described the work developed by ISCTE with our students with Special Educational Needs (SEN), with particular emphasis on the work done by the institution's library. Also have set out a number of initiatives we wanted to develop among which stands out the production of more inclusive digital content and awareness of the whole community to this issue. The text we propose to present aims, first, to inform a set of best practices for the development of digital documents that comply with the rules of accessibility and how we intend to share this knowledge with the community such as products, channels and communication strategies. We have the challenge to monetize the effort expended in the production of content making use of digital preservation platforms such as the ISCTE Library Online Repository and the e-learning application, enabling reuse and share them by students with SEN. We also want to send a very clear message that the creation of good working conditions for all students who arrive to ISCTE-IUL, respecting the principle of equality and avoiding a purely welfare policy, is a priority institutional. specifically in the library we can refer the establishment of a working group to support pupils with SEN and , right now we are organizing some initiatives that will take place between 1 and 5 December 2014 , this week shall be known " For a more inclusive society ", or even the strengthening of partnerships and agreements with strategic institutions, such as the PT Foundation , through the provision of financing , equipment, services or know-how, allow us to give an answer more effectively to the needs of our users.

Keywords: Special Educational Needs, User training, Production of inclusive content, ISCTE-IUL Library

1. Introdução

Nos últimos anos, a Biblioteca do ISCTE-IUL tem trabalhado com o objetivo de desenvolver um serviço de apoio para utilizadores com Necessidades Educativas Especiais (NEE) com o intuito de promover, sempre que possível, a autonomia e independência dos estudantes portadores de deficiência e adequar, em termos de usabilidade e de acessibilidade, o acesso à informação nos mais variados suportes. Neste sentido, a Biblioteca contacta sistematicamente os alunos identificados com NEE, providencia soluções para as suas necessidades e desenvolve estratégias que assegurem o acesso à informação colaborando assim para a promoção do sucesso escolar e diminuição das desigualdades relativamente a estes estudantes.

Paralelamente, é desenvolvido um forte compromisso por parte da Biblioteca na sensibilização de toda a comunidade ISCTE-IUL, alunos, professores, investigadores e funcionários relativamente às questões relacionadas com a deficiência, a inclusão ou a igualdade de oportunidades nos mais vários contextos, nomeadamente através da formação de utilizadores.

2. Enquadramento histórico

A Biblioteca do ISCTE-IUL tem dado passos importantes no sentido de dotar os seus espaços, meios e colaboradores, das ferramentas e competências necessárias para melhor servir os estudantes com NEE.

A abertura no ano de 2013 de uma sala destinada não só, mas também, a alunos com NEE apetrechada com equipamentos e software destinados a utilizadores cegos e com baixa visão foi absolutamente fundamental para atingir os objetivos estratégicos propostos. Nesse espaço foram instalados um portátil, um scanner, uma impressora Braille (figura 1), um ampliador de mesa (figura 2) e, fruto de um protocolo estabelecido com a Fundação PT, a instalação dos softwares PT Jaws e PT Magic.

Figura 1 e 2: Equipamentos instalados na sala multimédia e de apoio a alunos com NEE

a figura 1 apresenta um ampliador de mesa e a figura 2 apresenta uma Impressora Braille, um portátil com software específico e scanner de mesa, todos os equipamentes estão instalados na sala multimedia e de apoio a alunos com NEE

Nas figuras 1 e 2 é possível observar os equipamentos disponibilizados pela Biblioteca para apoio a alunos cegos e com baixa visão, nomeadamente os já referidos ampliador de mesa, impressora Braille, portátil com software específico e scanner de mesa.

A presença em diversas conferências e colóquios constituem momentos igualmente importantes para conferir mais conhecimentos aos elementos da Biblioteca que, de forma mais direta, trabalham no domínio do apoio a estudantes. Da mesma forma, fomenta a sistematização do trabalho já realizado uma vez que procuramos participar de forma ativa através da apresentação de posters (figura 3) e de comunicações.

Podemos destacar a presença da Biblioteca do ISCTE-IUL nas duas edições da INCLUDiT realizadas em 2013 e 2014, as XI Jornadas da APDIS, ou o Colóquio “Inclusividade e Ensino” organizado pelo próprio ISCTE-IUL em maio de 2014.

Figura 3: Poster apresentado pela Biblioteca do ISCTE-IUL na 2ª edição da INCLUDiT

Poster apresentado pela Biblioteca na 2ª edicação da INCLUDiT com o título “A produção de conteúdos inclusivos: sensibilização e formação de utilizadores num contexto universitário”

A figura 3 apresenta uma imagem com o poster apresentado pela Biblioteca na 2ª edição da INCLUDiT com o título “A produção de conteúdos inclusivos: sensibilização e formação de utilizadores num contexto universitário”.

A Biblioteca organizou igualmente um vasto conjunto de iniciativas na semana de 1 a 5 de dezembro de 2014, na qual se insere o Dia Internacional das Pessoas com Deficiência (dia 3 de dezembro).

De entre as diversas atividades podemos destacar os workshops de introdução ao Braille e de iniciação à Língua Gestual Portuguesa, uma exposição de pintura, a representação da peça de teatro produzida pela CRINABEL, uma feira de artesanato solidária, ou mesmo uma conversa da Biblioteca.

Procurámos que todas as iniciativas fossem tão inclusivas quanto possível. Em alguns dos eventos foi assegurado a presença de um intérprete de Língua Gestual Portuguesa e no caso das atividades do dia 5 de dezembro no Grande Auditório esteve também disponível o serviço de audiodescrição. Algumas das atividades foram alvo de videodifusão permitindo assim que pessoas que não se pudessem deslocar ao ISCTE-IUL usufruíssem das mesmas.

Sempre que possível e se justifica a Biblioteca tem igualmente colaborado com o grupo de trabalho em Responsabilidade Social Universitária criado no ISCTE-IUL e que demonstra uma clara preocupação institucional em diversos domínios tais como a igualdade e a justiça social.

Em paralelo com todas as atividades descritas até ao momento, tem existido um esforço continuado para trabalhar no domínio da formação de utilizadores, visando não só a nossa comunidade educativa como também pessoas provenientes do exterior, fundamentalmente no que diz respeito à produção de conteúdos mais inclusivos, como iremos descrever de seguida, assim como na capacitação dos colaboradores da Biblioteca para melhor servir os utilizadores.

3. Sensibilização e formação de utilizadores num contexto universitário

A formação de utilizadores é um dos muitos serviços disponibilizados pela Biblioteca do ISCTE-IUL. Para além da formação dirigida aos novos estudantes, na qual é apresentada a Biblioteca e os principais recursos disponíveis, existe um plano de formação regular em pesquisa e análise de informação. Estas ações têm como objetivo proporcionar a todos os participantes as ferramentas necessárias para efetuar pesquisa e recuperação de informação a partir de diferentes recursos permitindo desta forma a criação e o desenvolvimento de competências no domínio da literacia da informação.

Para além das formações presenciais que têm lugar nos laboratórios de informática de modo a permitir uma interação imediata entre os estudantes e os recursos de informação em causa, algumas destas formações também podem ser frequentadas on-line a partir da plataforma de e-learning da instituição.

3.1 Formação: a produção de conteúdos inclusivos

Uma das principais solicitações dirigidas à Biblioteca por alunos e docentes prende-se precisamente com a adaptação de conteúdos já existentes, na sua grande maioria produzidos internamente, com o objetivo de os tornar mais inclusivos e passiveis de consulta por parte de todos.

O processo de adaptação dos conteúdos, para além de moroso, está neste contexto tipicamente associado a uma necessidade específica e não a uma linha de ação continuada que vise promover a acessibilidade de todos os documentos produzidos.

É este o contexto que levou a Biblioteca a disponibilizar uma formação destinada a promover boas práticas elementares para a produção de documentos mais inclusivos, fundamentalmente os que são elaborados a partir das aplicações Microsoft Word e Powerpoint, PDF´s e ainda sensibilizar para a questão da informação partilhada em plataformas na Internet que, muitas vezes, não cumprem os critérios de acessibilidade.

De forma complementar procuramos sensibilizar docentes e alunos no sentido de preservar os conteúdos que vão sendo adaptados em plataformas como a de e-learning ou do repositório institucional. A mesma preocupação existe por parte da Biblioteca relativamente a todos os documentos cuja adaptação lhe é solicitada. Neste caso o grande objetivo consiste em rentabilizar o esforço despendido no tratamento de documentos que originalmente não cumpriam os critérios de acessibilidade desejados.

A produção e a distribuição de materiais de apoio ou a divulgação de notícias relacionadas com o tema da acessibilidade fazendo uso de diversos canais de comunicação (páginas oficiais e redes sociais da Biblioteca) constituem estratégias de sensibilização e de criação de competências nos utilizadores.

Procuramos ainda partilhar a nossa experiência relativamente ao apoio a alunos com NEE e no âmbito da produção de conteúdos inclusivos com colegas de outras instituições. Recentemente, ao abrigo do “Programa de Mobilidade em Bibliotecas do Ensino Superior” difundimos o nosso conhecimento e boas práticas sobre estes temas com cinco colegas provenientes de três instituições.

3.1.1 Contextualização

A formação tem início com uma pequena contextualização da temática da acessibilidade enquadrada no acesso à informação e ao conhecimento científico. Através de algumas imagens e gráficos ficam de imediato bem patentes diversas limitações que afetam a população portuguesa, sendo igualmente percetível que esses condicionalismos ocorrem em todas as faixas etárias e em diversas circunstâncias do quotidiano.

Esta realidade, quando transposta para a nossa comunidade educativa, permite aos formandos percecionar algum grau de heterogeneidade, de certa forma inesperado, onde se acreditava observar um grupo uniforme. Limitações como a deficiência visual, a deficiência auditiva, a deficiência motora, a paralisia cerebral, a dislexia, entre outras, são uma realidade nas salas de aula.

Promovemos ainda uma reflexão em torno do conceito das Necessidades Educativas Especiais, e da necessidade de olhar para cada individuo de forma singular tirando partido das suas potencialidades e procurando soluções para contornar as suas principais limitações de aprendizagem, promovendo-se desta forma as condições necessárias para a obtenção do sucesso escolar ambicionado por todos.

Fazemos ainda referência a um conjunto de documentos tais como o 1º Relatório Mundial sobre Deficiência, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, ou mesmo a Declaração de Salamanca, para reforçar a obrigatoriedade por parte dos produtores e gestores de serviços e informação em assegurar o acesso aos mesmos por parte de todos, não promovendo contextos discriminatórios face a condicionantes físicas, cognitivas ou mesmo sensoriais que afetam uma parte substancial da população mundial.

3.1.2 Microsoft Word

Relativamente à produção de documentos com recursos ao Microsoft Word tentamos dar um maior enfoque às funções que são utilizadas com maior frequência, tais como: a definição do tipo e tamanho da letra, a formatação de estilos, a utilização de imagens e elementos gráficos, a utilização de hiperligações e marcadores internos para facilitar a navegação no próprio documento, o recurso a tabelas, ou mesmo a criação de formulários.

Foi bastante gratificante desde a primeira ação de formação realizada constatar a facilidade com que os participantes interiorizavam as recomendações para a produção de documentos no Microsoft Word. Na realidade, as dicas e sugestões apresentadas são na maioria dos casos pormenores em operações executadas rotineiramente, bastando ter em atenção alguns detalhes adicionais para assegurar a acessibilidade do documento. Por outro lado, os utilizadores verificam que muitas das sugestões facilitam o uso da aplicação, assim como a legibilidade e navegabilidade dos documentos, constituindo desta forma uma mais-valia para todos.

Resumo de boas práticas elementares para a produção de conteúdos a partir do Microsoft Word:

  • Títulos e cabeçalhos devem estar associados a estilos;
  • Usar tipos de letra como Arial ou Verdana (sem serifa);
  • Evitar tamanhos de letra inferior a 11 no corpo do texto;
  • O alinhamento deve ser sempre feito à esquerda;
  • Os destaques do texto devem ser feitos em negrito;
  • Procurar um bom contraste entre cor da letra e o fundo da página;
  • Todos os elementos gráficos relevantes devem ter texto alternativo;
  • As hiperligações externas devem ser bem identificadas;
  • O uso de marcadores pode facilitar a navegação no documento;
  • As linhas não devem conter mais de 80 caracteres.
3.1.3 Microsoft Powerpoint

Usado fundamentalmente para elaborar documentos de suporte para as aulas e apresentações o Powerpoint tornou-se numa ferramenta de eleição para professores e alunos. Os slides são em muitos casos uma das principais ferramentas de estudo e de partilha de informação. Independentemente das regras básicas para a produção de qualquer documento a partir do Powerpoint é muito importante ter em mente a sua finalidade e o contexto em que vai ser utilizado, por exemplo, um documento que se destina a ser apenas exposto em contexto de sala de aula pode conter características diferentes de um cujo propósito é o de ser impresso e distribuído como recurso de informação.

Contudo, as regras elementares de legibilidade devem ser salvaguardadas em qualquer circunstância, o que, em muitos casos, se cruza com as sugestões de acessibilidade já apresentados para o Microsoft Word.

Resumo de boas práticas elementares para a produção de conteúdos a partir do Microsoft Powerpoint:

  • Usar tipos de letra sem serifas com tamanho não inferior a 22 pontos;
  • Usar um fundo liso e sem colunas;
  • Fazer uso das estruturas dos slides definidos pelo Powerpoint;
  • Definir a ordem pela qual a informação deve ser lida pelos leitores de ecrã;
  • Os títulos dos slides devem ser claros e descritivos;
  • Evitar grandes quantidades de texto;
  • Evitar transições e efeitos entre os slides;
  • O campo de notas pode ser usado para descrições.
3.1.4 Produção de PDF

Um dos formatos mais utilizados, senão o mais comum, para partilha de conteúdos e da produção científica através da Internet são os documentos em PDF.

Durante a formação são produzidos documentos em PDF a partir de documentos criados no Microsoft Word e Powerpoint que respeitem eles próprios todos os critérios de acessibilidade.

Advertimos os formandos que nem todos os ficheiros em PDF são acessíveis particularmente quando os mesmos são meras digitalizações de documentos impressos. Sugerimos igualmente que os mesmos façam uso dos equipamentos e aplicações disponíveis na Biblioteca e que permitem fazer o reconhecimento de caracteres a partir de suportes físicos e digitais possibilitando assim a criação de documentos mais acessíveis.

  • Ao criar um PDF a partir do Word verifique que o documento original segue as recomendações de acessibilidade;
  • Ao gerar o PDF a partir do Word verifique que a opção de acessibilidade está selecionada;
  • Não crie ficheiros PDF a partir da digitalização de imagens, se o fizer utilize software de reconhecimento de caracteres;
  • Se necessário facultar a informação num formato alternativo.
3.1.5 Produção e gestão de conteúdos na Internet

Não temos neste momento o objetivo de conferir competências ao nível da programação para a web, considerámos sim pertinente, alertar para a existência de regras que contribuem para assegurar elevados níveis de acessibilidade das páginas de Internet.

Os formandos são convidados a analisar uma página de Internet à sua escolha analisando posteriormente os resultados e identificando, quando possível, as principais falhas ao nível da acessibilidade identificados pelo validador Access Monitor: http://www.acessibilidade.gov.pt/accessmonitor/.

A apresentação contempla ainda um resumo com os resultados do validador referente às páginas da instituição e da própria Biblioteca com o intuito de sensibilizar para a necessidade de se elevar os níveis de acessibilidade das mesmas e dos conteúdos por elas disponibilizados.

A Biblioteca do ISCTE-IUL disponibiliza uma versão alternativa e inclusiva da sua página oficial (http://biblioteca.iscte.pt/inclusiva/index.php), solução que embora não sendo a desejável serve de alerta para a necessidade de considerar as questões de acessibilidade como uma prioridade e permitir aos utilizadores a consulta da informação disponibilizada que de outra forma seria mais difícil de obter ou mesmo inacessível.

Na produção de páginas de Internet tenha em atenção as diretivas WCAG 2.0. Poderá encontrar mais informações e validar as suas páginas a partir do endereço: http://www.acessibilidade.gov.pt/.

3.1.6 Recomendações gerais

De forma complementar e gradual, ao longo de toda a ação de formação, vão sendo transmitidas pequenas sugestões e alertas que visam promover a acessibilidade dos documentos mas igualmente facilitar os processos de trabalho por parte dos produtores dos conteúdos.

Exemplos tão simples como salientar a importância de não fazer depender a perceção da informação em exclusivo a partir de esquemas de cores, uma vez que muitos utilizadores não conseguem distinguir as mesmas, a relevância de apresentar a informação de forma objetiva, com um espaçamento adequado entre os vários elementos, fundamentalmente quando se apresenta um grande volume de informação, ou a utilização de elementos que facilitem a navegação dentro de um documento, podem ser absolutamente determinantes não só para a acessibilidade do documento como também para a sua legibilidade.

A ferramenta de validação de acessibilidade disponibilizada em todas as aplicações do Microsoft Office constitui um utensilio precioso, não só porque identifica as principais fragilidades dos documentos mas fundamentalmente porque apresenta sugestões para correção dos problemas encontrados. Ao fazer uso desta ferramenta os utilizadores adquirem consciência dos erros que cometem de forma mais recorrente retificando os mesmos ao mesmo tempo que asseguram a validade do documento produzido em termos de acessibilidade de leitura.

  • O Microsoft Office inclui nas suas aplicações uma ferramenta que permite aferir se o documento levanta problemas de acessibilidade;
  • Torne o acesso à informação simples e fácil.

4. Conclusão

A produção de conteúdos inclusivos e a sensibilização e formação de utilizadores continuará a ser uma prioridade para a Biblioteca do ISCTE-IUL. Esta missão tem permitido não só desmistificar a complexidade desta tarefa como alertar para um conjunto de boas práticas que vem na generalidade facilitar a utilização de ferramentas como o Microsoft Word ou Powerpoint.

Gostaríamos ainda de salientar a relevância de um excelente recurso de informação para a produção de conteúdos inclusivos que é o site PLACES - Plataforma de Acessibilidade (http://sigarra.up.pt/up/pt/web_base.gera_pagina?p_pagina=1011880) onde é possível obter conteúdos que complementam as sugestões e boas práticas que constam neste documento, como também abordar outros tópicos igualmente importantes como o uso de fórmulas matemáticas e a edição de páginas em HTML tendo em atenção os critérios de acessibilidade.

Por último, é de salientar o estreitamento de relações e a partilha de informações com o Grupo de Trabalho para o Apoio a Estudantes com Deficiências no Ensino Superior (GTAEDES) no sentido de disponibilizar aos nossos utilizadores em geral, e em particular aos portadores de NEE, um serviço de qualidade e que vá ao encontro das suas necessidades.

Referências Bibliográficas

Amante, M. J., Marçal, B. (2014). Informação para a Inclusão numa Biblioteca do Ensino Superior. Comunicação apresentada no Colóquio “Inclusividade e Ensino”, Lisboa. Disponível em http://hdl.handle.net/10071/7250.

Amante, M. J., Marçal, B., Segurado, T., Santos, D. (2013). Informação para a inclusão. Comunicação apresentada na INCLUDiT – Conferência Internacional para a Inclusão, Leiria. Disponível em http://hdl.handle.net/10071/5570.

Amante, M. J., Marçal, B., Segurado, T., Santos, D. (2014). A Biblioteca do ISCTE-IUL ao serviço dos alunos com Necessidades Educativas Especiais – NEE. Poster apresentado nas XI Jornadas APDIS, Lisboa. Disponível em http://hdl.handle.net/10071/7683.

Giesteira, B., Pereira, E., Carvalho, V. (Eds). (2013) Produção de conteúdos acessíveis. Porto: Universidade do Porto. Disponível em http://sigarra.up.pt/up/pt/web_base.gera_pagina?p_pagina=1011880.

Marçal, B., Pinto, C., Santos, D. (2014). A produção de conteúdos inclusivos: sensibilização e formação de utilizadores num contexto universitário. Poster apresentado na INCLUDiT – 2ª Conferência Internacional para a Inclusão, Leiria. Disponível em http://hdl.handle.net/10071/7684.

Páginas de internet consultadas

PLACES - Plataforma de Acessibilidade

Unidade Acesso

Validador Access Monitor

GTAEDES, Grupo de Trabalho para o Apoio a Estudantes com Deficiências no Ensino Superior

Ir para o índice